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Uma oração intercessória pela Igreja (159) - Hermisten Maia

Uma oração intercessória pela Igreja (159)

         8.6. A Igreja como expressão e agente da Glória do Deus Triúno (Continuação)

                Jesus Cristo desafia a Igreja a assumir a sua identidade, não uma simples máscara periódica, antes, como autêntico povo de Deus alcançado e constituído por sua misericórdia. A Igreja como expressão do poder de Deus é gloriosa em sua natureza e missão:

Vós sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte; nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa. Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem (doca/zw) a vosso Pai que está nos céus (Mt 5.14-16).

            A Igreja, como criação de Deus, é conclamada a viver de forma intencional para a glória dele, sendo um sinal luminoso que aponta de forma efetiva para o seu Criador, a fim de que todos, por meio do nosso testemunho, possam glorificá-lo.

            O modo como pregamos o evangelho reflete o nosso conceito de Deus. Nada é mais importante do que o caráter de Deus. Todavia, quando perdemos a dimensão de quem é Deus, as demais coisas são descaracterizadas. Somente a compreensão correta de quem é Deus pode conferir sentido à nossa existência e a todo o nosso labor missionário. Diante da majestade de Deus, todas as demais coisas tornam-se aos nossos olhos, o que realmente são: pequenas.[1] De fato “Não há glória real senão em Deus”.[2] A perda da dimensão correta da Majestade de Deus, tem como causa primeira, o descrédito para com a sua Palavra. Quando não somos instruídos pelas Escrituras[3] deixamos de reconhecer salvadoramente a Jesus Cristo, o Filho de Deus (Mt 22.29/Os 4.1,6).[4]

            Quando visão da glória de Deus como expressão de sua santidade é perdida, a mensagem da igreja torna-se frágil, cuja teor tem como propósito ser simplesmente convidativa, agradável, cativante, emocionante, contagiante, etc.,  dirigida a um auditório que imaginamos e cultivamos cheio de melindres. Em outras palavras, o Evangelho torna-se uma mensagem prostituída com as vestimentas convidativas para um banquete puramente sensual.

            Em 1996, um grupo de Evangélicos radicados nos Estados Unidos elaborou a Declaração Teológica de Cambridge. Na Quarta tese, lemos:

Onde quer que, na igreja, se tenha perdido a autoridade da Bíblia, onde Cristo tenha sido colocado de lado, o evangelho tenha sido distorcido ou a fé pervertida, sempre foi por uma mesma razão. Nossos interesses substituíram os de Deus e nós estamos fazendo o trabalho dele a nosso modo. A perda da centralidade de Deus na vida da igreja de hoje é comum e lamentável. É essa perda que nos permite transformar o culto em entretenimento, a pregação do evangelho em marketing, o crer em técnica, o ser bom em sentir-­nos bem e a fidelidade em ser bem­-sucedido. Como resultado, Deus, Cristo e a Bíblia vêm significando muito pouco para nós e têm um peso irrelevante sobre nós.

Deus não existe para satisfazer as ambições humanas, os desejos, os apetites de consumo, ou nossos interesses espirituais particulares. Precisamos nos focalizar em Deus em nossa adoração, e não em satisfazer nossas próprias necessidades. Deus é soberano no culto, não nós. Nossa preocupação precisa estar no reino de Deus, não em nossos próprios impérios, popularidade ou êxito.[5]

             O que anunciamos jamais será o Evangelho bíblico se consistir apenas numa mensagem de alívio para as supostas necessidades do homem. Esta concepção nos parece imperiosamente relevante. Quando proclamamos o Evangelho, estamos glorificando a Deus por meio de nossa obediência ao seu mandamento de anunciar a mensagem de redenção a todos os homens. “O nome de Deus nunca é melhor celebrado do que quando a verdadeira religião é extensamente propagada e quando a Igreja cresce, a qual por essa conta é chamada ‘plantações do Senhor, para que Ele seja glorificado’ [Is 61.3]”, interpreta Calvino.[6]

            Contudo, devemos também ter em mente que o nosso propósito em assim fazê-lo deve ser o de glorificar a Deus no anúncio de sua mensagem redentiva. Deus é glorificado não somente por intermédio dos que creem, quando a sua misericórdia resplandece, mas, mesmo por intermédio daqueles que rejeitam a mensagem, sendo glorificada a sua paciência e justiça (Rm 9.22-24)[7] que são tão santas como o seu amor e misericórdia.

            A Igreja de Deus, no seu ato essencial de proclamar as virtudes de Deus (1Pe 2.9-10), tem como objetivo final a Glória de Deus (Rm 11.36; 1Co 10.31). A Evangelização visa glorificar a Deus, por meio do anúncio da natureza de Deus e de sua obra eficaz efetivada em Cristo Jesus.

            Ousamos dizer, que a Evangelização tem fundamentalmente como alvo final, glorificar a Deus; e Deus é glorificado por meio da salvação de seu povo (Is 43.7; Jo 17.6-26; Ef 1.7/2Ts 1.10-12) e a consequente confissão de sua soberania (Fp 2.5-11). A glória de Deus é muito maior do que a nossa salvação; mas, também sabemos que “a glória de Jesus é a salvação de seus seguidores”, exulta Hendriksen.[8]

São Paulo, 26 de setembro de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]Comentando Dn 3.28 – quando Nabucodonosor admite que Sadraque, Mesaque e Abedenego preferiram obedecer a Deus ao decreto real –, Calvino escreve: “Toda e qualquer pessoa que olha para Deus, facilmente menospreza a todos os mortais e a tudo o que se afigura esplêndido e majestoso no mundo inteiro” (João Calvino, O Profeta Daniel: 1-6, São Paulo: Parakletos, 2000, v. 1, (Dn 3.28), p. 228).

[2]João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 1.17), p. 46.

[3]“Ninguém jamais aprenderá o que Cristo é, ou o propósito de suas ações e sofrimentos, salvo pela orientação e ensino das Escrituras. Até onde, pois, cada um de nós deseja progredir no conhecimento de Cristo, teremos que meditar bastante e continuamente sobre a Escritura” (João Calvino, O evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 2.17), p. 100).

[4]“Respondeu-lhes Jesus: Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22.29). “Ouvi a palavra do Senhor, vós, filhos de Israel, porque o Senhor tem uma contenda com os habitantes da terra, porque nela não há verdade, nem amor, nem conhecimento de Deus. (…) O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento. Porque tu, sacerdote, rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de mim; visto que te esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de teus filhos” (Os 4.1,6).

[5]Documento consultado em 03/05/18 no site: http://www.alliancenet.org/cambridge-declaration : www.alliancenet.org . Em português: James M. Boice: Benjamin E. Sasse, Reforma Hoje, 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 19.

[6] João Calvino, O Livro dos Salmos,São Paulo: Edições Parakletos, 2002, v. 3, (Sl 102.21), p. 581.

[7]“Que diremos, pois, se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição, a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória (do/ca) em vasos de misericórdia, que para glória (do/ca) preparou de antemão, os quais somos nós, a quem também chamou, não só dentre os judeus, mas também dentre os gentios?” (Rm 9.22-24).

[8]William Hendriksen, O Evangelho de João, São Paulo: Cultura Cristã, 2004, (Jo 17.6), p. 758.

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