Teologia da Evangelização (151)
4.3.5.2.2.2. As aparições de Jesus
O Senhor ressurreto apareceu durante quarenta dias (At 1.3) a várias pessoas em cerca de 13 ocasiões diferentes, dando prova evidente da sua ressurreição. Paulo faz um sumário das aparições de Jesus ressurreto (1Co 15.3-8).[1]
4.3.5.2.2.3. A Transformação dos discípulos
Apesar de sua a priori autoconfiança ingênua, os discípulos, diante da prisão de Jesus, fogem deixando-o em mãos de seus algozes (Mt 26.33-35;56). Após a sua crucificação, estão atemorizados, às portas trancadas (Jo 20.19,26); agora, após a confirmação da ressurreição de Cristo, Pedro – que antes negou a Cristo três vezes –, juntamente com João, dá testemunho corajoso diante das autoridades judaicas (At 4.13,18-20; 5.29).
Esta transformação só pode ser explicada pela certeza da presença confortadora do Cristo vivo entre eles (Mt 28.20). Os apóstolos jamais extrairiam esta coragem de uma mentira por eles inventada; esta ousadia era fruto do Espírito de Cristo que neles habitava (2Tm 1.7).
4.3.5.2.2.4. A Pregação apostólica
A certeza e o significado da ressurreição de Cristo estavam tão nítidos na mente e nos corações dos discípulos, que todos os seus sermões tinham como clímax histórico, a ressurreição.
A mensagem apostólica apontava para a vitória de Deus sobre o pecado e a morte, por meio da ressurreição de Cristo. A pregação apostólica se baseava nas Palavras e nos atos salvadores de Deus na História; e, a ressurreição foi um fato histórico (Ver: At 1.22; 2.24; 3.15; 4.10,33. 5.30; 10.39-41; 17.2,3,17,18; 26.23; 1Co 15.12).
Como temos enfatizado, Paulo em Atenas, “pregava (eu)aggeli/zomai) a Jesus e a ressurreição” (At 17.18). A ressurreição era a tônica de toda mensagem apostólica. sem a ressurreição de Cristo não haveria pregação, nem fé, nem esperança.
No livro de Atos, não encontramos nenhum sermão em que a ressurreição não fizesse parte da proclamação (At 8.5; Rm 10.8-10; 1Co 15.1,3,4,12; 2Tm 2.8). Mesmo que muitos estudiosos céticos não creiam na ressurreição de Cristo, têm de admitir: os discípulos criam e a proclamavam. O Evangelho é essencialmente cristocêntrico e, a ressurreição do Senhor faz parte essencial dessa mensagem.
4.3.5.2.2.5. A Conversão de muitíssimos sacerdotes
Humanamente falando, os sacerdotes judeus para aceitarem a pregação de Jesus como o Cristo, precisavam estar certos da realidade da Sua ressurreição, já que tudo parecia ser o oposto (por exemplo: A crença predominante de um Messias militar, o boato forjado pelos principais sacerdotes de que os discípulos de Jesus roubaram o seu corpo, etc.). Entretanto, o Deus que age mediante a verdade, agiu em suas mentes e corações por meio da realidade da ressurreição histórica de Cristo (Cf. At 6.7).
4.3.5.2.2.6. A Conversão de Saulo
Saulo teve a sua vida transformada pelo confronto com o Cristo ressurreto (At 9.1-6). Saulo, o perseguidor, agora é Paulo o perseguido, disposto a dar a sua vida – como de fato deu –, por amor ao Cristo vivo (Vejam-se: At 20.22-24; 21.13; 2Tm 4.6-8).
Paulo transforma-se no pregador efetivo do Cristo ressurreto, o qual lhe aparecera no caminho de Damasco e, era uma realidade viva em sua existência (At 22.6-10; 26.8-18). Vinte anos depois do seu encontro com Senhor vivo, Paulo se inclui entre aqueles que viram o Senhor ressurreto, dizendo: “E, afinal, depois de todos, foi visto também por mim, como por um nascido fora de tempo”(1Co 15.8).
4.3.5.2.2.7. A observância do domingo[2]
É fato que no Novo Testamento não encontramos nenhuma ordem ou mesmo ensinamento para a Igreja se reunir no domingo; se isto é assim, por que, então, a Igreja substituiu o sábado pelo domingo? A resposta para esta pergunta encontra-se nas páginas do Novo Testamento e, também, na História da Igreja dos séculos posteriores. O Novo Testamento nos mostra que a ressurreição de Cristo deu-se “no primeiro dia da semana” (domingo) e, que algumas das Suas aparições deram-se também no domingo (Cf. Mc 16.2,9; Jo 20.1,19,26).[3]
O sábado está relacionado ao evento histórico da libertação do povo do Egito (Dt 5.15).[4] Além, obviamente da lembrança desse fato histórico, o sábado assume um caráter de gratidão a Deus por sua libertação e preservação; é um convite irrestrito a meditarmos na bondade e misericórdia de Deus para com o Seu povo. Guardar o sábado significa preservar a aliança (Ex 31.16).[5]
No Novo Testamento, a associação do dia de descanso com a ressurreição de Cristo foi mais do que natural, visto que é em Cristo que encontramos a verdadeira e total liberdade (Jo 8.32,36) e o padrão que assinala “antecipadamente a perfeição da obra recriadora”, assinala Van Groningen (1921-2014). [6] “Na ressurreição, Deus trouxe ao cumprimento final seu programa criativo/redentivo. A criação original produziu o mundo. Mas a criação-ressurreição trouxe o mundo à sua destinada perfeição”, enfatiza Robertson.[7]
A Igreja do Novo Testamento era primordialmente composta de judeus, os quais jamais mudariam a guarda do sábado – que era um sinal da aliança feita entre Deus e o povo (Ex 31.13; Ez 20.12,20)[8] – pelo domingo, se não tivesse um motivo bastante consistente e, mais ainda, se apóstolos, presbíteros e os crentes em geral, não estivessem convictos da aprovação divina.[9]
Deve ser mencionado que mesmo as Igrejas estando sempre com um grande número de judeus, em Atos e nas Epístolas, não encontramos nenhuma discussão ou mesmo menção de problemas relacionados à substituição gradual do sábado pelo domingo.
O único motivo que nos parece plausível para esta mudança, é a certeza de que Cristo ressuscitou no primeiro dia da semana, passando aos poucos os cristãos a se reunirem em casas, no primeiro dia da semana, já que ainda não havia templo cristão (At 20.7; 1Co 16.2). Mais tarde, já no final do primeiro século, João narrando a visão que teve do Senhor, diz que a recebeu no “dia do Senhor”(Ap 1.10), provavelmente se referindo ao dia que a Igreja reservara para o culto cristão.
Outro documento que atesta a antiguidade da guarda do domingo por parte da Igreja Cristã, é o Didaquê (c. 120 AD), texto anônimo, o qual usa a mesma linguagem de João se referindo ao domingo como o “dia do Senhor”. Assim, aludindo à reunião da Igreja, diz: “Reunindo-vos no dia do Senhor, parti o pão e dai graças….”.[10]
Do mesmo modo, em outro documento escrito por Justino (100-167 AD), por volta do ano 150 – no qual temos a mais completa descrição do culto na Igreja Primitiva –, deparamo-nos com a mesma referência.
No dia que se chama do sol [domingo],[11] celebra-se uma reunião de todos os que moram nas cidades ou nos campos, e aí se leem, enquanto o tempo o permite, as Memórias dos apóstolos [quatro Evangelhos][12] ou os escritos dos profetas….”.[13]
Justino, explicando o motivo porque a Igreja se reunia para cultuar a Deus no domingo, diz: “Celebramos essa reunião geral no dia do sol, porque foi o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria, fez o mundo, e também o dia em que Jesus Cristo, nosso Salvador, ressuscitou dos mortos”.[14]
Portanto, meus irmãos, a observância do primeiro dia da semana é um sinal evidente de que a Igreja sempre creu na ressurreição de Jesus Cristo.
Maringá, 15 de janeiro de 2023.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] Ver também: Mt 28.9,16,17; Mc 16.9; Lc 24.13-15; 36-50; Jo 20.24-29; 21.1,14; At 2.32; 3.15.
[2] Veja-se: Hermisten M.P. Costa, Princípios Bíblicos de Adoração Cristã, São Paulo: Cultura Cristã, 2009.
[3] “E, muito cedo, no primeiro dia da semana, ao despontar do sol, foram ao túmulo” (Mc 16.2). “Havendo ele ressuscitado de manhã cedo no primeiro dia da semana, apareceu primeiro a Maria Madalena, da qual expelira sete demônios” (Mc 16.9). “No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu que a pedra estava revolvida” (Jo 20.1). “Ao cair da tarde daquele dia, o primeiro da semana, trancadas as portas da casa onde estavam os discípulos com medo dos judeus, veio Jesus, pôs-se no meio e disse-lhes: Paz seja convosco!” (Jo 20.19). “Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos, e Tomé, com eles. Estando as portas trancadas, veio Jesus, pôs-se no meio e disse-lhes: Paz seja convosco!” (Jo 20.26).
[4] “Porque te lembrarás que foste servo na terra do Egito e que o SENHOR, teu Deus, te tirou dali com mão poderosa e braço estendido; pelo que o SENHOR, teu Deus, te ordenou que guardasses o dia de sábado” (Dt 5.15).
[5] “Pelo que os filhos de Israel guardarão o sábado, celebrando-o por aliança perpétua nas suas gerações”(Ex 31.16).
[6] Gerard Van Groningen, O Sábado no Antigo Testamento: Tempo para o Senhor, Tempo de Alegria Nele (II): In: Fides Reformata, 4/1 (1999), p. 132.
[7]O. Palmer Robertson, Cristo dos Pactos, Campinas,SP.: Luz para o Caminho, 1997, p. 66-67. Veja-se: Gerard Van Groningen, O Sábado no Antigo Testamento: Tempo para o Senhor, Tempo de Alegria Nele (II): In: Fides Reformata, 4/1 (1999), p. 136.
[8] “Tu, pois, falarás aos filhos de Israel e lhes dirás: Certamente, guardareis os meus sábados; pois é sinal entre mim e vós nas vossas gerações; para que saibais que eu sou o SENHOR, que vos santifica” (Ex 31.13). “Também lhes dei os meus sábados, para servirem de sinal entre mim e eles, para que soubessem que eu sou o SENHOR que os santifica” (Ez 20.12). “Santificai os meus sábados, pois servirão de sinal entre mim e vós, para que saibais que eu sou o SENHOR, vosso Deus” (Ez 20.20).
[9] Calvino também é dessa opinião, ao dizer: “Ora, o Dia do Senhor foi escolhido em preferência a todos os demais, visto que a ressurreição de nosso Senhor pôs fim às sombras da lei. Portanto, este dia nos leva a recordar de nossa liberdade cristã” (João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, São Paulo: Paracletos, 1996, (1Co 16.2), p. 500).
[10]Didaquê, XIV. In: J.G. Salvador, ed. O Didaquê, São Paulo: Imprensa Metodista, 1957, p. 75.
[11] Cf. Justino de Roma, I Apologia, São Paulo: Paulus, 1995, 67.7. p. 83-84. Essa prática que tornou-se comum no Novo Testamento, perpetuou-se na Igreja Cristã e, já no segundo século encontramos farto material atestando o culto dominical. (Vejam-se: The Epistle of Barnabas, XV. In: Alexander Roberts; James Donaldson, eds. The Ante-Nicene Fathers, Peabody, Massachusetts, Hendrickson Publishers, 1995, v. 1, p. 147; Carta aos Magnésios, 9. In: Cartas de Santo Inácio de Antioquia, 3. ed. Petrópolis, RJ.: Vozes, 1984, p. 53).
[12]Esta expressão de Justino refere-se aos Evangelhos, conforme ele mesmo diz: “Foi isso o que os Apóstolos nas Memórias por eles escritas, que se chamam Evangelhos….” (Justino de Roma, I Apologia, 66.3. p. 82).
[13] Justino de Roma, I Apologia, 67. p. 83.
[14] Justino de Roma, I Apologia, 67. p. 83-84.