Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (54)
5.4. Santificação como processo inacabado (Continuação)
Ao povo da Aliança que se desviara do caminho do Senhor, Este lhe diz: “Aprendei (למד)(lâmad)[1]a fazer o bem” (Is 1.17). A santificação é justamente isto; um santo aprendizado guiado pelo Espírito, tendo como constituição normativa e legislativa do nosso pensar, agir e sentir, a Palavra de Deus. Portanto, a santificação envolve uma nova “alfabetização” espiritual guiada pela Palavra de Deus.
Berkhof (1873-1957) usa uma figura para ilustrar a nossa nova condição:
Uma criança recém-nascida é, salvo exceções, perfeita em suas partes, mas não está no grau de desenvolvimento ao qual foi destinada. Justamente assim, o novo homem é perfeito em suas partes, mas, na presente vida, continua imperfeito no grau de desenvolvimento espiritual.[2]
O crente é chamado a uma caminhada constante. Os cristãos do Novo Testamento eram reconhecidos como aqueles que eram do Caminho. Saulo, antes de convertido, pediu cartas ao sumo sacerdote “a fim de que, caso achasse alguns que eram do Caminho, assim homens como mulheres, os levasse presos para Jerusalém” (At 9.2). Lucas relata que Priscila e Áquila, após ouvirem uma pregação de Apolo, o chamaram e, “com mais exatidão, lhe expuseram o caminho de Deus” (At 18.26).
O cristianismo é essencialmente um caminho de vida, fundamentado na prática do Evangelho, conforme ensinado por Jesus Cristo. As Escrituras nunca nos apresentam atalhos circunstanciais, obscuros com pavimentação incerta.
Na realidade, o nosso mundo pode apresentar um cenário de sombras e desolação, no entanto, Jesus Cristo, o nosso único caminho, ilumina a nossa trilha de peregrinação à caminho de nossa morada eterna.
A santificação é, portanto, um desafio a perseguirmos este caminho, nos empenhando por fazer a vontade de Deus. Por isso, a santificação nos fala de caminharmos sempre em direção ao alvo proposto por Deus, com os nossos corações humildes, desejoso de agradar a Deus, de fazer a Sua vontade com o sentimento adequado.
A vida cristã não é a de um transeunte em férias, sem compromissos, sem agenda definida. A vida cristã se compatibiliza melhor à figura do peregrino, sempre buscando o melhor caminho para chegar ao seu destino. O cristão está comprometido com o propósito de seu Senhor (Ef 1.4).
O antigo professor de Princeton, Patton (1843-1932), ressalta que,
A santificação é uma mudança gradual de caráter; é um despojo do homem velho, “que se corrompe pelas concupiscências do engano”, e um revestimento do “novo homem que, segundo Deus, é criado em verdadeira justiça e santidade”. Na regeneração, o filho de Deus torna-se “uma nova criatura”, e isto se manifesta mais e mais, à proporção que a santificação vai progredindo. O filho de Deus é objeto de novos sentimentos, novos prazeres, novos motivos e novas aspirações. “As coisas velhas são passadas”.[3]
Maringá, 25 de maio de 2020.
Rev. Hermisten
Maia Pereira da Costa
[1]A ideia básica da palavra é a de aprender, ensinar, treinar, educar, acostumar-se a; familiarizar-se com. Deus nos ensina para que cumpramos a sua Palavra: “Agora, pois, ó Israel, ouve os estatutos e os juízos que eu vos ensino (למד)(lâmad), para os cumprirdes, para que vivais, e entreis, e possuais a terra que o SENHOR, Deus de vossos pais, vos dá” (Dt 4.1). (Do mesmo modo: Dt 4.5,14; 5.1,31; 6.1).
Como mestre perfeito, Deus usava inclusive do recurso musical para ensinar a Lei ao povo: “Escrevei para vós outros este cântico e ensinai-o (למד)(lâmad) aos filhos de Israel; ponde-o na sua boca, para que este cântico me seja por testemunha contra os filhos de Israel. (…) Assim, Moisés, naquele mesmo dia, escreveu este cântico e o ensinou (למד)(lâmad)aos filhos de Israel” (Dt 31.19,22/Dt 32.1-47). (Cf. Walter C. Kaiser, Lâmad: In: R. Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, p. 791; D. Muller, Discípulo: In: Colin Brown, ed. ger. Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 1, p. 662; A.W. Morton, Educação nos Tempos Bíblicos: In: Merrill C. Tenney, org. ger., Enciclopédia da Bíblia, São Paulo: Cultura Cristã, 2008, v. 2, p. 261; E.H. Merrill, dml: In: Willem A. VanGemeren, org., Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 2, p. 800-802; Hermisten M.P. Costa, Introdução à Educação Cristã, Brasília, DF.: Monergismo, 2012).
[2]Louis Berkhof, Teologia Sistemática, Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 541.
[3] Francisco L. Patton, Compendio de Doutrina e a Egreja, Lisboa: Typ. A Vapor de Eduardo Rosa, 1909, p. 97.