A Pessoa e Obra do Espírito Santo (479)
3.3. Gratidão a Deus (Continuação)
Aflição e gratidão
Parece-nos que é neste sentido que o salmista testemunha: “Foi-me bom ter eu passado pela aflição, para que aprendesse os teus decretos”(Sl 119.71).
A pedagogia de Deus, por meio dos eventos, ultrapassa em muito a nossa capacidade imediata de percepção. Todavia, Deus é o Senhor e Ele nos ensina por meio da sua Palavra vivenciada na história.
Daniel quando soube que, por decreto do rei Dario, nenhum homem poderia invocar a Deus durante o prazo de trinta dias, entrou no seu quarto e deu graças a Deus conforme seu reverente costume:[1] “Daniel, pois, quando soube que a escritura estava assinada, entrou em sua casa, e, em cima, no seu quarto, onde havia janelas abertas da banda de Jerusalém, três vezes no dia se punha de joelhos, e orava, e dava graças, diante do seu Deus, como costumava fazer” (Dn 6.10).
Calvino, comentando a respeito da pedagogia das aflições, exorta:
Os homens são incapazes de sentir seus pecados a menos que sejam levados pela força a conhecer-se por si mesmos. Por isso, vendo que a prosperidade nos embriaga de tal maneira, e que quando estamos em paz cada um se adula em seus pecados; temos que sofrer pacientemente as aflições de Deus. Porque a aflição é a autêntica mestra que leva os homens ao arrependimento para que se condenem eles mesmos diante de Deus e, sendo condenados, aprendam a odiar aqueles pecados nos quais anteriormente se banhavam”.[2]
Em outro lugar: “Esta é a vantagem primordial das aflições, ou seja, enquanto nos tornam conscientes de nossa miséria, nos estimulam novamente para suplicarmos o favor divino.[3]
Retornando ao texto de 1Ts 5.18, constatamos que Paulo fala a uma jovem igreja perseguida, pressionada em sua incipiente fé em busca de uma fé operante. Todavia, ele sabia que a nossa fé amadurece à medida que conseguimos, pela graça, superar as adversidades dos fatos, reconhecendo a direção bondosa de Deus. Ele mesmo já tivera esta experiência, juntamente com Silas, em Filipos, antes de levar o Evangelho a Tessalônica.
Lucas, que testemunhou a prisão de Paulo em Filipos, nos conta: “Por volta da meia-noite, Paulo e Silas oravam e cantavam louvores a Deus, e os demais companheiros de prisão escutavam”(At 16.25). Esta atitude – que o texto indica que se repetiu por algum tempo – era inusitada e, ao que parece, tão surpreendente aos outros prisioneiros que, conforme registra Lucas, os companheiros de cela se detiveram para ouvir os seus louvores (At 16.25).
Mais tarde, Pedro escreve aos crentes da Dispersão, que sofriam atroz perseguição:
Amados, não estranheis o fogo ardente que surge no meio de vós, destinado a provar-vos, como se alguma cousa extraordinária vos estivesse acontecendo; pelo contrário, alegrai-vos na medida em que sois coparticipantes dos sofrimentos de Cristo, para que também na revelação da sua glória vos alegreis exultando. (1Pe 4.12-13).
O fato é que Deus, mesmo objetivando – como sempre o faz – o melhor para nós, não exclui necessariamente as adversidades, as circunstâncias difíceis e sérias provações.
Assim, meus irmãos, a nossa atitude de ação de graças revela a nossa confiança em Deus, no seu paternal cuidado. Por isso, mesmo sem entendermos o alcance dos fatos, devemos, pela fé, agradecer a Deus: “Dando sempre graças (Eu)xariste/w) por tudo a nosso Deus e Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo” (Ef 5.20).
Maringá, 16 de maio de 2022.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] “Não que ajoelhar-se seja em si mesmo necessário quando oramos, mas, porque necessitamos de estímulos, como dissemos, dobrar os joelhos é uma atitude muito importante. Em primeiro lugar, porque somos advertidos de que só podemos apresentar-nos diante de Deus de maneira humilde e reverente. E, em segundo lugar, para que nossas mentes estejam melhor preparadas para a oração sincera. E este símbolo de adoração é aceitável aos olhos do Senhor” (João Calvino, O Profeta Daniel: 1-6,São Paulo: Parakletos, 2000, v. 1, (Dn 6.10), p. 375).
[2] Juan Calvino, El Uso Adecuado de la Afliccion: In: Sermones Sobre Job, Jenison, Michigan: T.E.L.L., 1988, (Sermon nº 19), p. 226.
[3]João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 1, (Sl 30.8), p. 635.