A Pessoa e Obra do Espírito Santo (395)
4) A Santidade como meta
“Em que sentido chamais santa à Igreja?”
Porque a todos os que Deus elegeu, os faz justos e os reforma para santidade e inocência de vida, para que neles resplandeça sua glória (Rm 8.30). E assim, havendo Jesus Cristo resgatado sua Igreja, a santificou, para que fosse gloriosa e limpa de toda mancha (Ef 5.25-27).[1]
“E esta santidade que atribuis à Igreja, é já perfeita?”
Não, entretanto ela mantém guerra neste mundo. Porque sempre têm imperfeições, e nunca será totalmente purgada dos vestígios dos pecados, até que seja completamente juntada com Cristo sua Cabeça, pelo qual ela é santificada.[2]
A Igreja é santa em santificação. A santidade é um ato realizado em e por Cristo; a santificação é decorrente deste ato, se concretizando num processo contínuo operado pelo Espírito.
A Igreja é descrita no “Credo Apostólico”, como a “Comunhão dos Santos”. E de fato ela o é, porque congrega os pecadores santificados em Cristo e, que estão, como evidência da tensão do seu pecado e, também da sua natureza santa, em processo de santificação, de crescimento espiritual, pelo Espírito que é Santo.
A Igreja Santa vive na realização do ideal de santidade (Vejam-se: Ex 19.6; Lv 20.26; Dt 7.6; 26.19; 28.9; Is 62.12; 1Pe 2.9). Deste modo, ela cumpre a meta proposta por Deus no ato eterno da nossa eleição (Ef 1.4; 2Ts 2.13/1Ts 4.3).
Por isso, quando nos referimos à Santidade da Igreja, estamos falando de nossa responsabilidade: ser santo é estar em santificação. Não podemos nos acomodar com a graça da santidade; devemos progredir na graça em santificação. “A igreja alheia à santidade é alheia a Cristo”, resume Milne.[3]
Deus chama pecadores, todavia, não deseja que eles continuem assim, antes, infunde neles a justiça de Cristo, dando-lhes um novo coração, mudando as inclinações de sua alma, habilitando-os à toda boa obra (Ef 2.8-10). A nossa justificação em Cristo envolve também, por graça, a santificação.[4]
A justificação nos livra da condenação do pecado e a santificação nos livra da sua contaminação.[5] “Na justificação, Deus imputa a justiça de Cristo; e na santificação, o Seu Espírito infunde a graça e dá forças para ser praticada. Na justificação, o pecado é perdoado; na santificação, ele é subjugado”.[6] (destaque meu) (Rm 3.24,25; 6.6,14).
Os crentes em Cristo são chamados à santidade do Deus Triúno (Jo 6.69; 1Pe 1.15; Ap 15.4). Esta realidade deve nos conduzir ao sentimento de adoração, gratidão, humildade e obediência
A Santa Igreja não é uma comunidade perfeita. Ao contrário, é a comunidade que confia no milagre do perdão, cresce no conhecimento de que ela é justificada e aceita a obra da santificação que é feita nela. Isso é o resultado do sentimento de sua própria indignidade, do morrer e do reviver para uma nova vida. Santidade denota a eficácia da obra de Deus, que se faz mais e mais real na medida em que a Igreja se dispõe a ela.[7]
No seu viver cotidiano, a Igreja deve revelar a essência da sua natureza divina (Mt 5.14-16; Fp 2.14-15).
Calvino resume:
O Senhor trabalha dia após dia para eliminar as rugas e as manchas da igreja. Segue-se que a sua santidade ainda não é perfeita. Portanto, a igreja é santa no sentido de que diariamente cresce e se fortalece em santidade, mas ainda não é perfeita; diariamente progride, mas ainda não chegou à meta da santidade.[8]
A vida cristã não se caracteriza simplesmente por sustentar ideias corretas e ter uma visão mais ampla da realidade; mas, também, em proceder corretamente de acordo com a amplitude da realidade revelada.
A ação cristã deve ser acompanhada de motivação e espírito cristãos. “Não é suficiente fazer. A pessoa precisa fazer todas as coisas com espírito certo. Há sempre o perigo de o homem zeloso se tornar um zelote, ou de aquele que luta pela verdade e o direito se tornar um polemista”, exorta-nos Stagg (1911-2001).[9]
Escrevendo aos filipenses (Fp 2.12-18), Paulo fala da salvação efetuada por Deus, na qual, nós devemos participar em seu desenvolvimento, usado dos meios que o próprio Deus coloca à nossa disposição para o nosso crescimento espiritual. “Deus nos tem munido com mais de uma espécie de auxílio, desde que não sejamos indolentes em fazer uso do que nos é oferecido”.[10] (2Pe 1.3).
Pedro, do mesmo modo, por considerar este ponto de extrema relevância, insiste em nossa responsabilidade de assim proceder, agindo com diligência: “Por isso, irmãos, procurai, com diligência (Spouda/zw = “ser zeloso”, “fazer todo o esforço possível”)[11] cada vez maior, confirmar a vossa vocação e eleição; porquanto, procedendo assim, não tropeçareis em tempo algum” (2Pe 1.10).
Portanto, podemos perceber que o segredo da vida cristã, a sua segurança não está na inatividade, mas, sim – amparados na graça de Deus –, em vivermos em constante trabalho de desenvolvimento de nossa fé, sabendo que desta maneira jamais tropeçaremos de modo definitivo: Deus não permitirá!
Maringá, 30 de janeiro de 2022.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] João Calvino, Catecismo de Genebra, Pergunta, 96.
[2] João Calvino, Catecismo de Genebra, Pergunta, 99.
[3] Bruce Milne, Conheça a Verdade, São Paulo: ABU., 1987, p. 224.
[4] Veja-se: João Calvino, As Institutas, III.16.1.
[5] Veja-se: A. Booth, Somente pela Graça, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1986, p. 45.
[6]Catecismo Maior de Westminster,Pergunta, 77.
[7] Jacques de Senarclens, Herdeiros da Reforma,São Paulo: ASTE, 1970, p. 344.
[8]João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 2 (II.4), p. 92.
[9]Frank Stagg,Filipenses: In: Clifton J. Allen, ed. ger. Comentário Bíblico Broadman,Rio de Janeiro: JUERP., 1985, v. 11, p. 242.
[10]João Calvino, Efésios,São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 6.11), p. 188.
[11] Spouda/zw ocorre nos seguintes textos do NT: * Gl 2.10; Ef 4.3; 1Ts 2.17; 2Tm 2.15; 4.9,21; Tt 3.12; Hb 4.11; 2Pe 1.10,15; 3.14.