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A Pessoa e Obra do Espírito Santo (178) - Hermisten Maia

A Pessoa e Obra do Espírito Santo (178)

 6.3.5. Arrependimento para a vida (Continuação)

A essencialidade do arrependimento

          O arrependimento é fundamental à nossa salvação. Todos precisamos de nos arrepender. Ele é parte essencial da mensagem do Evangelho (Mt 3.2; 4.17; Mc 1.14-15; Lc 24.46-47; At 20.21; 26.18-20; Ap 3.19).[1] Todos são notificados desta necessidade (At 17.30).[2] O pregador do Evangelho tem a responsabilidade de conclamar seus ouvintes ao arrependimento (2Co 5.20)[3].[4]

No entanto, isto não é suficiente. O arrependimento só é possível por Deus. É uma dádiva de Deus concedida a judeus e gentios (At 5.31;11.18).[5] Ele envolve o nosso coração, mente, e vontade.[6] A raiz do “arrependimento evangélico”[7] está no coração, o centro vital do ser humano.[8]

O arrependimento, insisto, não é apenas uma questão intelectual, antes envolve uma revisão, reorganização e redirecionamento de nossa vida a partir de nosso novo nascimento espiritual operado pelo Espírito.[9]

Arrependimento contínuo e operante

          O arrependimento marca o início da vida cristã e, também, caracteriza a sua totalidade. Packer resume: “A mudança é radical, tanto interior como exteriormente: ânimo e opinião, vontade e afetos, conduta e estilo de vida, motivos e propósitos são todos envolvidos. Arrependimento significa começo de uma nova vida”.[10]

          Deus deseja que nos arrependamos de nossos pecados e, como evidência desta transformação, mudemos de comportamento.[11] O arrependimento não significa uma vitória definitiva contra o pecado. Ainda estamos nessa batalha. Se a condição de nossa salvação fosse essa vitória total, nenhum de nós seria salvo.[12]

          O arrependimento nos acompanhará para sempre neste estágio de vida, no qual mudamos de rumo, entristecidos com o nosso pecado e, alegres em podermos seguir a Cristo.

          Esta restauração, na verdade, não se consuma em um momento, ou em um dia, ou em um ano. Antes, por meio de avanços contínuos, ainda que amiúde, de fato, lentos, Deus destrói em seus eleitos as corrupções da carne, os limpa de sua imundície e a si os consagra por templos, renovando-lhes todos os sentimentos à verdadeira pureza, para que se exercitem no arrependimento toda sua vida e saibam que não há nenhum fim para esta luta senão na morte.[13]

          O conforto é que Deus em Cristo nos perdoará sempre que, sinceramente arrependidos, suplicarmos com fé o seu perdão.  Pela graça somos salvos, somente pela soberana graça!

           Na parábola dos dois filhos, contada por Jesus, temos exemplificado este princípio:

E que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Chegando-se ao primeiro, disse: Filho, vai hoje trabalhar na vinha. Ele respondeu: Sim, senhor; porém não foi. Dirigindo-se ao segundo, disse-lhe a mesma cousa. Mas este respondeu: não quero, depois arrependido, foi. Qual dos dois fez a vontade (qe/lhma)do Pai? Disseram: O segundo. Declarou-lhes Jesus: Em verdade vos digo que publicanos e meretrizes vos precedem no reino de Deus. Porque João veio a vós outros no caminho da justiça, e não acreditastes nele; ao passo que publicanos e meretrizes creram. Vós, porém, mesmo vendo isto não vos arrependestes, afinal, para acreditardes nele. (Mt 21.28-32).

          O segundo filho que tipifica o verdadeiro arrependimento, mesmo tendo negado ao pedido de seu pai, depois, repensou a questão, considerando inclusive o que tinha provavelmente planejado para aquele dia e, não apenas terminou em certa tristeza pela sua negativa, mas, foi e fez o que o pai pediu. Isso é arrependimento. Ele não termina em um repensar ou reconsiderar a realidade, mas, concretiza-se em obediência ao chamado.

          A vontade de Deus é que os homens, confrontados com a mensagem salvífica de Deus, se arrependam de seus pecados, recebendo a Cristo como seu Salvador pessoal, iniciando uma nova fase em sua vida, tendo como princípio animador agradar a Deus, sendo-lhe obediente.

          Deus deseja que procuremos agradá-lo em todas as coisas. No entanto, sabemos que pecamos, que falhamos, que não atingimos o alvo de santidade proposto por Deus, por isso, conscientes de nossos pecados, devemos nos arrepender, buscando o perdão de Deus e quando possível, reparar o nosso erro.

          A Confissão de Westminster(1647) resume: “O pecador pelo arrependimento, de tal maneira sente e aborrece os seus pecados, que, deixando-os, se volta para Deus, tencionando e procurando andar com Ele em todos os caminhos dos seus mandamentos” (XV.2).

No arrependimento não há mérito nem arrogância, antes, vergonha e, em um segundo momento, atitude de gratidão a Deus por nos ter aceito, que se manifesta em frutos de obediência. Obediência é a graça material da gratidão. O pecador arrependido não se protege em supostos atenuantes,[14] antes, certo de seu pecado, culpa, e da gravidade de ter ofendido a Deus,[15] busca a consciência do misericordioso perdão[16] de seu Senhor.

Maringá, 06 de maio de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus(Mt 3.2). “Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus” (Mt 4.17).  “14 Depois de João ter sido preso, foi Jesus para a Galileia, pregando o evangelho de Deus,  15 dizendo: O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1.14-15). “46 E lhes disse: Assim está escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia  47 e que em seu nome se pregasse arrependimento para remissão de pecados a todas as nações, começando de Jerusalém” (Lc 24.46-47). “Testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo”(At 20.21). 18 para lhes abrires os olhos e os converteres das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus, a fim de que recebam eles remissão de pecados e herança entre os que são santificados pela fé em mim.  19 Pelo que, ó rei Agripa, não fui desobediente à visão celestial,  20 mas anunciei primeiramente aos de Damasco e em Jerusalém, por toda a região da Judéia, e aos gentios, que se arrependessem e se convertessem a Deus, praticando obras dignas de arrependimento” (At 26.18-20).“Eu repreendo e disciplino a quantos amo. Sê, pois, zeloso e arrepende-te” (Ap 3.19).

[2]“Ora, não levou Deus em conta os tempos da ignorância; agora, porém, notifica aos homens que todos, em toda parte, se arrependam (metanoe/w)(At 17.30).

[3]“De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus” (2Co 5.20).

[4] Vejam-se: Walter J. Chantry, O Evangelho hoje: autêntico ou sintético? São Paulo: Fiel, 1978, p. 41-49; John MacArthur, O Evangelho Segundo os Apóstolos, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2011, p. 91-109.

[5] “Deus, porém, com a sua destra, o exaltou a Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento (meta/noia) e a remissão de pecados” (At 5.31). “E, ouvindo eles estas coisas, apaziguaram-se e glorificaram a Deus, dizendo: Logo, também aos gentios foi por Deus concedido o arrependimento (meta/noia) para vida” (At 11.18).

[6]Hoekema assim define: “o retorno consciente da pessoa regenerada, para longe do pecado e para perto de Deus, numa completa mudança de vida, manifestando-se numa nova maneira de pensamento, sentimento e vontade” (Anthony A. Hoekema, Salvos Pela Graça, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1997, p. 133). Especialmente, p. 133-135.

[7] Expressão usada por Calvino. Veja-se: João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 2, (II.5), p. 130-131.

[8] “Assim como o coração no sentido físico é o ponto de origem e de força propulsora da circulação do sangue, assim também, espiritual e eticamente ele é a fonte da mais elevada vida do homem, a sede de sua autoconsciência, de seu relacionamento com Deus, de sua subserviência à Sua lei, enfim, de toda a sua natureza moral e espiritual. Portanto, toda a sua vida racional e volitiva tem seu ponto de origem no coração e é governada por ele” (Herman Bavinck, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 19).

[9] Veja-se: A.A. Hoekema, Salvos pela graça, São Paulo: Cultura Cristã, 1997, p. 133-135.

[10]J.I. Packer, Teologia Concisa,São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 152.

[11] No início do século XIX (1816), o cronista e empresário protestante Henry Koster (c. 1784-1820), comentando a respeito da introdução do Cristianismo entre os escravos por parte do clero católico, resume: “A introdução da religião cristã entre os escravos não prestou maior serviço do que modificar  o homem relativamente ao tratamento da mulher e a conduta dessas últimas” (Henry Koster, Viagens ao Nordeste do Brasil, 2. ed. Recife, PE.: Secretaria de Educação e Cultura, Governo do Estado de Pernambuco, Departamento de Cultura, (Coleção Pernambucana, v. 17), 1978, p. 393).

[12] Cf. R.C. Sproul, Somos todos teólogos: uma introdução à Teologia Sistemática, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2017, p. 347.

[13]“Arrependimento, como descrito na Bíblia, é um ideal alto, temos que tentar revelá-lo continuamente, mas jamais o faremos completamente nesta vida. (…) Arrependimento é, na verdade, necessário para a salvação, mas não precisa ser um arrependimento perfeito. Se isso fosse necessário, quem seria salvo?” (Anthony A. Hoekema, Salvos Pela Graça, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1997, p. 137-138).

[14]“A autodefesa vai-se quando vemos que não merecemos nada senão castigo. Compreendemos que somos miseráveis, que somos vis. O homem muda, pois, o seu conceito sobre si próprio” (D.M Lloyd-Jones, Romanos: Exposição Sobre Capítulos 2:1 a 3:20: o justo juízo de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1999, p. 85). Veja-se: Allan Harman, Comentário do Antigo Testamento ‒ Salmos, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, (Sl 32-3-5), p. 157.

[15] “Jamais aplicaremos seriamente o perdão divino, enquanto não tivermos obtido uma visão tal de nossos pecados, que nos inspire terror” (João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 2, (Sl 51.3), p. 424).

[16] “De fato o perdão de pecados é realizado definitiva e perfeitamente em Deus, mas nos é dado e apropriado por nós em nossas vidas através da fé e do arrependimento” (Herman Bavinck, Teologia Sistemática,Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 462).

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