Os eleitos de Deus e o seu caminhar no tempo e no teatro de Deus (41)
A) A longanimidade em relação a Deus
Devemos esperar perseverantemente nas promessas de Deus. Abraão alcançou a promessa que esperou com longanimidade. O escritor de Hebreus exorta os seus leitores:
Desejamos, porém, continue cada um de vós mostrando, até ao fim, a mesma diligência para a plena certeza da esperança; para que não vos torneis indolentes, mas imitadores daqueles que, pela fé e pela longanimidade (makroqumi/a), herdam as promessas. Pois, quando Deus fez a promessa a Abraão, visto que não tinha ninguém superior por quem jurar, jurou por si mesmo, dizendo: Certamente, te abençoarei e te multiplicarei. E assim, depois de esperar com paciência (makroqume/w), obteve Abraão a promessa. (Hb 6.11-15).
Notemos que a nossa perseverança em esperar o cumprimento da promessa de Deus é resultado de nossa vivência com Ele, sabendo que Deus é fiel, que nada promete sem pretender ou poder cumprir. Esta convicção que tem a sua prova evidente e objetiva na Palavra, adquire um sentido especialmente real para o crente a partir do exercício de sua fé no Deus a quem conhece como Senhor Fiel e poderoso para cumprir todos os Seus propósitos, sabendo que não há impossíveis para Deus.
A nossa paciência tem um fim escatológico. Devemos aprender com a paciência do lavrador. A expectativa jubilante da volta de Cristo deve ser um combustível constante para a nossa alegria e perseverança.
A paciência da Igreja não é estimulada com falsas promessas ou com meras probabilidades. Devemos esperar em Deus, aguardando a volta triunfante de Cristo, conforme Ele mesmo prometeu:
Sede, pois, irmãos, pacientes (makroqume/w), até à vinda do Senhor. Eis que o lavrador aguarda com paciência (makroqume/w) o precioso fruto da terra, até receber as primeiras e as últimas chuvas. Sede vós também pacientes (makroqume/w) e fortalecei o vosso coração, pois a vinda do Senhor está próxima. (Tg 5.7-8).
Àqueles que eram tentados a abandonar a sua fé ou a se entregar a uma letargia resultante de uma dúvida paralisante, o escritor de Hebreus escreve estimulando-os a seguirem o modelo dos servos de Deus que deram exemplo de longanimidade:
Desejamos, porém, continue cada um de vós mostrando, até ao fim, a mesma diligência para a plena certeza da esperança; para que não vos torneis indolentes, mas imitadores daqueles que, pela fé e pela longanimidade (makroqumi/a), herdam as promessas. (Hb 6.11-12).
A Longanimidade fortalece a nossa fé: No exercício desta confiança perseverante em Deus, fortalecemos os nossos corações e nos alegramos em Deus, crescendo mais em nossa experiência proveniente da Palavra e vivida em nossa cotidianidade.
As promessas de Deus são para serem cridas e vivenciadas por todo o povo de Deus: quem crê verá! É neste sentido que Paulo intercede pelos colossenses:
….Desde o dia em que o ouvimos, não cessamos de orar por vós e de pedir que transbordeis de pleno conhecimento da sua vontade, em toda a sabedoria e entendimento espiritual; a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus; sendo fortalecidos com todo o poder, segundo a força da sua glória, em toda a perseverança e longanimidade (makroqumi/a); com alegria, dando graças ao Pai, que vos fez idôneos à parte que vos cabe da herança dos santos na luz. (Cl 1.9-12/Hb 6.12-15).
B) A longanimidade em relação ao serviço de Deus
a) Devemos pregar a Palavra com longanimidade: “Prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade (makroqumi/a) e doutrina” (2Tm 4.2). “Nenhum homem pode pregar ou ensinar sem makrotumia”, aconselha-nos Barclay.[1]
Não podemos simplesmente desistir por causa das dificuldades ou porque julgamos que aquela pessoa a quem pregamos está “empedernida”. Devemos persistir em nossa tarefa. Notemos que o que distingue a nossa longanimidade é a doutrina. A perseverança ensinada e vivida por Paulo associava-se à doutrina que ensinava – que recebera de Cristo (1Co 11.23; 15.3; Gl 1.12/1Co 9.1; 15.8; Gl 1.15-16) -, não a um conjunto de lendas por ele inventado. Portanto, o senso de urgência deve orientar e ser o combustível de nossa tarefa: “Prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não”. Nós não temos o controle do tempo; não sabemos até quando teremos esta oportunidade ou se teremos outra; a urgência no anúncio da Palavra deve nos impulsionar a fazê-lo com toda longanimidade e doutrina
Anos antes, Paulo quando reuniu os presbíteros de Éfeso em Mileto, relembra como foi contínuo o seu trabalho naquela cidade, declarando que mesmo sobre fortes provações e perseguições permaneceu inabalável em sua missão: “Jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa, testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo. (…) porque jamais deixei de vos anunciar todo o desígnio de Deus. (…) Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um” (At 20.20,21,27, 31)
Os profetas, também nesta perseverança, se constituem num exemplo para nós: “Irmãos, tomai por modelo (u(po/deigma)[2] no sofrimento e na paciência (makroqumi/a) os profetas, os quais falaram em nome do Senhor” (Tg 5.10).
b) Paulo em outro contexto, revela a sua longanimidade no Ministério: “Em tudo recomendando-nos a nós mesmos como ministros de Deus: na muita paciência, nas aflições, nas privações, nas angústias, nos açoites, nas prisões, nos tumultos, nos trabalhos, nas vigílias, nos jejuns, na pureza, no saber, na longanimidade (makroqumi/a), na bondade, no Espírito Santo, no amor não fingido” (2Co 6.4-6).
C) A Longanimidade em relação ao nosso próximo
O texto de Paulo aos efésios nos fala como devemos andar, com toda longanimidade (Ef 4.2). Como o contexto direciona-se para as nossas relações, deixei esta parte para o final a fim de realçar biblicamente como deve ser a nossa convivência social:
Devemos ser longânimos para com todos. No entanto, este sentimento deve vir acompanhado de outros, para que não confundamos longanimidade com frouxidão moral ou tolerância pecaminosa. É desse modo que Paulo instrui os tessalonicenses: “Exortamo-vos, também, irmãos, a que admoesteis os insubmissos, consoleis os desanimados, ampareis os fracos e sejais longânimos (makroqume/w) para com todos” (1Ts 5.14). A longanimidade deve acompanhar a prática das demais atitudes.
Devemos nos revestir desse e de outros sentimentos. A longanimidade deve ser a nossa vestimenta diária com a qual tomamos as nossas decisões: “Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade (makroqumi/a)” (Cl 3.12).
Em contraste com o modelo dos falsos mestres, Paulo estimula Timóteo a continuar seguindo o seu exemplo de longanimidade: “Tu, porém, tens seguido, de perto, o meu ensino, procedimento, propósito, fé, longanimidade (makroqumi/a), amor, perseverança”(2Tm 3.10).
Por intermédio do exemplo de Paulo, aprendemos que devemos orar pelos nossos irmãos nesse sentido:
Por esta razão, também nós, desde o dia em que o ouvimos, não cessamos de orar por vós e de pedir que transbordeis de pleno conhecimento da sua vontade, em toda a sabedoria e entendimento espiritual; a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus; sendo fortalecidos com todo o poder, segundo a força da sua glória, em toda a perseverança e longanimidade (makroqumi/a); com alegria, dando graças ao Pai, que vos fez idôneos à parte que vos cabe da herança dos santos na luz. (Cl 1.9-12).
Aqui podemos destacar o contraste estabelecido entre o homem grego e o cristão conforme interpreta Barclay (1907-1978):
A grande virtude grega era megalopsuchia, que Aristóteles define como a recusa em tolerar qualquer ofensa ou injúria. Para os gregos o grande homem era aquele que procurava a vingança com todas as suas forças. Para o cristão, o grande homem é aquele que, mesmo quando tem a oportunidade, recusa-se a agir assim.[3]
O homem na sua vida terrena deve reproduzir a paciência incansável de Deus para com as pessoas, e a paciência que não perde a coragem com os eventos.[4]
Maringá, 02 de maio de 2019.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
*Leia esta série completa aqui.
[1]William Barclay, As Obras da Carne e o Fruto do Espírito, São Paulo: Vida Nova, 1985, p. 92. Atenho-me ao conselho de Barclay quanto à perseverança, não ao conteúdo de sua pregação.
[2]u(pó/deigma (*Jo 13.15; Hb 4.11; 8.5; 9.23; Tg 5.10; 2Pe 2.6). “Exemplo”, “modelo”, “figura”, “padrão”.
[3]William Barclay, Palavras Chaves do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1988 (reimpressão), p. 140.
[4]William Barclay, As Obras da Carne e o Fruto do Espírito, São Paulo: Vida Nova, 1985, p. 93. Em outro lugar: “A paciência humana é um reflexo da paciência divina que arca com todos os nossos pecados e jamais nos rejeita” (William Barclay, El Nuevo Testamento Comentado, Buenos Aires: La Aurora, 1973, v. 11, (Cl 3.9b-13) p. 169).
Eu não espero com perseverança em Deus por causa do que Ele fez por mim ou prometeu fazer, eu o faço porque Ele é Deus.
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