Uma oração intercessória pela Igreja (92)
Perseverança em santidade
A doutrina da perseverança dos santos inclui em sua essência, a perseverança em santidade, não uma justificativa acomodatícia à prática e permanência no pecado.[1]
Na vocação de Deus vemos parcialmente a concretização do seu propósito sábio, amoroso e eterno que envolve toda a nossa existência. Deus nos chama fazendo com que o seu gracioso propósito eterno passe a fazer parte da experiência do regenerado. É o que o diz o apóstolo em lugares diferentes:
Nele [Jesus Cristo], digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados (proori/zw) segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade. (Ef 1.11). Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou (proori/zw) para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou (proori/zw) esses também chamou (kale/w) e aos que chamou (kale/w), a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou. (Rm 8.29-30).
Essa ordem divina é eficaz porque Deus opera eficazmente em nossa mente e coração. Deus age na história conforme o seu decreto, chamando-nos e adotando-nos como filhos e herdeiros da Aliança! Aqui a Palavra de Deus é definitivamente colocada e sedimentada em nosso coração (Tg 1.18; 1Pe 1.23; 1Jo 2.14; 3.9).
Somos chamados ao crescimento em nossa caminhada de forma progressiva. Estamos sujeitos ao pecado, é verdade. Ele é ainda uma realidade presente. Por isso, como disse Lloyd-Jones: “Jamais poderemos ter feriado espiritual”.[2] A luta é contínua e sem tréguas. Deste modo, todos nós devemos estar comprometidos em crescer em nossa fé para que tenhamos maior sensibilidade espiritual para com os feitos de Deus.
Vocação levada a efeito até o fim
O nosso consolo é que a vocação de Deus permanece e nos sustenta até o fim (Fp 1.6).[3] A glória de Deus se manifesta na constituição da Igreja, na reunião de seu povo redimido. Desse modo, tanto o nosso chamado como a progressividade de nossa salvação devem estar subordinados à glória de Deus. Paulo e Pedro enfatizam:
Devemos sempre dar graças a Deus por vós, irmãos amados pelo Senhor, porque Deus vos escolheu (ai(re/omai) desde o princípio para a salvação, pela santificação do Espírito e fé na verdade, para o que também vos chamou (kale/w) mediante o nosso evangelho, para alcançardes a glória de nosso Senhor Jesus Cristo. (2Ts 2.13-14). O Deus de toda a graça, que em Cristo vos chamou (kale/w) à sua eterna glória, depois de terdes sofrido por um pouco, ele mesmo vos há de aperfeiçoar, firmar, fortificar e fundamentar. (1Pe 5.10). (Ver: 1Ts 2.12).
O que ocupa a nossa mente?
Uma das coisas que apreciava no verão, era a possibilidade de me reunir com alguns amigos e jogar Biribol.[4] Em geral eram momentos alegres e festivos marcados por algumas contusões nos dedos e alguma ansiedade. Ansiedade sim.
Se esfriar naquele sábado é provável que os mais experientes se excluam por questões de saúde; a água pode ficar menos agradável. Estando em casa, não é raro pensar sobre isso na sexta: será que vai esfriar essa madrugada? As pessoas estarão bem dispostas? Teremos gente suficiente? (O ideal são oito jogadores, embora possamos jogar com quatro). Você pode estar pensando: quanto tempo gasto para praticar apenas um esporte… Provavelmente você tem razão. Quem têm filhos pequenos ou mesmo, já crescidos vivem ou se lembram deles acordando de madrugada, indo ao quarto dos pais e perguntando se já está na hora de se levantar… Certamente, não é para escola, mas, para o passeio que haverá na igreja, quando sairão bem cedo.
Em geral, aquilo que apreciamos e, que não é rotineiro, tende a ocupar mais a nossa mente. Não há nada de mal nisso. São pequenas coisas que gotejam à nossa vida em fases diferentes, com intensidade variada e em circunstâncias díspares.
Retornando ao nosso ponto, enfatizamos que Deus nos chama para a sua glória. Nada se compara a isso. Somos peregrinos, estrangeiros e hóspedes neste mundo.[5] Não há destinação mais nobre e sublime. Somos chamados à glória de Cristo. Meditemos sobre isso. Enxarquemos e saturemos a nossa mente e coração com essa verdade.
Você já se sentiu honrado por um convite bastante seleto? Já se sentiu desqualificado ou desconsiderado por não receber o convite para uma festa de casamento de pessoas próximas? Pois bem, saiba que Deus nos chama à glória. Isso nos basta. Não como prêmio de consolação, mas, porque não temos vocação maior. O Senhor de todas as coisas, de toda a realidade visível e invisível, nos destina à glória de Seu Filho amado.
O quanto ocupamos a nossa mente com isso? O quanto cantamos sobre isso? Quantos sermões pregamos ou ouvimos sobre a glória celestial? Tenho que admitir que preguei pouco sobre isso nesses mais de 45 anos que ocupo o púlpito de igreja. Precisamos cultivar em nossa mente o refletir sobre a glória eterna de Deus, sobre a nossa futura e gloriosa habitação com o Senhor, onde não haverá choro nem tristeza.
Maringá, 10 de julho de 2023.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1]“É totalmente errado afirmar que o crente está seguro, independentemente de sua vida posterior de pecado e infidelidade. A verdade é que a fé em Jesus Cristo está sempre atrelada à vida de santidade e fidelidade. Sendo assim, não é apropriado pensar a respeito de um crente independentemente dos frutos na fé e na santidade. Dizer que o crente está seguro, qualquer que seja a extensão de seu hábito de pecado em sua vida subsequente, é abstrair a fé em Cristo de sua definição mais exata e ensinar o tipo de abuso que torna a graça de Deus em lascívia. A doutrina da perseverança é a doutrina daqueles crentes que perseveram (…). A Perseverança dos santos faz lembrar forçosamente que somente aqueles que perseveram até o fim são verdadeiramente santos, mas a conquista do prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo não é automática. Perseverança significa o engajamento de nossa pessoa na devoção mais intensa e concentrada aos meios ordenados por Deus para a realização de seu propósito de salvação. A doutrina escriturística da perseverança não tem nenhuma afinidade com o quietismo e o antinomismo prevalecentes nos círculos evangélicos” (John Murray. Redenção: consumada e aplicada, 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 138-139).
[2]D. M. Lloyd-Jones, O Supremo Propósito de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 352. “Uma vez que os crentes todos os dias se envolvem em muitos erros, de nada lhes aproveitará já terem tomado a vereda da justiça, a menos que a mesma graça que os manteve em sua companhia os conduza à última fase de sua vida” (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 2, (Sl 32.1), p. 42).
[3]Veja-se: C.H. Spurgeon, Sermões Sobre a Salvação, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992, p. 20.
[4] Uma espécie de vôlei de piscina. O inventor desse esporte foi Dario Miguel Pedro (1936-2021), que viveu até seu falecimento na cidade do Noroeste do Estado de São Paulo que deu nome à modalidade esportiva, Birigui, conhecida como “Capital Nacional do Calçado Infantil”. A cidade que foi fundada em 07.12.1911, conta com cerca de 125 mil habitantes.
[5] “….os filhos de Deus, onde quer que estejam, não passam de hóspedes deste mundo. De fato, no primeiro sentido ele (Pedro), no início da Epístola, os chama de peregrinos, como transparece do contexto; aqui, porém, o que ele diz é comum a todos eles. Pois as concupiscências da carne nos mantêm enredados quando em nossa mente permanecemos no mundo e cremos que o céu não é nossa pátria; mas quando vivemos como forasteiros ao longo desta vida, não vivemos escravizados à carne” (John Calvin, Calvin’s Commentaries, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1996 (reprinted), v. 22, (1Pe 2.11), p. 78). “Somos estrangeiros e peregrinos neste mundo, (…) não possuímos morada fixa senão no céu. Portanto, sempre que formos expulsos de algum lugar, ou alguma mudança no suceder, tenhamos em mente, segundo as palavras do apóstolo aqui, que não temos lugar definido sobre a terra, porquanto nossa herança é o céu; e quando formos cada vez mais provados, então nos preparemos para nossa meta final. Os que desfrutam de uma vida tranquila, comumente imaginam que possuem para si um repouso neste mundo. Portanto é bom que nós, que somos inclinados a esse gênero de pândega, que somos constantemente levados de um a outro lado, tão propensos à contemplação das coisas aqui de baixo, aprendamos a volver sempre nossos olhos para o céu” (João Calvino, Exposição de Hebreus,São Paulo: Edições Paracletos, 1997, (Hb 13.14), p. 391-392). Veja-se também: D.M. Lloyd-Jones, O Supremo Propósito de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 367.