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Os eleitos de Deus e o seu caminhar no tempo e no teatro de Deus (21) - Hermisten Maia

Os eleitos de Deus e o seu caminhar no tempo e no teatro de Deus (21)

8. O Propósito da eleição

A eleição eterna, livre e graciosa de Deus envolve objetivos específicos. O propósito eterno de Deus é conduzir-nos para Ele mesmo: “E em amor nos predestinou (proori/saj)[1] para Ele” (Ef 1.4-5). Isto, por meio da adoção: “E em amor nos predestinou para Ele, para a adoção de filhos” (Ef 1.4-5).

 

Como temos enfatizado, os privilégios da vida cristã têm seu início em nossa união com Cristo. O ponto fundamental dessa união é a nossa adoção; tornamo-nos filhos de Deus. A redenção é que torna possível a adoção.

 

Deus nos liberta da escravidão, tornando-nos seus filhos: A Palavra nos diz que “Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar (e)cagora/zw)[2] os que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção (ui/oqesi/a)[3] de filhos” (Gl 4.4,5). Assim como a redenção, a adoção tem um sentido presente, desfrutado por todos os redimidos (Rm 8.15,16; Gl 4.6,7) e o seu aspecto futuro, já plenificado, o qual aguardamos (Rm 8.23).

 

A adoção é o clímax da predestinação. Aqueles aos quais Deus predestinou na eternidade, os redime e os adota, tornando-os seus filhos, por intermédio de Jesus Cristo, o nosso primogênito. “Por meio da fé, Cristo nos é comunicado, através de quem chegamos a Deus, e através de quem usufruímos os benefícios da adoção”, escreve Calvino.[4]

 

Fomos adotados pela graça de Deus, tornando-nos Seus filhos (Ef 1.5,6/Gl 4.4-6). “Entre todos os dons da graça, a adoção é o maior”, conclui Packer.[5] Daí a nossa gratidão sincera fazendo eco à exortação de Agostinho: “Não sejais ingratos para com a graça tão imensa daquele que tendo um único Filho não quis que Ele fosse o único. Para que tivesse irmãos, adotou filhos que, com o Filho, pudessem possuir a vida eterna”. [6]

 

Portanto, quando falamos de nossa filiação, devemos ter em mente que ela é um dom de Deus; “é o próprio Deus agindo graciosamente para conosco”, escreve Stott (1921-2011)[7]

 

O Catecismo de Heidelberg (1563), à pergunta 33 – “Por que é Ele chamado Filho UNIGÊNITO DE DEUS, se nós também somos filhos de Deus?” – responde: “Porque só Cristo é o Filho eterno de Deus, ao passo que nós, por Sua causa, e pela graça, somos recebidos como filhos de Deus”.

 

No Catecismo Maior de Westminster (1647), encontramos a relação estabelecida entre a necessidade de o Mediador ser homem e a nossa adoção. Na pergunta 39, lemos: “Por que era indispensável que o Mediador fosse homem?”.

 

R: …. Para poder soerguer a nossa natureza e possibilitar a obediência à lei, sofrer e interceder por nós em nossa natureza, e solidarizar-se com as nossas enfermidades, para que recebêssemos a adoção de filhos, e tivéssemos conforto e acesso, com confiança, ao trono da graça.

 

Na nossa adoção, vemos estampado o amor gracioso de Deus: “Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados filhos de Deus; e, de fato, somos filhos de Deus. Por essa razão, o mundo não nos conhece, porquanto não o conheceu a ele mesmo” (1Jo 3.1).

 

Deus em Seu amor eterno e insondável, escolheu-nos em Cristo, transformando totalmente a nossa situação: de condenados passamos a filhos e herdeiros de Deus e coerdeiros com Cristo: “Ora, se somos filhos, somos também herdeiros, herdeiros de Deus e coerdeiros com Cristo; se com ele sofremos, também com ele seremos glorificados” (Rm 8.17).

 

Ainda assim, aguardamos o que haveremos de ser. Na realidade, não mais do que filhos, visto que não há privilégio maior do que este. Amparados nas promessas e na grandiosidade do que temos, aguardamos a glória para nós preparada que ainda não se manifestou em sua plenitude, nem somos capazes de imaginar, visto que jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para os Seus filhos (Rm 8.18; 1Co 2.9; 2Co 4.17;Ef 3.20).[8] “Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é” (1Jo 3.2). Todas as demais bênçãos que recebemos, decorrem da “graciosa adoção divina como sua causa primeira” comenta Calvino.[9]

 

À luz do capítulo primeiro de Efésios, começaremos a analisar no próximo post alguns aspectos concernentes ao propósito de Deus em nossa eleição.

 

 

São Paulo, 16 de abril de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 

*Leia esta série completa aqui.

 


[1]Proori/saj aoristo de proori/zw, “predestinar”, “predeterminar”, “preordenar”, indica, no texto, o ato completo, feito por Deus na eternidade (*At 4.28; Rm 8.29,30; 1Co 2.7; Ef 1.5,11).

[2]E)cagora/zw: Redimir, resgatar (* Gl 3.13; 4.5; Ef 5.16; Cl 4.5). A palavra está relacionada à compra e venda de escravos nas praças, mercado (a)gora/). A forma intensiva usada por Paulo (e)cagora/zw), era também aplicada à redenção de escravos.

[3] ui/oqesi/a: (* Rm 8.15,23; 9.4; Gl 4.5; Ef 1.5).

[4]João Calvino, Efésios, São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 1.8), p. 30.

[5] J.I. Packer, O Conhecimento de Deus, p. 197.

[6] Agostinho, Comentário da Primeira Epístola de São João, São Paulo: Paulinas, 1989, p. 177.

[7]John R.W. Stott, A Cruz de Cristo, Miami: Editora Vida, 1991, p. 95.

[8] “Se acaso tivermos a pretensão de ser mais que filhos e herdeiros de Deus, teremos que subir mais alto que Cristo. Mas se temos nele o nosso limite extremo, não estaremos provocando Sua ira máxima, se buscarmos fora de Cristo o que já obtivemos nele, sendo que só o podemos obter nele? Além disso, visto que Cristo é a sabedoria eterna do Pai, a verdade imutável, o conselho inabalável, não devemos acreditar que o que Ele nos declara com Sua boca possa diferir um átomo que seja da vontade do Pai, a qual buscamos conhecer. Antes, Ele nos manifesta fielmente qual é a vontade do Pai, desde o princípio e para sempre” (João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 3, (III.8), p.  61).

[9] João Calvino, Exposição de Romanos, (Rm 8.28), p. 294. Vejam-se: Confissão de Westminster, XII.1;  Catecismo Menor, Pergunta 34.

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