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Teologia da Evangelização (39) - Hermisten Maia

Teologia da Evangelização (39)

2.4.3.2.2.4. A Fé salvífica 

Enquanto o Senhor não os abrir, os olhos de nosso coração são cegos. − João Calvino.[1]

Reconheço e declaro que a fé é propriamente, toda ela, obra do Espírito Santo, por cuja iluminação conhecemos a Deus e os imensos tesouros da Sua bondade; e mais, sem a Sua luz o nosso entendimento seria tão cego que nós não poderíamos ver coisa alguma, e tão desprovido de sensibilidade que não poderíamos perceber e acolher bem as realidades espirituais. − João Calvino.[2]

A fé é a boa obra do Espírito Santo em nós (Jo 6.29). Esta obra celestial é excelente e grandiosa, com efeitos transformadores em nossa vida em todas as dimensões.

Essa compreensão concernente à fé pressupõe a nossa condição de pecadores[3] necessitados de salvação e, também, a livre graça de Deus manifestada de forma efetiva.

A fé é o dom da resposta confiante na misericórdia de Deus; é a nossa declaração de que Deus efetuou de forma poderosa e eficaz o nosso novo nascimento. Passamos a ter vida.

A fé é, portanto, o nosso primeiro ato após a nossa ressurreição espiritual.[4] “A fé salvadora, desde o início, dirige os olhos de nossa mente e de nosso coração para longe de nós mesmos e na direção da graça de Deus em Cristo”, escreve Bavinck.[5]

          Assim sendo, denominamos de fé salvífica aquele dom da graça de Deus, por meio do qual somos habilitados a receber a Jesus Cristo como nosso único e suficiente Salvador e, a crer em todas as promessas do Deus Triúno, conforme estão registradas nas Escrituras.

          O Catecismo MenordeWestminster (1647) na questão 86, assim define: “Fé em Jesus Cristo é uma graça salvadora, pela qual o recebemos e confiamos só nele para a salvação, como ele nos é oferecido no Evangelho”.

          A fé salvífica é produto da graça de Deus em nosso coração, que age por meio da sua Palavra registrada na Bíblia (At 3.16; At 14.27; 18.27; Rm 10.17; Ef 2.8; 6.23; Fp 1.29; Hb 12.2; Tg 1.18; 1Pe 1.23; 1Jo 5.1-5).[6]

          A genuína fé, identificada como salvadora, não é uma crença qualquer, cujo teor seja indefinido, tendo como virtude apenas o fato de poder crer; uma espécie de fé na fé. Ao contrário disso, tem como conteúdo, a Jesus Cristo como Senhor e Salvador.

          Fé é o abandono de toda confiança em obra produzida por nós mesmos como fundamento de nossa justificação e salvação. A fé está convencida intelectualmente de sua veracidade e incontestabilidade (Hb 11.1).[7] Além deste elemento intelectual, consiste em uma rendição incondicional ao seu Senhor, em quem descansa de forma amorosa e confiante.[8]

          A fé que não parte de um conhecimento verdadeiro e, por isso mesmo, não é vivencial, não é a verdadeira fé bíblica. A verdadeira fé manifesta-se em uma confiança existencial, a qual rege o nosso coração. A fé é persuadida pelo conhecimento que a possibilitou crer.[9] “A fé salvadora é um conhecimento seguro que produz segurança e certeza. Conhecimento e segurança caminham juntos”, interpreta Bavinck.[10]

          É necessário que conheçamos o Senhor das Escrituras para que a nossa fé não se ampare em apenas uma invenção de nossa mente, num ser idealizado, uma projeção intelectual a respeito de Jesus, distante, portanto, da plenitude da revelação bíblica.

          Quando Paulo e Barnabé chegam à Igreja de Antioquia, dão um relato sumário de seu trabalho. Eles desejam compartilhar com todos. Registra Lucas: Ali chegados, reunida a igreja, relataram quantas coisas fizera Deus com eles e como abrira aos gentios a porta da fé(At 14.27).

          No seu testemunho, enfatizam o poder soberano e operante de Deus em seu ministério e, como Deus operou eficazmente chamando os seus pela fé. É por meio da Palavra que Deus nos gerou espiritualmente, tornando-nos seus filhos. De fato, o Espírito aplica em nós a salvação obtida por Cristo para o seu povo operando a fé em nós.

          Ao despedir-se dos presbíteros de Éfeso, Paulo relata aspectos de seu ministério dos quais aqueles irmãos foram testemunhas. Diz então que durante aqueles 3 anos de pastorado entre eles, passou “testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo” (At 20.21). Os efésios sabiam dessa realidade.

          São Paulo, 19 de agosto de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]João Calvino, Efésios,São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 1.16), p. 41.

[2]João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 3 (III.10), p. 145.

[3] Veja-se o desenvolvimento deste argumento em: Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 408ss.

[4]Cf. John MacArthur, O Evangelho Segundo os Apóstolos, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2011, p. 88.

[5] Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 223.

[6] “Pela fé em o nome de Jesus, é que esse mesmo nome fortaleceu a este homem que agora vedes e reconheceis; sim, a fé que vem por meio de Jesus deu a este saúde perfeita na presença de todos vós” (At 3.16). “Querendo ele percorrer a Acaia, animaram-no os irmãos e escreveram aos discípulos para o receberem. Tendo chegado, auxiliou muito aqueles que, mediante a graça, haviam crido(At 18.27). Paz seja com os irmãos e amor com fé, da parte de Deus Pai e do Senhor Jesus Cristo(Ef 6.23). “Porque vos foi concedida a graça de padecerdes por Cristo e não somente de crerdes nele (Fp 1.29). “Olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus” (Hb 12.2).“Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo é nascido de Deus; e todo aquele que ama ao que o gerou também ama ao que dele é nascido. 2 Nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus: quando amamos a Deus e praticamos os seus mandamentos. 3 Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; ora, os seus mandamentos não são penosos, 4 porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé. 5 Quem é o que vence o mundo, senão aquele que crê ser Jesus o Filho de Deus?” (1Jo 5.1-5). (Destaques meus).

[7]“Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem” (Hb 11.1).

[8]Para uma descrição sumária deste ponto, entre outros, vejam-se: R.C. Sproul, O Que é teologia Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 59-60; L. Berkhof, Teologia Sistemática, Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 506-508; Hermisten M.P. Costa, Eu Creio, São Paulo: Paracletos, 2002, p. 103-104; Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 409-412. Para uma abordagem histórico-crítica um pouco mais ampla, veja-se: Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 128-135; 212-215.

[9]Veja-se: Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 412.

[10]Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 99. Veja-se: Alister E. McGrath, Surpreendido pelo sentido: ciência, fé e o sentido das coisas, São Paulo: Hagnos, 2015, p. 14-15.

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