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Pessoa e Obra do Espírito Santo (199) - Hermisten Maia

Pessoa e Obra do Espírito Santo (199)

6.3.7. O Espírito, a conversão e as demais conversões 

Se o Espírito Santo só agisse no pregador, não haveria conversões. – Lloyd-Jones.[1]

É tão difícil e sobre-humana a obra do resgate de uma alma do pecado e de Satanás a Deus, que somente Deus pode fazer isto. (…) Deus, e somente Deus, então, é o Autor da conversão. Aquele que criou o homem, por si só pode criá-lo de novo em Cristo Jesus para as boas obras.  – M’Cheyne (1813-1843).[2]

Como é sabido, no dia 31 de outubro de 1517, Lutero afixou na Catedral de Wittenberg as 95 teses as quais se tornariam em um marco importante para a eclosão do que seria conhecida como Reforma Protestante. Na primeira e terceira tese, lemos:

Ao dizer “Arrependei-vos”: etc. (Mt 4.17), o nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo quis que toda a vida dos fiéis fosse de arrependimento. (…) No entanto, ela não se refere apenas a uma penitência [arrependimento] interior; penitência [arrependimento] interior seria nula se não produzisse externamente todo tipo de mortificação da carne.[3]

                                                           6.3.7.1. Conversões diversas

                                                                                            A história da humanidade está repleta de “conversões”, fruto de uma consciência de seus erros, quer pelas consequências de seus atos, a leitura de um livro, o testemunho de uma pessoa, uma experiência marcante ou, uma alegada “revelação”.

          Devemos entender que o homem, mesmo distante de Deus continua sendo a imagem de Deus, carente de seu Criador. Também, devemos estar atentos ao fato de que a revelação de Deus na natureza continua apontando para o seu Criador de forma contínua e eloquente.

          No Salmo 19 temos a harmonia de ambas as revelações de Deus. A natureza e a lei testemunham a respeito do mesmo Deus.[4] O Deus que “fala” na Natureza é o mesmo Deus que fez registrar a sua Palavra: ambas as revelações são inerrantes.

          O propósito do salmista é chegar à Revelação Especial de Deus, no entanto, em poucas palavras nos fala da Revelação Geral de Deus como sendo:

          1) Abundante (1): Os céus e o firmamento proclamam a mesma mensagem atestando o Deus Criador. Há uma pregação harmoniosa em toda criação a respeito da mente do Deus Criador.

          2) Contínua e incessante (2): Dia após dia, noite após noite a Criação dá testemunho a respeito de Deus.

          3) Compreensível (1-4): A voz de Deus pode ser ouvida e compreendida de forma eloquente por meio da criação.

          4) Universal (3-6). Em toda a Terra o testemunho do Senhor é evidente (Rm 10.18; Sl 50.6; 97.6). Temos aqui uma “linguagem visível”.[5]

          Deste modo, não nos deve surpreender se o testemunho de Deus na Criação de alguma forma conduz o homem natural ao senso do que é justo e reto.

          Paulo escreveu aos Romanos:

14 Quando, pois, os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos. 15 Estes mostram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-lhes também a consciência e os seus pensamentos, mutuamente acusando-se ou defendendo-se. (Rm 2.14-15).

          Bavinck constata que,

Todas as religiões e sistemas ganham influência por meio das conversões que realizam, as mudanças que produzem nas ideias, disposições e ações das pessoas. Algumas conversões são mais religiosas, outras são mais éticas e ainda outras são mais intelectuais ou ascéticas, mas todas concordam no fato de que a vida das pessoas é organizada em torno de um novo centro de ideias e que sua alma começa a tomar um interesse nas coisas que não conhecia antes, ou eram negligenciadas ou desprezadas.[6]

          Os habitantes da ilha de Malta (pertencente à Roma desde 218 a.C.) que viram uma serpente venenosa picar a mão de Paulo, prisioneiro, após ele ter escapado com vida do naufrágio, demonstraram ter um senso de justiça ainda que não conhecendo o Evangelho:[7]

Uma vez em terra, verificamos que a ilha se chamava Malta. 2 Os bárbaros trataram-nos com singular humanidade, porque, acendendo uma fogueira, acolheram-nos a todos por causa da chuva que caía e por causa do frio. 3 Tendo Paulo ajuntado e atirado à fogueira um feixe de gravetos, uma víbora, fugindo do calor, prendeu-se-lhe à mão. 4 Quando os bárbaros viram a víbora pendente da mão dele, disseram uns aos outros: Certamente, este homem é assassino, porque, salvo do mar, a Justiça não o deixa viver. 5 Porém ele, sacudindo o réptil no fogo, não sofreu mal nenhum; 6 mas eles esperavam que ele viesse a inchar ou a cair morto de repente. Mas, depois de muito esperar, vendo que nenhum mal lhe sucedia, mudando de parecer, diziam ser ele um deus. (At 28.1-6).[8]

Maringá, 30 de maio de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]David Martyn Lloyd-Jones, Cristianismo Autêntico: Sermões nos Atos dos Apóstolos. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2006, v. 2, p. 259.

[2] Robert Murray M’Cheyne, A Dificuldade e a Desejabilidade da Conversão, O Estandarte de Cristo. 2016, Edição do Kindle, p. 5.

[3] Brasil Presbiteriano, Ano 55, nº 707, Outubro de 2013, p. 12. Veja-se também, outra tradução in: http:www.monergismo.comtextoscredoslutero_teses.htm

[4]“A mudança de estilo adapta-se perfeitamente à mudança de tema, ambos os temas convivem poeticamente. Precisamente nisso está a graça do salmo” (Luís Alonso Schökel; Cecília Carniti, Salmos I: salmos 1-72, São Paulo: Paulus, 1996, p. 326). Veja-se: Alexander Maclaren, Psalms: In: W.R. Nicoll, ed., The Expositor’s Bible, [CD-ROM], (Rio, Wi: Ages Software, 2002, (Sl 19).

[5] João Calvino,O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 19.4), p. 418.

[6] Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 136.

[7] Vejam os pertinentes e esclarecedores comentários de Kistemaker (Simon Kistemaker, Atos, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 2, (At 28.1-6) p. 597-602).

[8]A ideia de que as divindades assumissem temporariamente uma forma humana, já fazia parte da religiosidade do povo. Homero, o grande poeta grego, em sua Odisseia, escrita por volta do séc. IX a.C., registrou: “Os deuses tomam às vezes a figura de estrangeiros, vindos de longes terras e, sob aspectos diversos, vão de cidade em cidade, a fim de ficarem conhecendo quais os homens soberbos e quais os justos” (Homero, Odisseia,São Paulo: Abril Cultural, 1979, XVII, p. 162).

Em outra passagem, na mesma obra, Homero narra como a deusa Palas Atena, filha de Zeus (= Júpiter), se aproximou em determinado momento, do seu protegido, Ulisses. “Dele se abeirou Atena, sob o aspecto de um adolescente pastor de ovelhas, gentil como são os filhos dos príncipes, os ombros recobertos de dupla e fina capa, trazendo nos pés reluzentes sandálias e na mão um cajado” (Homero, Odisseia,XIII. p. 123).

            Ulisses, no diálogo que se sucede após a identificação da deusa, diz: “Deusa, quando te aproximas de um mortal, muito dificilmente este te reconhecerá, por hábil que seja, porque tomas todos os aspectos” (Homero, Odisseia,XIII. p. 125).       

            O fato é que na Antiguidade a história estava repleta de intervenções divinas e, de certa forma o povo era governado pela divindade, visto que, especialmente no Oriente, o rei era tido como filho de algum deus. No Egito, o monarca reinante era considerado divino, sendo concebido como uma geração física do deus supremo, chamado Ré; o rei era uma espécie de epifania (manifestação) do próprio deus. Na Arábia, o rei era adorado como se fosse deus. Para os sumerianos, babilônios e árabes, o rei era visto como filho adotivo de um ou de vários deuses.

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