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Teologia da Evangelização (156) - Hermisten Maia

Teologia da Evangelização (156)

4.3.5.5.3. Significado kerigmático (proclamante)

Como temos visto, a ressurreição de Cristo dá sentido à pregação fiel da Igreja (1Co 15.14). A genuína e autoritativa  pregação, não se baseia em fábulas e mitos por ela arquitetados (2Tm 4.3,4), mas sim, naquilo que Deus disse e realizou, conforme registrado nas Escrituras.

          A mensagem apostólica, como destacamos, enfatizou a realidade histórica da ressurreição de Jesus Cristo (Vejam-se: At 1.22; 2.24; 3.15; 4.10,33; 5.30; 10.39-41; 17.2,3,17,18; 26.23). A ressurreição, além de essencial ao sentido da vida e da morte, tornou-se essencial à viva pregação cristã.[1]

A ressurreição era tema recorrente na pregação  (1Co 15.12,14,15/At 17.18). Sem a ressurreição, não haveria boa nova, não haveria evangelho nem atos salvadores de Deus para serem anunciados.

           Em Atos, a ressurreição está presente em todos os sermões.[2] (At 8.5; Rm 10.8-10; 1Co 15.1,3,4,12; 2Tm 2.8). “Sem a ressurreição não podemos consolar-nos de nenhuma maneira; todos os argumentos possíveis serão insuficientes para alegrar-nos”, conclui Calvino.[3]

          Portanto, o culto da Igreja primitiva centrava-se não simplesmente nos acontecimentos da sexta-feira da paixão, mas, no domingo da ressurreição quando a vitória sobre a morte, o mundo e satanás foi decisivamente proclamada. Certamente o fato mais importante concernente à adoração no Novo Testamento, é a centralidade de Jesus Cristo,[4] Aquele que é o cumprimento das promessas e profecias do Antigo Testamento, sendo o Senhor e Mediador único e definitivo da Aliança selada entre Deus e o seu Povo.

          Provavelmente no início do 5º século da Era Cristã, Agostinho (354-430) fazendo uma distinção entre a “fé cristã” e pagã, escreve:

A fé dos cristãos não é louvável porque eles creem no Cristo que morreu, mas no Cristo que ressuscitou. Pois, também o pagão acredita que ele morreu e te acusa como de um crime teres acreditado num morto. Que tens, portanto, de louvável? Teres acreditado que Cristo ressuscitou e esperar que hás de ressuscitar por Cristo. Nisto consiste uma fé louvável. ‘Se confessares com tua boca que Jesus é Senhor e creres em teu coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo’ (Rm 10.9). (…) Esta é a fé dos cristãos.[5]

          Na evangelização a Igreja declara a sua fé na ressurreição de Cristo, anunciando a remissão de pecados para todos os que crerem no Senhor que morreu e ressuscitou. E mais: foi após a ressurreição que o Senhor Jesus ordenou a Grande Comissão. A ressurreição atesta e sustenta a missão da Igreja. Afinal, é o Senhor ressurreto quem a ordena.[6]

4.3.5.5.4. Significado vivencial

A ressurreição de Cristo é associada por Paulo à nossa responsabilidade de viver diariamente na presença do Cristo vivo, frutificando para Deus.

          O nosso velho homem morreu com Cristo e, por meio da sua ressurreição surgiu um novo homem que se consagra inteiramente ao seu Senhor. Assim, a santificação encontra a sua real possibilidade na ressurreição de Cristo, sendo este fato um estímulo constante a vivermos dignamente para Deus. (Ver: Rm 6.4-14; 7.4).

          O fato de morrermos e ressuscitarmos com Cristo traz, portanto, como implicação fundamental, a responsabilidade de viver a ética do reino nesta vida. A nossa ressurreição com Cristo implica valores novos, celestiais, os quais devem ser sempre considerados em nossos pensamentos, decisões e atitudes (Cl 3.1-4/Rm 6.11-14). Somos chamados a viver a realidade de nossa nova natureza em santidade.

          Após argumentar acerca da veracidade da morte e ressurreição de Cristo, Paulo exorta: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes, inabaláveis, e sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é vão”(1Co 15.58).

4.3.5.5.5. Significado escatológico

A ressurreição de Cristo é o fundamento da esperança futura da nossa ressurreição (1Co 15.19).[7] Biblicamente nós não podemos separar a ressurreição de Cristo da nossa. Ou aceitamos as duas ou as negamos; não podemos dissociá-las. Parece que era este o problema de alguns membros da Igreja de Corinto.

          Pelo que Paulo escreve, deixa entender que alguns irmãos aceitavam a ressurreição de Cristo; porém, negavam a ressurreição dos crentes. O apóstolo argumenta que negar a ressurreição futura dos crentes, equivale a negar a historicidade da ressurreição de Cristo (1Co 15.12-19). O fato é que a ressurreição de Cristo dá sentido à nossa esperança. A história da ressurreição de Cristo é o fundamento e prenúncio da nossa ressurreição futura (Vejam-se: Rm 6.5; 8.11; 1Co 6.14; 15.20; 2Co 4.14).

          Cristo é as primícias daqueles que virão posteriormente por meio dele. Em Cristo temos o penhor do Espírito, a garantia da nossa ressurreição. Esta é a nossa esperança; e, para ela fomos regenerados pela ressurreição de Jesus Cristo (Cf. 1Pe 1.3). Como escreveu Agostinho: “Crer na Ressurreição do Senhor de entre os mortos e em sua Ascensão ao céu fortalece nossa fé com uma grande esperança”.[8]

          O corpo de Cristo ressurreto é o modelo do corpo glorioso que teremos na eternidade (Cf. Fp 3.21; 1Jo 3.2/1Co 15.42-44, 50-56). “Assim como Ele ressuscitou no mesmo corpo no qual tinha padecido e o qual, todavia, teve depois outra glória, diferente da de antes, assim também nós ressuscitaremos com o mesmo corpo que agora temos, e, contudo, seremos diferentes depois da ressurreição”, interpreta Calvino.[9]

***

          Concluindo este capítulo, destaquemos algumas implicações doutrinárias e práticas:

1) A certeza da ressurreição de Cristo está alicerçada em seu coração? (Leia: Rm 10.9-10). “Declaramos positivamente que ninguém tem feito nenhum progresso na escola de Cristo, a menos que espere rejubilante o dia de sua morte e ressurreição final”, comenta Calvino.[10]

2) A ressurreição de Cristo é o selo que garante a nossa salvação e ressurreição para a vida eterna (At 26.23; 1Co 15.20,23).

3) O Cristianismo é uma religião de ressurreição. A ressurreição é o ponto de convergência da nossa fé. Negar a veracidade histórica da ressurreição de Cristo significa tirar toda a razão de ser, histórica e transcendente do Cristianismo.

Sem a ressurreição de Cristo, é vã a nossa fé, vã a nossa pregação, vã a nossa esperança, vã a nossa vida. A ressurreição de Cristo dá sentido à nossa vida e morte, fé e esperança. Ela confere significado ao aqui e agora e ao além e depois. (1Co 15.12-16,32).

A conclusão da argumentação de Paulo é: “Se Jesus não foi ressuscitado, os crentes não têm esperança da ressurreição e podem apelar às filosofias hedonistas da vida”, infere Habermas.[11]

4) A ressurreição de Cristo indica de forma definitiva a sua filiação divina (Rm 1.4).

5) A certeza da presença do Cristo vivo em nosso meio deve ser um estímulo a uma vida consagrada a Deus (Rm 6.8-7.6).

6) O fato da ressurreição é motivo de conforto e estímulo para os fiéis que perseveram em sua fé aguardando o retorno glorioso de Jesus Cristo.

 

Maringá, 30 de janeiro de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] “A ressurreição de Cristo não era apenas uma doutrina essencial para a igreja primitiva; antes, a ressurreição de Cristo está no cerne da proclamação apostólica ― e no testemunho da igreja hoje” (Albert Mohler Jr., O Credo dos Apóstolos: Descobrindo o Cristianismo autêntico em uma era de falsificações, Rio de Janeiro, Pro Nobis Editora, 2021, p. 120).

[2] Veja-se: Hermisten M.P. Costa, Eu Creio, São Paulo: Parakletos, 2002, p. 313-314.

[3] Juan Calvino, Se Deus fuera nuestro Adversario: In: Sermones Sobre Job, Jenison, Michigan: T.E.L.L., 1988, (Sermon nº 6), p. 85.

[4] Cf. John M. Frame, Worship in Spirit and Truth, Phillipsburg, NJ.: P & R. Publishing, 1996, p. 25ss.

[5]Agostinho, Comentário aos Salmos, São Paulo: Paulus, (Patrística, 9/3), 1998, v. 3, (Sl 101), p. 32-33.

[6] Veja-se: John Stott, Ouça o Espírito, Ouça o Mundo,São Paulo: ABU Editora, 1997, p. 408-409.

[7]Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes de todos os homens” (1Co 15.19).

[8] St. Agostinho, A Doutrina Cristã, São Paulo: Paulinas, 1991, I.15.14, p. 63.

[9]João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 2, (II.4), p. 122. Ver: Charles Hodge, Teologia Sistemática, p. 952-953.

[10]João Calvino, A Verdadeira Vida Cristã, São Paulo: Novo Século, 2000, p. 66.

[11]G.R. Habermas, Ressurreição de Cristo: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, São Paulo: Vida Nova, 1990, v. 3, p. 290.

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