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Introdução ao Estudo dos Credos e Confissões (37) (Final) – O uso de Catecismos e Confissões: Valor e importância (2) - Hermisten Maia

Introdução ao Estudo dos Credos e Confissões (37) (Final) – O uso de Catecismos e Confissões: Valor e importância (2)

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Continuando o post anterior, elenco mais alguns elementos que atestam a importância e o valor dos Credos:

 

3) É uma exigência natural da própria unidade da Igreja, que exige um acordo doutrinário[1] (Ef 4.11-14; Fp 1.27; 1Co 1.10; Jd 3/Tt 3.10/Gl 1.8,9; 1Tm 6.3-5).[2]

 

4) Visto que o cristianismo é um modo de vida fundamentado na doutrina, os Credos oferecem uma base sintetizada para o ensino das doutrinas bíblicas, facilitando a sua compreensão, a fim de que todos os crentes sejam habilitados para a obra de Deus.

 

Não deixa de ser curioso o fato de Spener (1635-1705), o “fundador” do “Pietismo” – que supostamente se opunha ao “Escolasticismo Protestante” –, insistir com os pastores que ensinem às crianças e aos adultos, juntamente com as Escrituras, o Catecismo,[3] visto ser este fundamental para a sedimentação da fé.[4]

 

5) Preserva a doutrina bíblica das heresias surgidas no decorrer da história, revelando-se de grande utilidade, especialmente, nas questões controvertidas, dando-nos uma exposição sistemática e norteadora a respeito do assunto.

 

6) No que se refere à compreensão bíblica, permite distinguir as nossas Igrejas das demais.

 

7) Serve como elemento regulador do ensino ministrado na Igreja bem como de seu governo, disciplina e liturgia.

 

James Orr (1844-1913), na sua obra prima O Progresso do Dogma, escrevendo sobre os “Credos da Reforma” disse:

 

A idade da Reforma se destacou por sua produtividade de credos. Faremos bem se não menosprezarmos o ganho que resulta para nós destas criações do espírito do século XVI. Cometeremos grave equívoco se, seguindo uma tendência prevalecente (1897), nos permitirmos crer que são curiosidades arqueológicas. Estes credos não são produtos ressecados como o pó, senão que surgiram de uma fé viva, e encerram verdades que nenhuma Igreja pode abandonar sem certo detrimento de sua própria vida. São produtos clássicos de uma época que se comprazia em formular credos, com o qual quero dizer, uma época que possuía uma fé que é capaz de definir-se de modo inteligente, e pela qual está disposta a sofrer se for necessário – e que, portanto, não pode por menos que expressar-se em formas que não tenham validade permanente –. (…) Estes credos se têm mantido erguidos como testemunhos, inclusive em período de decaimento, às grandes doutrinas sobre as quais foram estabelecidas as Igrejas; têm servido como baluartes contra os assaltos e a desintegração; têm formado um núcleo de reunião e reafirmação em tempos de avivamento; e talvez têm representado sempre com precisão substancial a fé viva da parte espiritual de seus membros….

Os credos da Reforma dão, e isto praticamente pela primeira vez, uma exposição conjunta de todos os grandes artigos da doutrina cristã.[5]

 

8) Quanto a nós hoje, os Credos servem, ou pelo menos deveriam servir,[6] como desafio para que continuemos nossa caminhada na preservação da doutrina e na aplicação das verdades bíblicas aos novos desafios de nossa geração, integrando-nos assim, à nobre sucessão daqueles que amam a Deus e a Sua Palavra e que buscam entendê-la e aplicá-la, em submissão ao Espírito, à vida da Igreja.

 

Uma tradição saudável tem compromisso com o passado na geração do futuro.[7] A declaração teológica terá sempre o compromisso de ser formulada em fidelidade à Palavra atentando para os problemas hodiernos. Esta formulação e proclamação não podem significar o barateamento da Verdade revelada, a insensibilidade para com os conflitos e indagações contemporâneos, nem uma síntese cinzenta de ambas as questões – visto que perderíamos a essência do Evangelho, que é poder de Deus (Rm 1.16) –, antes, consiste na proclamação fiel e autoritativa do Evangelho, sensível – como é o Evangelho em sua própria essência –, às necessidades dos seres humanos que continuam perecendo, em última instância, pelo pecado e a ignorância da graça redentiva de Deus.

 

Só estes fatos deveriam, por si só, nos conduzir a uma atitude mais humilde, como assinala Noll:

 

O estudo da história da igreja deve aumentar a nossa humildade sobre quem somos e aquilo em que cremos. Não há nada que a igreja moderna desfrute que não seja uma dádiva das gerações anteriores do povo de Deus. Na realidade, nós modificamos, adaptamos e ampliamos essas dádivas do passado, mas não as criamos.[8]

 

Portanto, como assinala Packer,

 

O conservadorismo criativo utiliza-se da tradição, não como autoridade final ou absoluta, mas como recurso importante colocado à nossa disposição pela providência de Deus, a fim de nos ajudar a entender o que a Escritura está nos dizendo sobre quem é Deus, quem somos nós, o que é o mundo ao nosso redor, e o que fomos chamados para fazer aqui e agora.[9]

 

Conforme já vimos, o Antigo e o Novo Testamento usaram deste recurso para auxiliar os crentes na sua vida doutrinária e prática cristã, expressando também o que a Igreja cria.

 

Karl Barth (1886-1968) nesse contexto fala de forma pertinente:

 

Reservamos à Bíblia uma estima e um amor que não temos, no mesmo grau, pela tradição, nem mesmo pelos mais valiosos de seus elementos. Nenhuma Confissão de Fé datando da Reforma ou da época atual pode, da mesma maneira que as Escrituras, elevar-se à pretensão de solicitar o respeito da Igreja.

Mas isso não retira nada do fato de que a Igreja escuta e aprecia o testemunho de seus Pais. Então, mesmo que nós não encontremos nele a Palavra de Deus como em Jeremias ou em Paulo, ele tem para nós um significado elevado. Obedecendo ao mandamento ‘honra teu pai e tua mãe’, nós não nos recusaremos a respeitar, seja na pregação, seja na elaboração científica da dogmática, as afirmações de nossos Pais. Diferentemente das Escrituras, as Confissões não têm autoridade que obrigue, mas devemos, todavia, levá-las seriamente em consideração e lhes atribuir uma autoridade relativa.[10]

 

Uma velha tradição pode ser apenas um antigo e consolidado erro. Por isso, toda tradição – já que não escapamos delas -, deve ser avaliada à luz da Escritura. O problema não é a tradição ou, se quiserem, a nossa teologia, mas, se ela é consistentemente bíblica ou não.[11] Somente a Palavra é infalível! Amém.

 

Maringá, 22 de janeiro de 2019.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

 


 

[1] Veja-se: A.A. Hodge, Esboços de Theologia, p. 100; L. Berkhof, Introduccion a la Teologia Sistematica, p. 18.

[2]“E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo, Até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo, para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro” (Ef 4.11-14). “Vivei, acima de tudo, por modo digno do evangelho de Cristo, para que, ou indo ver-vos ou estando ausente, ouça, no tocante a vós outros, que estais firmes em um só espírito, como uma só alma, lutando juntos pela fé evangélica” (Fp 1.27). “Rogo-vos, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que faleis todos a mesma coisa e que não haja entre vós divisões; antes, sejais inteiramente unidos, na mesma disposição mental e no mesmo parecer” (1Co 1.10). “Amados, quando empregava toda a diligência em escrever-vos acerca da nossa comum salvação, foi que me senti obrigado a corresponder-me convosco, exortando-vos a batalhardes, diligentemente, pela fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 3). “Evita o homem faccioso, depois de admoestá-lo primeira e segunda vez” (Tt 3.10). “Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema” (Gl 1.8,9). “Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por questões e contendas de palavras, de que nascem inveja, provocação, difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro” (1Tm 6.3-5).

[3] No caso, o Catecismo Menor de Lutero, 1529. Spener era luterano.

[4]Veja-se: Ph. J. Spener, Mudança para o Futuro: Pia Desideria, Curitiba, PR.; São Bernardo do Campo, SP.: Encontrão Editora; Instituto Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, 1996, p. 32-33; 57-58; 118.

[5]James Orr, El Progreso del Dogma, Barcelona: CLIE., (1988), p. 226-227.

[6]Como já vimos, entre o final dos anos 50 e início dos anos 60, Lloyd-Jones lamenta: “No presente século há marcante aversão por credos, confissões e por definições precisas. O cristianismo tornou-se um vago e indefinido espírito de boa vontade e filantropia” (David M. Lloyd-Jones, A Unidade Cristã, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1994, p. 213).

[7] “A tradição é o sangue da teologia. Separada da tradição a teologia é como uma flor cortada sem suas raízes e sem o solo, logo murcha na mão. Uma sã teologia nunca nasce de novo. Ao honrar a sã tradição, se assegura a continuidade teológica com o passado. Ao mesmo tempo a tradição cria a possibilidade de abrir novas portas para o futuro. Como diz o provérbio: ‘A tradição é o prólogo do futuro.’ Por isso, toda dogmática que se preze como tal, deve definir sua posição em uma ou outra tradição confessional” (Gordon J. Spykman, Teologia Reformacional: Um Nuevo Paradigma para Hacer la Dogmática, Jenison, MI.: The Evangelical Literature League, 1994, p. 5).

[8]Mark A. Noll, Momentos Decisivos na História do Cristianismo, São Paulo: Cultura Cristã, 2000, p. 20.

[9]J.I. Packer, O Conforto do Conservadorismo: In: Michael Horton, ed. Religião de Poder, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1998, p. 241.

[10]Karl Barth, Esboço de uma Dogmática, São Paulo: Fonte Editorial, 2006, p. 13.

[11] Veja-se: R.C. Sproul, Somos todos teólogos: uma introdução à teologia sistemática, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2017, p. 28-30.1

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