A Pessoa e Obra do Espírito Santo (233)
8. A Santidade de Deus: reverência, confiança e santificação (Continuação).
Santidade essencial e em tudo que realiza
Deus é intrinsecamente santo, do mesmo modo que é justo, bondoso e poderoso. A sua santidade é necessária e absoluta. A santidade, por sua vez, permeia com beleza de forma indissolúvel e essencial todos os atributos de Deus. A santidade não é mais um atributo, mas, aquilo que qualifica todo o ser de Deus.
Não há expressão em Deus que não seja santa. Ele é Santo. O seu amor é santo. A sua justiça é santa. A sua misericórdia é santa. Do mesmo modo, a sua ira é santa.
Assim, em todos os seus atributos vemos vislumbres da beleza de sua santidade. “A santidade é o padrão de todas as suas ações”, resume Pink (1886-1952).[1]
A santidade de Deus consiste na harmonia perfeita e bela entre o ser de Deus e os seus atos. Deus sempre age em santidade.
Não há em Deus a perda de qualidade entre a sua natureza e seus atos. Deus age conforme Ele é; sempre em completa perfeição com a sua natureza santa.
Os homens são indesculpáveis
Evidências de sua gloriosa majestade estão espalhadas na Criação. Esses rastros fazem parte do testemunho voluntário de Deus a fim que o ser humano o conheça e o adore. Por isso os homens em sua rejeição contumaz, são indesculpáveis.
Preferem forjar seus deuses à sua imagem:
19Porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. 20Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; 21porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato. 22 Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos 23e mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis. (Rm 1.19-23).[2]
Os homens em rebelião contra Deus, preferem negá-lo. Como é impossível fazê-lo sem fé – visto que, se crer em Deus envolve fé, o não crer também –, criam seus deuses conforme os seus desejos, um simulacro, uma caricatura do Senhor. Essas criações refletem os sonhos e desejos humanos. Nesses casos, a teologia termina por seu uma descrição antropológica, psicológica e social de seus criadores.
Sproul comenta sobre a idolatria:
Essa é a essência da idolatria: substituir a realidade por uma imitação. Distorcemos a verdade do Senhor e reconfiguramos nosso entendimento acerca dele de acordo com nossas próprias preferências, ficando com um Deus que é tudo, exceto santo.[3]
A santidade de Deus é perfeitamente bela em sua expressão. A Escritura nos mostra que Deus como autor de toda beleza, aprecia o belo. A beleza não tem existência própria e autônoma. Ela provém de Deus, portanto, o perigo de fazermos a separação entre beleza e Deus, correndo o risco de adorar a criação em lugar do Criador (Rm 1.25),[4] perdendo a dimensão que por trás da criação há o Criador, para onde toda a criação deveria apontar. O Deus quem nos criou à sua imagem é o Artista original. O nosso senso estético procede também de Deus, como por uma imagem.[5]
Nós, como imagem, tentamos imitá-lo de forma subjetiva – dentro dos contornos próprios de valores e percepções da história e de nosso história[6] –, visto que somente Deus possui de forma absoluta a objetividade do Belo em suas perfeições.[7]
O salmista convoca o povo à adoração considerando a beleza e esplendor da santidade de Deus: “Tributai ao SENHOR a glória devida ao seu nome, adorai o SENHOR na beleza (hr’d’h]) (hadarah) (= esplendor)[8] da santidade (vd,qo) (qodesh)” (Sl 29.2). Outra vez: “Adorai o SENHOR na beleza (hr’d’h]) (hadarah) (= esplendor) da sua santidade (vd,qo) (qodesh); tremei diante dele, todas as terras” (Sl 96.9).
O poder de Deus é santo (não é tirânico). A justiça de Deus é perfeita (Não é crueldade) a sua Misericórdia fundamenta-se em sua justiça (não é mero sentimento circunstancial).[9]
Maringá, 10 de julho de 2021.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1]A.W. Pink, Os atributos de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1985, p. 42.
[2] Sproul comentando aspectos de parte dessa passagem, diz: “Deus não plantou indicativos esotéricos ao redor do mundo para que o homem precise de um guru para explicar que Deus existe; em vez disso, a revelação que Deus nos dá a respeito de si mesmo é manifestum – é clara. (…) Vemos claramente, mas não diretamente. (…) O caráter invisível de Deus é revelado por meio das coisas que podem ser vistas. (…) A Bíblia é clara em dizer que a revelação que Deus faz de si mesmo na natureza nos proporciona um verdadeiro conhecimento de seu caráter” (R.C. Sproul, Somos todos teólogos: uma introdução à Teologia Sistemática, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2017, p. 36-37) (Veja-se também: R.C. Sproul, Estudos bíblicos expositivos em Romanos, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 36-40).
[3]R.C. Sproul, A Santidade de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 1997, p. 205. Em outro lugar: “A idolatria representa o insulto máximo a Deus. Reduzir Deus ao nível da criatura é despojá-lo de Sua divindade. Isto Lhe é particularmente odioso em face do fato de todos os homens terem recebido suficiente revelação sobre Ele para saber que não é uma criatura” (R.C. Sproul, Razão para crer, São Paulo: Mundo Cristão, 1986, p. 39).
[4]Veja-se: Henry R. Van Til, O Conceito Calvinista de Cultura, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 127-129.
[5]Veja-se: Abraham Kuyper, Sabedoria e prodígios: graça comum na ciência e na arte, Brasília, DF.: Monergismo, 2018, p. 139.
[6] “A beleza nunca foi algo de absoluto e imutável, mas assumiu rostos diversos segundo o período histórico e o país: e isso não somente no que diz respeito à beleza física (do homem, da mulher, da paisagem), mas também à beleza de Deus, ou dos santos, ou das Ideias” (Umberto Eco, Nos ombros dos gigantes: escritos para La Milanesiana, 2001-2015, Rio de Janeiro: Record, 2018, p. 38).
[7]“…. A beleza não é produto de nossa própria fantasia, nem de nossa percepção subjetiva, mas tem uma existência objetiva, sendo ela mesma a expressão de uma perfeição Divina” (Abraham Kuyper, Calvinismo, São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 164). Vejam também: A. Kuyper, Sabedoria e prodígios: graça comum na ciência e na arte, Brasília, DF.: Monergismo, 2018, p. 121ss.; 137ss.; Gene Veith, Jr., State of the arts: From Bezalel to Mapplethorpe, Wheaton, Illinois: Crossway Books, 1991, p. 145-161. É sugestivo o tratamento dado à questão da imitação em Aristóteles, conforme pontua Gilson (E. Gilson, Introdução às artes do Belo – O que é filosofar sobre a arte? São Paulo: É Realizações, 2010, p. 85ss.).
[8] Vejam-se as discussões quanto à origem e melhor tradução da palavra em: C. John Collins, hdr: In: Willem A. VanGemeren, org., Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 1, p. 987-990; Victor P. Hamilton, hadar: In: Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 340-342; Derek Kidner, Salmos 1-72: introdução e comentário, São Paulo: Vida Nova; Mundo Cristão, 1980, (Sl 29.2), p. 145.
[9] Veja-se: Joel R. Beeke; Mark Jones, Teologia Puritana: Doutrina para a vida, São Paulo: Vida Nova, 2016, p. 125. “A santidade é, sem dúvida, o mais importante de todos os atributos de Deus” (John MacArthur, Deus: Face a face com sua majestade, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2013, p. 47).