A Pessoa e Obra do Espírito Santo (423)
2) Perseverança
“E, quando se encontraram com ele, disse-lhes: Vós bem sabeis como foi que me conduzi entre vós em todo o tempo, desde o primeiro dia em que entrei na Ásia” (At 20.18).
O apóstolo acompanhou aqueles irmãos de perto. Conheceu as entranhas de muitos de seus problemas. Chorou e se alegrou com muitos irmãos. Isto ele o fez sistematicamente: “noite e dia”. Perseverantemente: “por três anos”. Por vezes, com grande sensibilidade: “com lágrimas”. Os instruiu, repreendeu, corrigiu e consolou. Em tudo, porém, manteve a Palavra como norma de seu ensino e procedimento. Agora, relembra e os orienta: “Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um” (At 20.31).
Paulo relembra aos presbíteros que o seu trabalho entre eles não foi movido por entusiasmos episódicos e circunstâncias aprazíveis, antes, foi “desde o primeiro dia”. Certamente, é fácil deduzir que o apóstolo não esteve bem todos os dias nesses três anos em que conviveu com eles. Provavelmente nem todos os dias acordou com a mesma disposição. Contudo, ele trabalhou intensamente desde o primeiro dia em que entrou na Ásia. É preciso que não percamos essa dimensão, senão desanimaremos rapidamente. Nem sempre vemos o fruto de nosso trabalho. Os frutos que esperávamos, até de forma justa, não são sempre tangíveis aos nossos olhos. Mas, precisamos continuar firmes na obra de Deus. No Senhor o nosso trabalho nunca será em vão (1Co 1.58).
Os crentes de Filipos são um bom exemplo de um trabalho, de uma união fraterna cooperante que se manifestava também de forma perseverante. O apóstolo observando isso dava constantemente graças a Deus por aqueles irmãos (Fp 1.3-5).
3) Senso de oportunidade
“Jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa” (At 20.20).
Paulo tinha um senso pastoral apurado. Ele não perdia oportunidade de ensinar à igreja. Sabia que tinha coisas proveitosas a dizer. Cristo era o conteúdo de sua mensagem. O seu ensino é urgente. O tempo era pequeno. Assim, se valia de todas as ocasiões, ensinando publicamente e, também, nas casas, tendo, por vezes, oportunidade de falar mais proximamente a irmãos que tinham dúvidas, reforçar ensinamentos ministrados publicamente e, também, evangelizar a outros.
4) Sensibilidade obediente
“22 E, agora, constrangido em meu espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá, 23senão que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e tribulações. 24 Porém em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus” (At 20.22-24).
Havia muito o que fazer em Éfeso, mas, sabia que Deus tinha outros planos para ele. Havia muitas outras cidades que também precisavam ouvir o Evangelho. Por isso mesmo ele trabalhou intensamente, aproveitou as oportunidades e preparou uma liderança para continuar pastoreando a igreja. Quando ficamos simplesmente reclamando da “falta de tempo” ou de muitas tarefas, perdemos parte do pouco que temos para realizar o que Deus nos confiou. Temos que levar adiante a nossa vocação cumprindo o que Deus colocou em nossas mãos, quer na preparação para o nosso ofício, quer no exercício de nosso chamado. Paulo agia com senso de urgência, competência e submissão.
Pessoalmente acho muito difícil despedidas. Ter a compreensão correta da hora de partir, especialmente quando as coisas estão indo bem exige um discernimento que em geral não temos. Da mesma forma, permanecer firmes quando parece que há oposição, as coisas não caminham bem e nos sentimos desgastados, não é simples. Essas são questões recorrentes no ministério. Como interpretar os sinais? A nossa permanência é perseverança ou teimosia? Partir é obediência corajosa ao chamado de Deus ou covardia e interesses menos nobres simplesmente de crescer em nossa carreira? Paulo constrangido pelo Senhor a quem servia, tinha um ministério a cumprir. Ele sabia que isso se estendia para além de Éfeso. Atendeu obedientemente ao seu chamado.
5) Não onerar desnecessariamente a igreja: trabalho e modéstia
“33De ninguém cobicei prata, nem ouro, nem vestes; 34 vós mesmos sabeis que estas mãos serviram para o que me era necessário a mim e aos que estavam comigo” (At 20.33-34).
O trabalhador é digno de seu salário. A igreja deve manter seu pastor condignamente, sem constrangê-lo. Paulo sabia e ensinava isso.
Por sua vez, o pastor deve evitar ser pesado à igreja devido aos seus gastos desnecessários, muitas vezes porque deseja ostentar um padrão superior ou seguir o padrão de determinados irmãos que tem uma situação econômica mais elevada.
O princípio da modéstia e da moderação deve reger a vida do pastor. A igreja por sua vez, tendo condições, deve suprir de forma satisfatória as necessidades de seu pastor.
Comentando Fp 2.21, escreve:
Pode estar em seu poder viver em outro lugar com maior opulência; Deus, porém, o ligou à Igreja, a qual lhe propicia apenas um bem moderado sustento; é possível que em outro lugar você tenha mais honra; Deus, porém, lhe destinou uma situação na qual você viverá num estilo humilde; talvez em outro lugar você desfrute de um céu azul, ou de uma região mais agradável; mas é aqui seu lugar designado. É possível que você desejasse conviver com pessoas mais humanas; é possível que se sinta ofendido com sua ingratidão, ou com seu barbarismo, ou orgulho; em suma, pode ser que não simpatize com a disposição ou as maneiras da nação onde se encontra, porém deve relutar consigo mesmo e de certa maneira reprimir as inclinações opostas, para que você mantenha a tarefa que recebeu; porquanto você não é livre, nem se acha à sua própria disposição. Enfim, esqueça a si próprio, caso queira servir a Deus.[1]
Aos pastores e aos crentes em geral, Calvino apresenta uma recomendação:
Os ministros devem viver contentes com uma mesa frugal, e devem evitar o perigo do regalo e do fausto.[2] Portanto, até onde suas necessidades o requeiram, que os crentes considerem toda a sua propriedade como à disposição dos piedosos e santos mestres.[3]
Maringá, 26 de fevereiro de 2022.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] João Calvino, Gálatas-Efésios-Filipenses-Colossenses, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2010, (Fp 2.21), p. 430-431.
[2] No entanto, Calvino não era indiferente à necessidade dos ministros serem mantidos condignamente (Veja-se: João Calvino, Cartas de João Calvino, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 91-92; 156).
[3] João Calvino, Gálatas, São Paulo: Paracletos, 1998, (Gl 6.6), p. 181.