Uma oração intercessória pela Igreja (130)
8.5.1. Vocaciona e confere autoridade aos seus ministros (Continuação)
Paulo, Pedro, João e Judas, como os demais apóstolos, em maior ou menor proporção, tiveram uma experiência profunda e inigualável com o Senhor Jesus. Foram chamados por Ele mesmo e, com exceção de Paulo, andaram com o Senhor em sua encarnação. No entanto, esses homens não alegavam terem superpoderes ou uma fé especial. Antes, reconheciam-se como alcançados pela mesma graça perdoadora. Por isso, dirigem-se aos demais cristãos como irmãos, reconhecendo a mesma fonte genética: o sangue de Cristo. (Rm 12.1; 1Tm 1.12-16; Tt 1.4; 1Pe 5-1.3; 2Pe 1.1; 1Jo 1.1-3; Jd 3).
É preciso que tenhamos esta consciência derivada do ensino bíblico. Deus é o Senhor da Igreja. É Ele quem constitui seus oficiais.
Deus manifesta a sua vontade por intermédio da eleição realizada pela assembleia da igreja conforme a sua forma de governo derivada das Escrituras. Deus sabe sempre o que é melhor para a sua Igreja ainda que nem sempre tenhamos a visão imediata do seu propósito, o que, diga-se de passagem, é mais do que natural.
É Deus mesmo quem na condução de sua Igreja utiliza-se de seus servos a quem escolhe e chama, sendo a Igreja o instrumento de Deus para a execução de parte desse processo.
Portanto, na Igreja de Cristo ninguém tem autonomia para se autonomear. Pastor, Presbíteros e Diáconos, todos, sem exceção, precisam ser vocacionados por Deus para esses ofícios (Jo 10.1-2; Hb 5.4/Jr 23.21-22).[1]
Os Presbíteros(At 20.17)[2] que também são chamados de Bispose Pastores(At 20.28)[3] são constituídos por Deus para a preservação do rebanho (At 20.17,28). [4] É o Espírito, em sua vocação, quem legitima a existência da presbíteros no Novo Testamento.
Não sabemos precisar quando surgiu o ofício de Presbítero. Contudo, conforme acentua Bavinck (1854-1921),
Quando nós nos lembramos de que entre os judeus o governo do ancião, seja na vida cívica ou nas sinagogas, era uma prática comum, não devemos nos surpreender com o fato de que dentre os outros membros da igreja alguns tenham sido escolhidos para assumir a responsabilidade pela supervisão e disciplina.[5]
No texto de At 11.30 temos registrada a sua existência nas Igrejas da Judéia. Pouco antes do ano 50 A.D. encontramos Paulo promovendo nas Igrejas da Galácia, a eleição de Presbíteros. É relevante aqui o plural: “E, promovendo-lhes, em cada igreja, a eleição de presbíteros, depois de orar com jejuns, os encomendaram ao Senhor em quem haviam crido” (At 14.23).
Em 1 Coríntios 12.28, eles aparecem sob o nome de “governos”,[6] provavelmente, referindo-se àqueles que presidem (Rm 12.8/1Ts 5.12),[7] que seguram bem o leme da igreja mantendo-a na direção certa.[8] Por volta do ano 62 A.D. os encontramos na Igreja de Filipos juntamente com os diáconos, parecendo indicar algo comum na estrutura da Igreja (Fp 1.1).[9]
Pouco mais tarde, lemos Paulo orientando Tito a promover a eleição de presbíteros, dando uma configuração mais formal e conclusiva às incipientes igrejas: “Por esta causa, te deixei em Creta, para que pusesses em ordem (* e)pidiorqo/w) as coisas restantes, bem como, em cada cidade, constituísses presbíteros, conforme te prescrevi” (Tt 1.5).
A Epístola de Tiago, escrita a diversas igrejas da Dispersão, aponta para a estrutura comum de vários presbíteros em cada igreja (Tg 1.1/5.14/1Pe 5.1-2).[10] O Novo Testamento, insistimos, nos indica que as Igrejas eram governadas por presbíteros, não apenas por um (At 14.23/Tt 1.5).
Maringá, 19 de agosto de 2023.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] Vejam-se: François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 3, p. 263-265; Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 208.
[2]A palavra “Presbítero” é uma transliteração do grego Presbu/teroj que significa “mais velho” (em relação ao mais novo), “ancião”, indicando também um ofício eclesiástico. “Bispo” é a tradução da palavra grega e)pi/skopoj (*At 20.28; Fp 1.1; 1Tm 3.2; Tt 1.7; 1Pe 2.25), passando pelo latim (episcopus) que significa “supervisor”, “guardião”, “superintendente”.
[3] Quanto à responsabilidade dos pastores, vejam-se: João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 3.15), p. 97-98; João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, (1Co 3.5ss), p. 101ss.
[4] Calvino, falando com a autoridade e a experiência de um eficiente pastor, escreve em 1548: “Os pastores piedosos e probos terão sempre que manter esta luta de desconsiderar as ofensas daqueles que querem desfrutar de vantagem em tudo. Pois a Igreja terá sempre em seu seio pessoas hipócritas e perversas, as quais preferem suas próprias cobiças à Palavra de Deus. E mesmo as pessoas boas, quer por alguma ignorância quer por alguma fraqueza, são às vezes tentadas pelo diabo a ficar iradas com as fiéis advertências de seu pastor. É nosso dever, pois, não ficar alarmados por quaisquer gêneros de ofensas, contanto, naturalmente, que não desviemos de Cristo nossas débeis mentes” (João Calvino, Gálatas, (Gl 1.10), p. 36-37). “A tarefa dos mestres consiste em preservar e propagar as sãs doutrinas para que a pureza da religião permaneça na Igreja” (João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, (1Co 12.28), p. 390).
[5]Herman Bavinck, Our Reasonable Faith,4. ed. Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1984, p. 536. Também: Herman Bavinck, Dogmática Reformada − Espírito Santo, Igreja e nova criação, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 345.
[6]Vejam-se: João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, São Paulo: Paracletos, 1996, (1Co 12.28), p. 391; Herman Bavinck, Our Reasonable Faith, p. 536-537; Simon Kistemaker, 1 Coríntios, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004, (1Co 12.28), p. 615-616; Samuel Miller, O Presbítero Regente: Natureza, Deveres e Qualificações, São Paulo: Os Puritanos, 2001, p. 13.
[7]Cf. João Calvino, Exposição de Romanos, São Paulo: Paracletos, 1997, (Rm 12.8), p. 433-434. (Vejam-se também: Charles Hodge, Commentary on the Epistle to the Romans, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1994 (Reprinted), p. 392-393; William Hendriksen, Romanos, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2001, (Rm 12.6-8), p. 541-542; John Murray, Romanos, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2003, (Rm 12.3-8), p. 489). Em outro lugar Calvino expressa a amplitude do seu conceito sobre este assunto: “O que Paulo demonstra claramente quando inclui os que presidem entre os dons que Deus distribui diversamente aos homens e que devem ser empregados para a edificação da igreja. Conquanto na citada passagem o apóstolo fale da assembleia dos anciãos ou presbíteros que eram ordenados na Igreja Primitiva para presidir ou administrar a disciplina pública, ofício que na Epístola aos Coríntios ele chama de governos, todavia, como em nosso conceito o poder civil visa ao mesmo fim, não há nenhuma dúvida de que ele nos recomenda que lhe atribuamos toda sorte de preeminência justa” (João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 4, (IV.16), p. 149).
[8] O substantivo usado em 1Co 12.28 para “governar”, kube/rnhsij – do verbo kuberna/w (pilotar um navio) (Usado desde Homero e Heródoto, porém ausente no NT) – tem o sentido figurado de governar, administrar, dirigir. Este sentido já fora dado por Platão, aplicando a palavra ao “estadista” (Fedro, 247c; Eutidemo, 291c) e à arte de bem dirigir (governar) a “nau do Estado” (República, 488a-b). Kubernh/thj (piloto) ocorre duas vezes no Novo Testamento (At 27.11; Ap 18.17) (LXX: Pv 23.34; Ez 27.8,27,28). O substantivo kube/rnhsij aparece três vezes na LXX: apresenta a ideia de bem conduzir a nossa inteligência na tomada de decisões (Pv 1.5); sábia direção na condução do povo (Pv 11.14) e, condução prudente na execução da guerra (Pv 24.6). O verbo kuberna/w ocorre uma única vez na LXX com o sentido de pensamento justo e reto (Pv 12.5). (Vejam-se: Hermann W. Beyer, Kube/rnhsij:In: G. Kittel, ed., Theological Dictionary of the New Testament,Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1983 (Reprinted), v. 3, p. 1035-1037; William F. Arndt; F.W. Gingrich, A Greek-English Lexicon of the New Testament and Other Eearly Christian Literature, p. 457; L. Coenen, Bispo: In: Colin Brown, ed. ger.O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 1 p. 305; Simon Kistemaker, 1 Coríntios, (1Co 12.28), p. 615-616.
[9]“Paulo e Timóteo, servos de Cristo Jesus, a todos os santos em Cristo Jesus, inclusive bispos e diáconos que vivem em Filipos” (Fp 1.1).
[10]Quando se refere a presbíteros usa o plural tendo como pressuposto a existência deste ofício em todas as igrejas representadas: “Tiago, servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo, às doze tribos que se encontram na Dispersão, saudações” (Tg 1.1). “Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo, em nome do Senhor” (Tg 5.14). Da mesma forma Pedro: “Rogo, pois, aos presbíteros que há entre vós, eu, presbítero como eles, e testemunha dos sofrimentos de Cristo, e ainda coparticipante da glória que há de ser revelada: 2 pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, masespontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade” (1Pe 5.1-2).