A Pessoa e Obra do Espírito Santo (141)
6.4. Um estudo de caso: A Academia de Genebra: missão como vocação (Continuação)
A Instituição estava dividida em duas partes principais: A Schola Privata que equivalia ao colégio (gymnasium), dividido em sete séries, destinava-se aos jovens de até 16 anos e, a Schola Publica ou Academia que continuava o colégio, ministrando ensino superior.[1] O currículo incluía disciplinas tais como: Teologia, Hebraico, Grego, Filosofia, Matemática e Retórica.
Entre outros, eram estudados autores gregos e latinos, como: Heródoto, Xenofonte, Homero, Demóstenes, Plutarco, Platão, Cícero, Virgílio e Ovídio.[2] NAs Institutas, escreveu: “Admito que a leitura de Demóstenes ou Cícero, de Platão ou Aristóteles, ou de qualquer outro da classe deles, nos atrai maravilhosamente, nos deleita e nos comove ao ponto de nos arrebatar”.[3]
Em 1550 Calvino dedicou o seu Comentário da Primeira Epístola aos Tessalonicenses (Genebra, 17/02/1550), ao seu mestre de gramática e retórica, conhecido humanista, Maturinus Corderius (c. 1479-1564) – que foi fundamental na formação do estilo de Calvino –, a quem Calvino chama de “homem de eminente piedade e erudição”[4] reconhecendo a sua dívida para com ele.[5]
Posteriormente, Corderius, convertido ao Protestantismo, Calvino o convidou a lecionar na Academia de Genebra, o que Corderius aceitou, sendo inclusive durante algum tempo diretor daquela instituição, permanecendo ali até a sua morte em 08/09/1564, quatro meses depois de Calvino.[6] Corderius além de brilhante e laborioso professor,[7] era conhecido por sua erudição, piedade e integridade. A sua contribuição à Academia de Genebra, ainda que breve, foi bastante significativa.[8]
Com o estabelecimento da Academia, o historiador Charles Borgeaud (1861-1941), antigo professor da Universidade de Genebra, disse que “Esta foi a primeira fortaleza da liberdade nos tempos modernos”.[9]
A partir da Academia e a disseminação do pensamento Protestante se internacionalizou. Novas Universidades são criadas e outras, de origem medieval, aderem ao novo sistema de pensamento, destacando as Universidades de: Wittenberg (1502); Heidelberg (1386), tornando-se oficialmente protestante reformada em 1556;[10] Leiden (1575), Academia de Saumur (1593). Mais tarde, a Universidade de Harvard (1636) Universidade de Ultrecht (1636); Universidade de Halle (1694); Universidade de Yale (1701); Universidade de Colúmbia (Antiga: King’s College (1754); Universidade de Princeton (Antiga: College of New Jersey) (1746).
Centro missionário
Além disso, Genebra se tornou um grande centro missionário, uma verdadeira “escola de missões”, porque os foragidos que lá se instalaram, puderam, posteriormente, levar para os seus países e cidades o Evangelho ali aprendido.[11] “O estabelecimento da Academia foi em parte realizado por causa do desejo de suprir e treinar missionários evangélicos”, informa-nos Mackinnon (1860-1945).[12]
Destacamos que, com exceção de Isaías, todos os comentários de Calvino sobre os profetas “consistem em sermões direcionados a alunos em treinamento para o trabalho missionário, principalmente na França”, informa-nos Parker (1916-2016).[13]
Como curiosidade cito que a palavra colportor que deriva do francês colporteur, significa “levar no pescoço”. Esse nome está associado ao costume dos colportores valdenses de levar os escritos sagrados debaixo da roupa (“porteur à col”) presos por uma correia em forma de alça que passa pelo pescoço.
Continuaremos no próximo post.
Maringá, 24 de março de 2021.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] Vejam-se: Ronald S. Wallace, Calvino, Genebra e a Reforma,p. 88; Gerald L. Gutek, Historical and Philosophical Foundations of Education: A Biographical Introduction, 3ª ed, Columbus, Ohio: Merril Prentice Hall, 2001, p. 92; W. Stanford Reid, Calvin and the Founding of the Academy of Geneva: In: Westminster Theological Journal, 18, (1955), p. 11-17; Edson Pereira Lopes, O Conceito de Teologia e Pedagogia na Didática Magna de Comenius, São Paulo: Editora Mackenzie, 2003, p, 67-70; Heber Carlos de Campos, A “Filosofia Educacional” de Calvino e a Fundação da Academia de Genebra. In: Fides Reformata, 5/1 (2000) 41-56, p. 51-52.
[2] Vejam-se: Philip Schaff, History of the Christian Church,v. 8, p. 805; Ronald S. Wallace, Calvino, Genebra e a Reforma,p. 88; Gerald L. Gutek, Historical and Philosophical Foundations of Education: A Biographical Introduction, 3. ed., Columbus, Ohio: Merril Prentice Hall, 2001, p. 92.
[3] João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, v. 1, I.24. p. 74. Ver também: Heber Carlos de Campos, A “Filosofia Educacional” de Calvino e a Fundação da Academia de Genebra. In: Fides Reformata, 5/1 (2000) 41-56, p. 51.
[4]John Calvin, Calvin’s Commentaries, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House Company, 1981, v. 21, (Prefácio do seu comentário de 1ª Tessalonicenses) p. 234.
[5] Na Dedicatória de 1ª Tessalonicenses, disse: “Eu me reconheço endividado para você pelo progresso que foi feito desde então. E isto eu estava desejoso de testemunhar à posteridade que, se qualquer vantagem provirá a eles de meus escritos, eles saberão que tem em algum grau originado com você” (John Calvin, Calvin’s Commentaries, v. XXI,p. 234).
[6]Vejam-se: Theodore Beza, “Life of John Calvin,” John Calvin Collection, [CD-ROM], (Albany, OR: Ages Software, 1998), p. 4; Timothy George, Teologia dos Reformadores, p. 170; Jorge P. Fisher, Historia de la Reforma, Barcelona: CLIE., (1984), p. 195-196; C.H. Irwin, Juan Calvino: Su Vida y Su Obra, p. 16s.; John T. McNeill, The History and Character of Calvinism, p. 98,192; Idem, Los Forjadores del Cristianismo, v. 2, p. 207; Philip Schaff, History of the Christian Church, v. 8, p. 301-302.
[7] Beza registra que Corderius (Cordier) faleceu em Paris “aos oitenta e cinco anos, instruindo alunos do sexto ano, até três ou quatro dias antes de morrer” (Theodoro de Beza, A Vida e a Morte de João Calvino, Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 2006, p. 9). Vejam-se aspectos da personalidade e método de Cordier em: Bernard Cottret, Calvino. La Fuerza y La Fragilidad: Biografía, Madrid: Editorial Complutense, 2002, p. 12-15.
[8] Cf. Nicholas Hans, Educação Comparada, 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971, p. 192-193.
[9] Charles Borgeaud, Histoire l’Université de Genève, p. 83.
[10] Cf. https://www.uni-heidelberg.de/en/university/history/chronology (Consulta feira em 22.02.2021).
[11]Para maiores detalhes, ver: Hermisten M.P. Costa, A Academia de Genebra e a Evangelização. In: Brasil Presbiteriano, São Paulo: Cultura Cristã, janeiro de 2009, p. 4-5.
[12] James MacKinnon, Calvin and the Reformation, London: Penguin Books, 1936, p. 195.
[13]T.H.L. Parker em Prefácio à Versão Inglesa do Comentário de Daniel (João Calvino, O Profeta Daniel: 1-6,São Paulo: Parakletos, 2000, v. 1, p. 13).