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Uma oração intercessória pela Igreja (133) - Hermisten Maia

Uma oração intercessória pela Igreja (133)

        8.5.1. Vocaciona e confere autoridade aos seus ministros (Continuação)

            A Confissão Belga, Art. 31, assim preceitua:

Cremos que os ministros da palavra de Deus, os presbíteros e os diáconos devem ser escolhidos para seus ofícios mediante eleição legítima pela igreja, sob invocação do nome de Deus e em boa ordem, conforme a palavra de Deus ensina.

Por isso, cada membro deve cuidar para não se apoderar do ofício por meios ilícitos, mas deve esperar a hora em que é chamado por Deus, a fim de ter, assim, a certeza de que sua vocação vem do Senhor.

           Entre os presbíteros, provavelmente refletindo a distinção judaica entre os anciãos e os levitas,[1] há, mesmo nas igrejas gentílicas – como sinal de uma total quebra de barreiras entre judeus e gentios –,[2] aqueles que presidem e outros que, além disso, se dedicam à pregação e ao ensino. Todos devem ser honrados com justiça (1Tm 5.17/1Pe 5.5).

            O âmbito do trabalho do Presbítero não se limitava a estas atividades, estando embutida também, a visita solidária aos enfermos (Tg 5.14).

            A esfera da autoridade do presbítero é derivada da Palavra e enquanto permanecer fiel a ela. Nenhum ministro tem autoridade vitalícia inerente.

         Calvino tinha bastante clareza bíblica quanto a isso:

A primeira regra do ministro é não tentar fazer coisa alguma sem estar baseado nalgum mandamento.[3]

A Escritura é a fonte de toda a sabedoria, e os pastores terão de extrair dela tudo o que eles expõem diante do seu rebanho.[4]

As únicas pessoas que têm o direito de ser ouvidas são aquelas a quem Deus enviou e que falam a palavra de boca. Portanto, para qualquer homem exercer autoridade, duas coisas são requeridas: o chamamento [divino] e o desempenho fiel do ofício por parte daquele que foi chamado.[5]

            Desta forma, todo o ofício do presbítero gira em torno da Palavra:

Porque devemos ter como coisa resolvida que todo o ofício deles se limita à administração da Palavra de Deus, toda a sua sabedoria consiste somente no conhecimento dessa Palavra, e toda a sua eloquência ou oratória se restringe à pregação da mesma. Se se afastarem dessa norma, serão tolos em seus sentidos, gagos em seu falar, traiçoeiros e infiéis em seu ofício, sejam eles profetas, ou bispos, ou mestres, ou pessoas estabelecidas em dignidade mais alta.[6]

            Portanto, aquele que prega deve ter consciência de que o púlpito não é o lugar para se exercitar as opiniões pessoais e subjetivas, mas sim, para pregar a Palavra, anunciando todo o desígnio de Deus, sob a iluminação do Espírito. O Espírito honra exclusivamente a sua Palavra, não a nossa.[7]

            Lloyd-Jones (1899-1981), numa série de sermões pregados (1963) sobre Isaías 1.1-18, declarou corretamente: “Não estou aqui para ventilar minhas próprias ideias e teorias, porém para expor a Palavra de Deus”.[8]

         Sem a Palavra, o púlpito torna-se um lugar que no máximo serve como terapia para aliviar as tensões de um auditório cansado e ansioso em busca de refrigério para as suas necessidades mais imediatamente percebidas.[9] Ele pode conseguir o alívio do sintoma, mas não a cura para as suas reais necessidades.

        Faço uma pergunta: Com o crescimento da membresia da igreja e, consequentemente o aumento de seus recursos, não corremos o risco de, em muitos aspectos, transformar a igreja em uma empresa e o ministro em um “super” ou nem tanto, administrador, um “gerenciador de vaidades e melindres”, mas, que não saiba ensinar a igreja?

       Outros pontos sensíveis: Ministério não é um “bico” para horas vagas. Ministério não é carreira para que possamos ascender eclesiástica, econômica e socialmente. Ministério é serviço. O trabalhador é digno de seu salário. O presbítero docente deve ser bem remunerado conforme as possibilidades da igreja local, a fidelidade e intensidade de seu ensino – independentemente dos recursos próprios de que tenha[10] –, mas, não como alguém que vê o ministério como fonte de riqueza, poder e influência.[11]

Maringá, 19 de agosto de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Quem me chamou a atenção para esse aspecto, foi Van Dam (Veja-se: Cornelis Van Dam, O Presbítero, São Paulo: Cultura Cristã, 2019, p. 95-112). Calvino comentando Is 66.19-21, escreve: “Que jamais ouviram falar de mim. Ele significa que o conhecimento de Deus seria difundido por todo o mundo; pois os gregos, italianos, partas, cilícios, entre outras nações, ainda não haviam ouvido nada acerca da religião pura e do verdadeiro culto de Deus; e o mundo inteiro jazia mergulhado nas profundas trevas da ignorância. Ele, pois, promete que a glória de Deus seria conhecida por toda parte do mundo. A palavra “nações” é enfática; pois naquele tempo o Senhor não era conhecido a ninguém mais senão a um único povo; agora, porém, ele tem se revelado a todos. (…)Abraão foi o pai de uma nação, e, no entanto, nem todos os que descendiam dele, segundo a carne, são considerados seus filhos; pois os ismaelitas e os edomitas foram rejeitados [Rm 9.7]. O tempo em que ele veio a ser “o pai de muitas nações” [Gn 17.5; Rm 4.17], foi quando Deus adotou os gentios e os reuniu a si por meio de uma aliança, para que seguissem a fé de Abraão. E assim vemos a razão por que o profeta nos dá o título de “irmãos” dos judeus, nós que outrora éramos alienados da Igreja de Deus. Isso se deve ao fato de previamente ele haver expulsado de seu lugar os falsos e réprobos irmãos. (…)

            Ele significa que não mais haveria qualquer diferença entre judeus e gentios; porque Deus derrubaria “a parede da separação” [Ef 2.14] e formaria uma Igreja “dentre todas as nações”. E assim se cumpriu o dito de Davi concernente a Cristo: “Pede-me, e eu te darei as nações por herança e as extremidades da terra por tua possessão” [Sl 2.8]. (…).

            “O profeta intensifica a descrição daquilo que já havia declarado acerca da extraordinária graça de Deus. Ele fizera conhecido que a Igreja de Deus seria coletada dentre todas as nações, de modo que, a despeito de toda dificuldade e obstrução, mesmo as nações remotas viriam a eles. Agora, porém, ele segue em frente e os instrui que os gentios não só seriam adotados por Deus, mas também seriam elevados por ele à suprema honra. Já constituía uma grande honra que nações impuras e poluídas fossem consideradas um povo santo; agora, porém, aqui está algo muito mais maravilhoso: que são elevados ao supremo pináculo da distinção.

            “Desse fato vemos que o sacerdócio sob Cristo é muito diferente do que ele era sob a Lei; pois sob a Lei uma tribo foi admitida exclusivamente ao sacerdócio, e os gentios, como imundos, viviam tão longe de ter em seu poder o exercício do sacerdócio, que inclusive foram proibidos de entrar no templo; agora, porém, todos são admitidos sem distinção. Há quem explane esta passagem de uma maneira geral: que os gentios seriam sacerdotes; isto é, se ofereceriam a Deus, como a Escritura amiúde denomina todos os crentes “um sacerdócio real” [1Pe 2.9; Ap 1.6; 5.10]. Ele, porém, parece descrever de uma maneira especial os ministros e mestres a quem também o Senhor escolheu dentre os gentios e determinou que executassem este eminente ofício; isto é, pregar o evangelho; tais como Lucas, Timóteo, entre outros da mesma classe, que ofereciam sacrifícios espirituais a Deus pelo evangelho” (John Calvin, Calvin’s Commentaries, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House Company, 1996 (Reprinted), v. 8/4, (Is 66.19-21), p. 433-437). Veja-se: Edward J. Young, The Book of Isaiah, Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1996 (Reprinted), v. 3, (Is 66.21), p. 535.

[2]Vejam-se: J. Alec Motyer, O Comentário de Isaias, São Paulo: Shedd Publicações, 2016, (Is 66.21), p. 726; John N. Oswalt, Comentário do Antigo Testamento – Isaías – v. 2, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, (Is 66.21), p. 827-828; A.R. Crabtree, A Profecia de Isaías, Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1967, v. 2, (Is 66.21), p. 395.

[3]João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 4, (IV.13), p. 52.

[4]João Calvino, As Pastorais,(1Tm 4.13), p. 123.

[5]João Calvino, Exposição de 2 Coríntios,São Paulo: Paracletos, 1995, (2Co 1.1), p. 15.

[6]João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 4, (IV.15), p. 125.

[7] Vejam-se as pertinentes ponderações de Packer. (J.I. Packer, Havendo Deus falado, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 37ss.).

[8] D.M. Lloyd-Jones, O Caminho de Deus não o nosso, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2003, p. 67.

[9]A constatação de Carson é de grande gravidade. Talvez devêssemos levá-la a sério, nós, costumeiramente tão ávidos por modismos: “A cultura terapêutica invadiu tanto a igreja que agora alguns seminários têm mais alunos matriculados em programas de aconselhamento que treinando para ser pregadores do Evangelho” (D.A. Carson, O Deus amordaçado: o Cristianismo confronta o pluralismo, São Paulo: Shedd Publicações, 2013, p. 51).

[10] “Se alguns ministros são agraciados com patrimônio e podem sustentar a si e sua família adequada e honestamente, nem por isso devem ser defraudados do salário de seu ministério” (François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 3, p. 334).

[11] O tratamento dado à questão da manutenção do presbítero docente é feito de forma primorosa por Turretini (Veja-se: François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 3, p. 330-336).

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