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Uma oração intercessória pela Igreja (14) - Hermisten Maia

Uma oração intercessória pela Igreja (14)

4.1. Fé Teocêntrica 

                                    Biblicamente falando, a fé salvadora é uma fé Teológica e, esta é Cristocêntrica. A Teocentricidade da fé é Cristocêntrica. Não existe fé Teocêntrica à revelia da Pessoa de Cristo. Isso porque, sem o Filho, o Pai, como tal, continua desconhecido a nós. A glória do Espírito é que creiamos no Filho. A glória do Filho consiste em que recebamos a Deus como Pai. A alegria do Pai é que honremos o Filho. Na  confissão do Pai, a Trindade é glorificada.

            Uma das grandes virtudes da fé é a demonstração de nossa pequenez diante da majestade de Deus; não de um Deus distante, mas, daquele em quem cremos e que nos socorre por sua misericórdia.

            A fé não é uma virtude humana, antes, é resultado da graça que nos faz confiar e descansar em Cristo. Portanto, a questão primeira não está na intensidade de nossa fé, antes, em quem cremos. É o Senhor Jesus em sua majestade quem confere sentido à nossa fé e nos ajuda em nossa, por vezes, incredulidade (Mc 9.24).[1] A fé faz parte essencial do Evangelho. No entanto, essa fé deve repousar unicamente em Cristo como nosso salvador (Jo 3.16).

Calvino captou bem isso ao escrever: “A fé, pois, conduz a Deus um homem vazio, para que o mesmo seja plenificado com as bênçãos de Cristo”.[2] A fé depositada em Jesus Cristo permite nos manter firmes em meio às tempestades que podem assolar a nossa vida, não nos permitindo vagar perigosamente em nossa volátil fé ao sabor das circunstâncias, e, também, a nos conduzir a uma dimensão clara e correta daquele em que cremos.[3]

Por vezes a nossa fé se fortalece na certeza de que o Deus em quem cremos, ainda que não nos livre de muitas tempestades, é aquele que nos guarda, preserva e salva em meio a elas.

A genuína fé cristã está enraizada no coração que foi regenerado por Deus. A fé salvadora é obra de Deus e é direcionada para Deus por meio de Cristo (Hb 12.2; 1Jo 5.1-5). Contudo, o que nos salva não é a nossa fé, mas, o que Cristo por graça realizou por nós despertando a nossa fé nele.

            Deste modo, podemos dizer que a fé Teocêntrica envolve algumas compreensões provenientes das Escrituras. Destacaremos duas.

                             

a) Crer no Pai é o mesmo que crer no Filho

                        Esse ensinamento é claro em diversos textos das Escrituras: Jo 5.24; Mc 11.22; At 20.21; Rm 3.22, 26; 4.24; Gl 2.20; 1Pe 1.21; 1Jo 3.23.[4]

            No Evangelho de João, “o grande livro da fé”,[5] lemos: “E Jesus clamou, dizendo: Quem crê em mim crê, não em mim, mas naquele que me enviou” (Jo 12.44). “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim” (Jo 14.1).

                                   

b) Sem Jesus Cristo o Pai continuaria inacessível a nós[6]

                                               “Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém sabe quem é o Filho, senão o Pai; e também ninguém sabe quem é o Pai, senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Lc 10.22).    

            “Respondeu-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim. Se vós me tivésseis conhecido, conheceríeis também a meu Pai. Desde agora o conheceis e o tendes visto” (Jo 14.6-7).

            “Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5).

            Agostinho (354-430) fazendo uma distinção entre a fé cristã e pagã, escreve:

A fé dos cristãos não é louvável porque eles creem no Cristo que morreu, mas no Cristo que ressuscitou. Pois, também o pagão acredita que ele morreu e te acusa como de um crime teres acreditado num morto. Que tens, portanto, de louvável? Teres acreditado que Cristo ressuscitou e esperar que hás de ressuscitar por Cristo. Nisto consiste uma fé louvável. “Se confessares com tua boca que Jesus é Senhor e creres em teu coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo” (Rm 10.9). (…) Esta é a fé dos cristãos.[7]

            Calvino resume: “Lembremo-nos de que a fé genuína está então contida em Cristo, que ela não sabe, nem deseja saber, nada mais além dele”.[8]

            Uma fé supostamente depositada no “Pai” sem a aceitação do Filho como Senhor e Salvador, não é a genuína fé bíblica: Ninguém poderá crer em Deus sem fé em Jesus Cristo. Ninguém pode ter a Deus como Pai sem Jesus Cristo como irmão primogênito e Senhor (Rm 8.29).[9]    “O objetivo final de nossa fé é Deus mesmo; mas vemos a sua glória através de Cristo, o qual é o caminho divinamente designado para revelar a glória de Deus”, exulta Owen (1616-1683).[10]

      

Maringá, 7 de abril de 2023.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] E imediatamente o pai do menino exclamou com lágrimas: Eu creio! Ajuda-me na minha falta de fé! (Mc 9.24).

[2]João Calvino, Efésios,São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 2.8), p. 60.

[3] “Visto que o Pai se manifestou totalmente nele, só deseja ser sábio à parte de Deus quem não vive contente só com Cristo” (João Calvino, Colossenses: In: Gálatas – Efésios – Filipenses – Colossenses, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2010, (Cl 2.1-5), p. 532). Veja-se: João Calvino, Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 2, (Jo 14.1), p. 88-89; (Jo 14.11), p. 96.

[4] “Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida” (Jo 5.24). “Ao que Jesus lhes disse: Tende fé em Deus” (Mc 11.22). “Testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo” (At 20.21). 22 justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo, para todos e sobre todos os que creem; porque não há distinção, (…) 26 tendo em vista a manifestação da sua justiça no tempo presente, para ele mesmo ser justo e o justificador daquele que tem fé em Jesus” (Rm 3.22, 26). “Mas também por nossa causa, posto que a nós igualmente nos será imputado, a saber, a nós que cremos naquele que ressuscitou dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor” (Rm 4.24). “Logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl 2.20). “Que, por meio dele, tendes fé em Deus, o qual o ressuscitou dentre os mortos e lhe deu glória, de sorte que a vossa fé e esperança estejam em Deus” (1Pe 1.21). “Ora, o seu mandamento é este: que creiamos em o nome de seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, segundo o mandamento que nos ordenou” (1Jo 3.23).

[5] Expressão usada por Wells (Tom Wells, Fé: dom de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1985, p. 65).

[6]“A personalidade de Deus, para os cristãos, é manifesta na personalidade de Jesus, à parte de quem não sabemos nada sobre Deus (Jo 14.7)” (Gene Edward Veith, Jr, De Todo o Teu Entendimento, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 42).

[7] Agostinho, Comentário aos Salmos, São Paulo: Paulus, (Patrística, 93), 1998, (Sl 101), v. 3, p. 32-33.

[8] João Calvino, Efésios, (Ef 4.13), p. 127.

[9]“Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8.29).

[10]John Owen, A Glória de Cristo, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1989, p. 23. 

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