Uma oração intercessória pela Igreja (149)
10) Zelo pela igreja
“Atendei (prose/xw)(= guardar, acautelar, atentar, ocupar, dar atenção) por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o seu próprio sangue” (At 20.28).
O pastor é alvo especial de Satanás porque na eventualidade dele tropeçar e cair, é mais fácil seduzir e dispersar o rebanho. Digo com tristeza e temor: Os nossos equívocos e descaminhos podem ser fatais ao rebanho que nos foi confiado (Ml 2.8).[1]
Não é à toa que alguns anos depois, Paulo recomendaria ao jovem pastor de Éfeso: “Tem cuidado (e)pe/xw) (= preservar, permanecer, olhar atentamente) de ti mesmo e da doutrina (didaskali/a). Continua nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes” (1Tm 4.16).
Pode parecer estranho, mas, o cuidado com o rebanho começa pelo cuidado conosco mesmo. Ao mesmo tempo, creio está envolvida a questão do estudo, preparo e ensino com simplicidade,[2] disposição sincera e submissão a Deus. Essa santa e aplicada disposição era o segredo de Esdras:
8 Esdras (…) chegou a Jerusalém, segundo a boa mão do seu Deus sobre ele. 10 Porque Esdras tinha disposto o coração para buscar (vr;D’)(darash) (estudar, esquadrinhar, buscar com diligência, investigar)[3] a Lei do SENHOR, e para a cumprir, e para ensinar em Israel os seus estatutos e os seus juízos. (Ed 7.8-10).
Para que eu possa preservar a doutrina, tenho que estudá-la[4] com afinco continuamente, perseverantemente (“Continua nestes deveres”) procurando ensiná-la com clareza e fidelidade.
Para que eu possa preservar a doutrina, tenho que estudá-la[5] com afinco continuamente, perseverantemente (“Continua nestes deveres”) procurando ensiná-la com clareza e fidelidade.
11) Fraternidade Cristã
“34 vós mesmos sabeis que estas mãos serviram para o que me era necessário a mim e aos que estavam comigo. 35 Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando assim, é mister socorrer os necessitados e recordar as palavras do próprio Senhor Jesus: Mais bem-aventurado é dar que receber” (At 20.34-35).
Paulo não era simplesmente um pensador abstrato e distante da igreja, pelo contrário: serviu com as próprias mãos. Mais: ele não trazia maior peso à igreja, antes, procurava cuidar dos que estavam com ele. No seu trabalho perseverante, abnegado e generoso, havia um princípio teológico aprendido com o ensino e prática de Jesus Cristo: “Mais bem-aventurado é dar que receber”.
12) Integridade: ética inatacável
“33De ninguém cobicei prata, nem ouro, nem vestes; 34vós mesmos sabeis que estas mãos serviram para o que me era necessário a mim e aos que estavam comigo. 35 Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando (kopia/w) assim, é mister socorrer os necessitados e recordar as palavras do próprio Senhor Jesus: Mais bem-aventurado é dar que receber” (At 20.33-35).
O trabalho de Paulo era desinteressado no que se refere ao enriquecimento. A sua ambição era anunciar o Evangelho de forma eficiente e completa. Ele não cobiçou de ninguém prata nem ouro. Contrastando com isso, diz que trabalhou arduamente.
O verbo kopia/w e o substantivo ko/poj descrevem um trabalho estafante, difícil, árduo, trabalhar até a exaustão, indicando também a dureza e o cansaço que esse trabalho produzia.[6]
A densidade deste trabalho, ainda que ele não especifique o aspecto material do mesmo, é deduzida do texto pelas tentações produzidas pelos inimigos do Evangelho, que criavam dificuldades para a pregação e, mesmo, expondo Paulo a todo tipo de males físicos, morais e espirituais, o que lhe causava grande dor: “Servindo ao Senhor com toda a humildade, lágrimas e provações que, pelas ciladas dos judeus, me sobrevieram” (At 20.19).
Mas, ele não se intimidava:
20 jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa, 21 testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo. 22 E, agora, constrangido em meu espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá, 23 senão que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e tribulações. 24 Porém em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus. (At 20.20-24).
Os judeus de modo especial não davam trégua a Paulo; estavam sempre tentando destruir o seu trabalho e preparando armadilhas para matá-lo (At 14.19-20; 20.3; 21.30-32; 23.12-15). No entanto, ele continuava fazendo o seu serviço sem esmorecer. Ele foi chamado por Deus. As igrejas espalhadas pelas cidades onde passou eram um atestado de sua vocação e fidelidade ao Senhor.
Outro ponto que evidencia a integridade ética do apóstolo, era a intensidade do trabalho e o seu significativo amor para com o rebanho que o Senhor lhe confiara, e que, por vezes, lhe causava tristeza e apreensões por verificar determinados problemas na comunidade e antever dificuldades futuras:
29 Eu sei que, depois da minha partida, entre vós penetrarão lobos vorazes, que não pouparão o rebanho. 30 E que, dentre vós mesmos, se levantarão homens falando coisas pervertidas para arrastar os discípulos atrás deles. 31 Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um.32 Agora, pois, encomendo-vos ao Senhor e à palavra da sua graça, que tem poder para vos edificar e dar herança entre todos os que são santificados. (At 20.29-32).[7]
O escritor de Hebreus, indicando a respeitabilidade de seus presbíteros pelo trabalho que realizam, os instrui:
Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam (a)grupne/w) (= vigiar, permanecer alerta, estar acordado) por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros. (Hb 13.17).
O velar pela alma, indica a responsabilidade destes homens pela igreja, revelando o seu cuidado espiritual para com as ovelhas que, dentro do contexto, estavam sendo assoladas por doutrinas estranhas (Hb 13.7-9).[8]
Os ministros deverão prestar contas não simplesmente ao Conselho, à assembleia ou ao Presbitério por meio de seu relatório, mas, a Deus que os vocacionou.
Maringá, 15 de setembro de 2023.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] “Mas vós vos tendes desviado do caminho e, por vossa instrução (hr’AT) (torah), tendes feito tropeçar a muitos; violastes a aliança de Levi, diz o SENHOR dos Exércitos” (Ml 2.8).
[2] “O método ordinário de Cristo de ensinar – isto é, com comum simplicidade – aqui se contrasta com o exibicionismo e brilhantismo a que os homens ambiciosos se apegam tanto” (João Calvino, O evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 3.12), p. 128).
[3]A ideia básica do termo (vrD) (darash) é buscar com diligência (Lv 10.16). A palavra buscar além deste sentido (Lv 10.16; Sl 22.26; 24.6 [duas vezes]; Sl 53.3), pode ser traduzida por: Requerer (Dt 23.22; Sl 9.12); cuidar (Dt 11.12); investigar (Sl 10.4); se importar (Sl 10.13); esquadrinhar (Sl 10.15); procurar (Sl 77.2); considerar (Sl 111.2); empenhar-se (Sl 119.45); interessar-se (Sl 142.4).
[4]Vejam-se: John Piper, A Supremacia de Deus na Pregação, São Paulo: Shedd Publicações, 2003, p. 57; Gene Edward Veith, Jr., De Todo o Teu Entendimento, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 33. Sobre a necessidade de estudo por parte do pastor e alguns de seus perigos, veja-se: Derek Prime; Alistair Begg, Ser pastor, São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 82-99.
[5]Vejam-se: John Piper, A Supremacia de Deus na Pregação, São Paulo: Shedd Publicações, 2003, p. 57; Gene Edward Veith, Jr., De Todo o Teu Entendimento, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 33. Sobre a necessidade de estudo por parte do pastor e alguns de seus perigos, veja-se: Derek Prime; Alistair Begg, Ser pastor, São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 82-99.
[6]Mt 6.28; Jo 4.38b; Rm 16.6,12; 1Co 4.12; Fp 2.16; Cl 1.29; 1Tm 5.17. “Um ministro preguiçoso é uma criatura desprezada pelos homens e abominada por Deus” (C.H. Spurgeon, Firmes na Verdade, Lisboa: Edições Peregrino, LDA., 1987, p. 66). Curiosamente, Paulo é quem mais utiliza esta palavra para se referir ao seu ministério: “….em tudo recomendando-nos a nós mesmos como ministros de Deus: na muita paciência, nas aflições, nas privações, nas angústias, nos açoites, nas prisões, nos tumultos, nos trabalhos (ko/poj)….” (2Co 6.4-5). (Ver: 2Co 11.23,27). Paulo trouxe à memória dos tessalonicenses, a lembrança do seu labor, de como ele se esforçou por pregar o Evangelho sem depender financeiramente daqueles irmãos: “Porque, vos recordais, irmãos, do nosso labor(ko/poj) e fadiga; e de como, noite e dia labutando para não vivermos à custa de nenhum de vós, vos proclamamos o evangelho de Deus” (1Ts 2.9/2Ts 3.8; At 20.35; 1Co 4.12; 15.10). Paulo também relembra aos irmãos que quando teve de partir de Tessalônica devido a perseguição que se moveu contra ele, manteve-se preocupado com a Igreja. Assim, tendo enviado a Silas e Timóteo para verificar o estado da Igreja, aguardou-os num primeiro momento em Atenas:“Foi por isso que, já não me sendo possível continuar esperando, mandei indagar o estado da vossa fé, temendo que o Tentador vos provasse, e se tornasse inútil o nosso labor(ko/poj)” (1Ts 3.5).
Escrevendo aos Romanos, Paulo destaca algumas irmãs que se exauriam no trabalho de Deus: “Saudai a Maria que muito trabalhou (kopia/w) por vós” (Rm 16.6). “Saudai a Trifena e a Trifosa, as quais trabalhavam (kopia/w) no Senhor. Saudai a estimada Pérside que também muito trabalhou (kopia/w) no Senhor” (Rm 16.12). Para um estudo mais completo da palavra no Novo Testamento, veja-se: Hermisten M.P. Costa, Introdução à Cosmovisão Reformada, Goiânia, GO.: Cruz, 2016.
[7] Rm 9.2; 2Co 2.4; Fp 3.18.
[8]“7 Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram. 8 Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre. 9 Não vos deixeis envolver por doutrinas várias e estranhas, porquanto o que vale é estar o coração confirmado com graça e não com alimentos, pois nunca tiveram proveito os que com isto se preocuparam” (Hb 13.7-9).