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Uma oração intercessória pela Igreja (120) - Hermisten Maia

Uma oração intercessória pela Igreja (120)

        8.3. É preservada por Cristo  

            “Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16.18).

            Creio que aqui há uma promessa que envolve conquista e preservação. Dentro desse semitismo, “as portas do inferno (da morte) não prevalecerão”, temos algumas possibilidades de interpretação. Parece-me que o sentido primário não é necessariamente de que as portas do inferno avançarão contra a igreja, ou, nem que as portas da morte iriam dominar ou separar a igreja, mas, que as portas do inferno (da morte) não resistirão à igreja em seu avanço na pregação do Evangelho libertando os homens do poder de satanás − a sua casa será invadida (Mc 3.27)[1] − para o Reino de Deus.

            Ninguém poderá deter a igreja em sua caminhada de fé (conquista).[2] Também creio que há o aspecto defensivo (preservação). As portas da morte não vencerão a igreja a despeito de todas as armadilhas de satanás. Jesus, o Cristo, mesmo sofrendo e morrendo pelas mãos dos anciãos, ressuscitaria (Mt 16.21)[3] e continuará preservando o seu povo.

            Temos uma promessa com grande teor escatológico: Por meio da igreja que o Senhor edifica, o império das trevas não resistirá ao poder do Evangelho anunciado. O Senhor consumará a sua obra. A Igreja será guardada e preservada intacta (Rm 1.16/Cl 1.13/1Co 15.24/Ef 5.25-27; Jd 24-25).[4]

            Em síntese, a Igreja nesta vida se deparará sempre com as investidas do diabo que tentará bloquear o seu avanço e, se possível, destruí-la, mas, o Deus fiel a sustentará.

            Obviamente Jesus não está se referindo a uma igreja em particular, a uma denominação, mas sim, à sua Igreja, composta por todos aqueles que permanecem unidos a Cristo, “e que por um só Espírito guarda e observa a união da fé, junto com a concórdia e caridade fraterna”, escreve Calvino.[5]

            Paulo fala dos “desígnios[6] de Satanás(2Co 2.11) – indicando a ideia de que ele tem metas definidas, estratégias elaboradas, um programa de ação com variedades de técnicas e opções a serem aplicadas conforme as circunstâncias[7]e a quem quer seduzir e o que tem em vista –, diz que “… O deus deste século cegou os entendimentos (no/hma) dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a imagem de Deus” (2Co 4.4).

            Satanás “fará qualquer coisa para conseguir vantagem sobre nós, diz o apóstolo, fará qualquer coisa para derrubar-nos, para fazer-nos parecer ridículos e para pôr em desgraça o nome de Deus”, aplica Lloyd-Jones.[8]

           Ele emprega toda a sua “energia” para realizar os seus propósitos (At 13.10).[9]  

           De fato, satanás tenta diante de nossos olhos, desconstruir o mundo de Deus, fazendo uma inversão de valores, revertendo o mal em bem e vice-versa. Ele é um ótimo marqueteiro, se propondo a vender o mundo forjado por ele – sem lei, princípios ou normas: totalmente depravado –, como o melhor, mais moderno, livre e eficaz. Por sua vez, o mundo de Deus com suas leis e princípios é descrito e, por fim, percebido como anormal, estranho, desatualizado e alienante. A sua proposta é apresentada como o caminho para o sucesso e a visibilidade.[10]

            Satanás age contra nós como um brilhante estrategista, buscando a melhor tática para nos vencer. “A astúcia é a grande característica do diabo”, conclui Lloyd-Jones.[11]

            Sem dúvida, a grande arma de Satanás é a sagacidade, a astúcia, a artimanha, o ardil. Isto faz com que ele aja de forma variada, tenha um repertório multiforme, sinistro de ataques. A sua força está de modo especial na sua inteligência, associada à sua perspicácia, que foram desenvolvidas ao longo de séculos de história.

          A história da maldade humana tem em satanás um grande mentor e aprendiz. Ele age de forma “criativa” testando as suas técnicas e vai se especializando conforme os resultados que obtém. Ele sabe se valer como ninguém de suas vitórias e fracassos.  O seu alimento é o seu ódio a Deus e, por extensão à sua Igreja.

            Murray escreve:

Satanás possui habilidades intelectuais muito mais elevadas do que qualquer homem possa ter. Onde o orgulho se mostra evidente, podemos estar certos de que Satanás encontrou uma porta. É ele quem deseja que os homens sejam idolatrados e considerados como celebridades.[12]

           Paulo, interpretando o acontecimento histórico registrado em Gênesis, diz: “Mas receio que, assim como a serpente enganou (e)capata/w = desviou, seduziu, desencaminhou) a Eva com a sua astúcia (panourgi/a[13] = “ardil”, “truque”, “maquinação”, “trapaça”), assim também sejam corrompidas as vossas mentes, e se apartem da simplicidade e pureza devidas a Cristo” (2Co 11.3). 

            Um dos métodos de Satanás, é aproveitar a nossa distração. Quando relaxamos a nossa defesa em determinado ponto, ali tornar-se-á a sua prioridade. Satanás sabe escolher e manusear com sagacidade as suas armas. Como disse Spurgeon (1834-1892): “Se você for um gigante, ele não vai aparecer diante de você com estilingue e uma pedra. Virá armado até os dentes para derrubá-lo”.[14]

            Aliás, este fato vem indicar que Satanás não é uma força impessoal; uma força não planeja, não faz tramas, nem arma ciladas; isto é próprio de um ser pessoal. O seu nome Satana=j[15] indica de fato aquilo que ele é: “O adversário”.

            Ele prepara ciladas para que, dominados por ele, façamos a sua vontade. Paulo exorta aos efésios: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus,[16] para poderdes ficar firmes contra as ciladas (meqode/ia)[17]do diabo”(Ef 6.11).

            Esta palavra envolve um “plano ou sistema deliberado”.  Ela é da mesma raiz da nossa palavra “método” (me/qodoj).[18] As ciladas de Satanás visam sempre nos induzir ao erro. Ele, portanto, atua de forma metódica, seguindo sempre um plano para obter êxito nos seus propósitos.

            Paulo, falando dos critérios necessários para o presbiterato, diz: É necessário que ele tenha bom testemunho dos de fora, a fim de não cair no opróbrio e no laço (pagi/j)[19]do diabo”(1Tm 3.7). Nos laços e armadilhas preparados pelo diabo.

            Não é à toa que no Apocalipse, Satanás é denominado de “o sedutor (plana/w) (= enganador, extraviador, desencaminhador) de todo o mundo”(Ap 12.9).

Maringá, 05 de agosto de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]“Ninguém pode entrar na casa do valente para roubar-lhe os bens, sem primeiro amarrá-lo; e só então lhe saqueará a casa” (Mc 3.27).

[2]Fui alentando em saber que esta perspectiva que adoto há algumas décadas, também é sustentada por Sproul. (Veja-se: R.C. Sproul, Somos todos teólogos: uma introdução à teologia, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2017, p. 381).

[3]“Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos que lhe era necessário seguir para Jerusalém e sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais sacerdotes e dos escribas, ser morto e ressuscitado no terceiro dia” (Mt 16.21).

[4] “Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego” (Rm 1.16). “Ele nos libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor” (Cl 1.13). “E, então, virá o fim, quando ele entregar o reino ao Deus e Pai, quando houver destruído todo principado, bem como toda potestade e poder” (1Co 15.24). 25Maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela, 26para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra, 27 para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito” (Ef 5.25-27). 24 Ora, àquele que é poderoso para vos guardar de tropeços e para vos apresentar com exultação, imaculados diante da sua glória, 25 ao único Deus, nosso Salvador, mediante Jesus Cristo, Senhor nosso, glória, majestade, império e soberania, antes de todas as eras, e agora, e por todos os séculos. Amém!” (Jd 24-25).

[5]Juan Calvino, Resposta ao Cardeal Sadoleto, 4. ed. Barcelona: Fundación Editorial de Literatura Reformada, 1990, p. 30-31.

[6]“Para que Satanás não alcance vantagem sobre nós, pois não lhe ignoramos os desígnios (no/hma)(2Co 2.11). A palavra traduzida por “desígnio” (no/hma), ocorre cinco vezes no NT., sendo utilizada apenas por Paulo: 2Co 2.11; 3.14; 4.4; 10.5; 11.3; Fp 4.7, tendo o sentido de “plano” (Platão, Político,São Paulo: Abril Cultural (Os Pensadores, v. 3), 1972, 260d), “intenção maligna”, “intrigas”, “ardis”. Com exceção de Fp 4.7, a palavra sempre é usada negativamente no NT. No/hma é o resultado da atividade do nou=j (mente); (J. Behm, noe/w, etc. In: Gerhard Kittel; G. Friedrich, eds. Theological Dictionary of the New Testament,Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1983 (Reprinted), v. 4, p. 960). “É a faculdade geral do juízo, que pode tomar decisões e pronunciar certos ou errados os veredictos, conforme as influências às quais tem sido expostas” (J. Goetzmann, Razão: In: Colin Brown, ed. ger. ONovo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 4, p. 32).

[7] “Satanás não tem propósitos construtivos; suas táticas são simplesmente para contrariar a Deus e destruir os homens” (J.I. Packer, Vocábulos de Deus,São José dos Campos, SP.: Fiel, 1994, p. 82-83).

[8]D. M. Lloyd-Jones, O Combate Cristão, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1991, p. 90.

[9]“Ó filho do diabo, cheio de todo o engano e de toda a malícia, inimigo de toda a justiça, não cessarás de perverter os retos caminhos do Senhor?” (At 13.10). “Satanás aplica toda sua energia pra tirar qualquer coisa de Cristo” (João Calvino, O evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 1.3), p. 35). “Satanás não tem propósitos construtivos; suas táticas são simplesmente para contrariar a Deus e destruir os homens” (J.I. Packer, Vocábulos de Deus,São José dos Campos, SP.: Fiel, 1994, p. 82-83).

[10] Veja-se: P. Andrew Sandlin, Deus decide o que é normal, Brasília, DF.: Editora Monergismo, 2021, p. 9-11.  (Edição do Kindle).

[11] D.M. Lloyd-Jones, O Combate Cristão, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1991, p. 75.

[12] Iain Murray, Como a Escócia perdeu sua firmeza na Palavra: In: John F. MacArthur, org.,  A Palavra Inerrante, São Paulo: Cultura Cristã, 2018, [p. 149-171], p. 162.

[13]Ocorre 5 vezes no NT.: Lc 20.23; 1Co 3.19; 2Co 4.2; 11.3; Ef 4.14.

[14]C.H. Spurgeon, Um Antídoto contra os Artifícios de Satanás: In: Bruce H. Wilkinson, ed. ger. Vitória sobre a Tentação, 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1999, p. 184.

[15] NT. * Mc 1.13; At 26.18; 2Co 2.11; 12.7; 2Ts 2.9; 1Tm 5.15; Ap 2.9,13; 3.9.

[16]Quanto à armadura romana e o treinamento do exército, Veja-se: Flavio Josefo, La Guerras de los Judios, Barcelona: CLIE., [1985], Tomo I, III.3. p. 311ss.

[17] A palavra “cilada” significa, “tramas”, “ardis”, “maquinações”, “astúcia”. [* Ef. 4.14 (aqui traduzida por “induzir” (ARA); “enganar” (ARC); 6.11]. Este é o significado original da palavra, variando conforme a conjunção com outras (Veja-se: entre outras obras, H.E. Dana; Julius R. Mantey, Manual de Gramatica del Nuevo Testamento Griego,Buenos Aires: Casa Bautista de Publicaciones, 1975, p. 104-105).  Meqode/ia é da mesma raiz da nossa palavra “método”, que também provém do grego me/qodoj, termo formado por meta/ (“no meio de”, “no centro de”) e o(do/j (“caminho”). Em Aristóteles (384-322) a palavra (me/qodoj) tinha o sentido de “investigação”, sendo por vezes usada como sinônimo de “teoria” (qewri/a) e “ciência” (e)pisth/mh).(Veja-se: Aristóteles, Física,III, 1; 200 b 13; VII, 1; 251 a 7, etc. Cf. Método: In: A. Lalande, Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia, São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 678. [Observações de R. Eucken e J. Lachelier]). Etimologicamente, portanto, método é o emprego de um caminho, andar dentro e por meio dele. Podemos definir operacionalmente método, como o conjunto de elementos e processos necessários a se obter determinado objetivo. É o caminho para a consecução de um objetivo proposto. Lalande (1867-1963) acentua que etimologicamente a palavra significa demanda e, “por consequência, esforço para atingir um fim, investigação, estudo” (Método: A. Lalande, Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia, p. 678).

[18] Esta não ocorre nas Escrituras.

[19] pagi/j significa “armadilha”, “rede”, “laço” [* Lc 21.34 (ARA) na ACR e BJ, no verso 35; Rm 11.9; 1Tm 3.7; 6.9; 2Tm 2.26].

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