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“Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (128) - Hermisten Maia

“Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (128)

7.5.2.4. É uma unidade de propósito (Continuação)

Os salmistas cantam de forma exultante a glória de Deus:

7Levantai, ó portas, as vossas cabeças; levantai-vos, ó portais eternos, para que entre o Rei da Glória. 8Quem é o Rei da Glória (dAbK’) (kabod)? O SENHOR, forte e poderoso, o SENHOR, poderoso nas batalhas. 9Levantai, ó portas, as vossas cabeças; levantai-vos, ó portais eternos, para que entre o Rei da Glória (dAbK’) (kabod). 10Quem não se deve subtrair de sua glória nem sequer uma partícula, senão que deve conservar para ele o que é seu por direito é esse Rei da Glória (dAbK’) (kabod)? O SENHOR dos Exércitos, ele é o Rei da Glória (dAbK’) (kabod). (Sl 24.7-10).

          Não a nós, SENHOR, não a nós, mas ao teu nome dá glória (dAbK’) (kabod), por amor da tua misericórdia e da tua fidelidade. (Sl 115.1).

            A glória pertence a Deus e, por extensão ao seu reino visto que Ele mesmo não é glorioso pelo seu reino, mas, o seu reino e reinado são grandiosos porque Deus é o Rei da glória. A glória não está originariamente no que Deus realiza, mas, no fato de Deus ser autoglorioso e, por isso mesmo, realizar obras gloriosas.

            Bavinck comenta:

Para essa glorificação de si mesmo Deus não precisa do mundo, pois não é a criatura que independente e suficientemente exalta a honra de Deus; pelo contrário, é Ele que, por meio de suas criaturas ou sem elas, glorifica Seu próprio nome e revela-se a si mesmo. Deus, portanto, nunca procura a criatura para encontrar algo de que esteja precisando.[1]

            Escreve o salmista: Excelso (~Wr) (rum) (= exaltado) é o SENHOR, acima de todas as nações, e a sua glória (dAbK’) (kabod), acima dos céus” (Sl 113.4/Sl 138.5-6).

A natureza, ainda que relativamente de forma diminuta, expresse aspectos da glória do Rei eterno evidenciando o seu glorioso poder entre todas as nações: “Os céus anunciam a sua justiça, e todos os povos veem a sua glória (dAbK’) (kabod) (Sl 97.6).

Em toda a terra a glória de Deus é manifesta: “Sê exaltado, ó Deus, acima dos céus; e em toda a terra esplenda a tua glória (dAbK’) (kabod) (Sl 108.5).

             Por mais gloriosa que seja a criação de Deus, expressando aspectos do seu Criador, tais como: beleza, grandeza, soberania, sabedoria, harmonia e bondade, ela não se compara ao Criador que é extremamente mais glorioso do que toda a criação. A beleza pura, plena e consumada só temos absolutamente em Deus.

Por isso, a obra de Deus não é um ato isolado de sua glória ou um ato de “superação” – como a de um artista que se supera na criação de sua “obra-prima” –, antes é a expressão compreensível a nós de sua transcendente glória que ultrapassa totalmente a nossa capacidade de compreensão (Rm 11.33-36/Jó 36.22,26; 37.5,16).

            A glória de Deus está expressa em tudo o que realiza. A natureza de Deus se evidencia em todas as suas realizações. Porém, como acentua Allen: 

Essas relações conosco não conseguem revelar e não revelam a essência divina para nós; pois a criação é um efeito de Deus. A encarnação e nossa recepção da nova vida vêm dela também são resultados da ação de Deus. Todos estes efeitos de Deus não esgotam a magnitude de sua fonte. Um efeito, mesmo grande, não pode revelar a plena extensão ou natureza de sua fonte inexaurível. Assim, até mesmo nos atos de criação e redenção, a natureza essencial de Deus, ou Seu ser não é conhecível. Embora essa natureza essencial esteja presente, e presente de maneira inédita na encarnação, nós não podemos compreendê-la plenamente. As ações de Deus nunca exaurem a natureza divina, e nós conhecemos a Deus somente quando Ele age ou se relaciona conosco.[2]

            A glória de Deus por pertencer essencialmente a Ele, de nada carece: permanece inalterada em tudo que criou e preserva.[3] Deus criou todas as coisas, inclusive a Igreja, para a sua Glória. “Glória é excelência manifestada. A excelência dos atributos de Deus é manifestada por sua operação”.[4] A glória de Deus por ser-lhe inerente, não lhe é atribuída, acrescentada, diminuída ou mesmo esgotada em sua complexidade;[5] é-Lhe totalmente intrínseca.

            Ele é o Rei, o Senhor e Pai da Glória (Sl 24.7-10; At 7.2; Ef 1.17)[6] que, por meio de seu Filho “vestido de nossa carne, se revelou agora para ser o Rei da glória e Senhor dos Exércitos”, comenta Calvino.[7] (1Co 2.8; Tg 2.1/Jo 1.14).[8] A criação exibe aspectos da glória divina, porém, a Igreja é uma expressão especial, como comenta Calvino: “Ainda que Deus seja suficiente a si mesmo e se satisfaça exclusivamente consigo mesmo, não obstante quer que sua glória se manifeste na Igreja”.[9]

 A realidade, os fenômenos gloriosos da criação envolvendo os homens e os animais, revelam a glória de Deus.

            O alvo final de todas as coisas é a glória Deus. Nada é mais elevado ou importante do que o próprio Deus. Há aqui um desafio extremamente difícil para todos nós individualmente e para a Igreja como um todo: abrir mão de nossos interesses aparentemente mais relevantes (aliás, em nossa ótica, o que há de mais importante do que os nossos interesses?) pelo que, de fato, é urgentemente relevante em sua própria essência: Reconhecer a glória de Deus manifestada em sua criação, Palavra e atos na história.

Maringá, 20 de agosto de 2020.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Herman Bavinck, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 183.

Diógenes Allen; Eric Springsted, Filosofia para entender Teologia,  3. ed., Santo André, SP.; São Paulo: Academia Cristã; Paulus, 2010, p. 25-26. Calvino, escrevera: “Ora, visto que a majestade de Deus, em si mesma, vai além da capacidade humana de entendimento e não pode ser compreendida por ela, devemos adorar sua grandiosidade em vez de investigá-la, a fim de não permanecermos extasiados por tão grande esplendor. Assim, devemos buscar e considerar Deus em suas obras, que as Escrituras chamam de representações das coisas invisíveis (Rm 1.20; Hb 11.1), visto que estas obras representam, para nós, aquilo do Senhor que de outra forma não podemos ver. Ora, isso não mantém nosso espírito suspenso no ar através de especulações frívolas e vãs, mas é algo que devemos conhecer e que gera, nutre e confirma em nós uma piedade verdadeira e sólida, ou seja, uma fé unida ao temor reverente” (João Calvino,  Instrução na Fé, Goiânia, GO: Logos Editora, 2003,Cap. 3, p. 13).

[3]Veja-se: João Calvino, Romanos,2. ed. São Paulo: Parakletos, 2001, (Rm 11.36), p. 430.

[4]A.A. Hodge, Esboços de Theologia, Lisboa: Barata & Sanches, 1895, p. 223.

[5]“Pois se homens e anjos juntassem sua eloquência em função deste tema, ainda assim tocariam mui diminutamente em sua imensurabilidade” (João Calvino, Efésios,São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 1.14), p. 39).

[6]“Levantai, ó portas, as vossas cabeças; levantai-vos, ó portais eternos, para que entre o Rei da Glória. Quem é o Rei da Glória? O SENHOR, forte e poderoso, o SENHOR, poderoso nas batalhas. Levantai, ó portas, as vossas cabeças; levantai-vos, ó portais eternos, para que entre o Rei da Glória. Quem é esse Rei da Glória? O SENHOR dos Exércitos, ele é o Rei da Glória(Sl 24.7-10). “Estêvão respondeu: Varões irmãos e pais, ouvi. O Deus da glória apareceu a Abraão, nosso pai, quando estava na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã” (At 7.2). “Para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dele” (Ef 1.17). (Destaques meus).

[7] João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 1, (Sl 24.8), p. 536.

[8] “Sabedoria essa que nenhum dos poderosos deste século conheceu; porque, se a tivessem conhecido, jamais teriam crucificado o Senhor da glória (do/ca)(1Co 2.8). “Meus irmãos, não tenhais a fé em nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória (do/ca), em acepção de pessoas” (Tg 2.1). “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória (do/ca), glória (do/ca) como do unigênito do Pai” (Jo 1.14).

[9]João Calvino, O Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 2.17), p. 100.

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