A Pessoa e Obra do Espírito Santo (467)
6.5.4.4. O penhor do Espírito
“Mas aquele que nos confirma convosco em Cristo e nos ungiu é Deus, que também nos selou (sfragi/zw) e nos deu o penhor (a)rrabw/n) do Espírito em nosso coração” (1Co 1.21-22).
O Espírito é também chamado de penhor (a)rrabw/n)[1] da nossa salvação (2Co 1.22; 5.5; Ef 1.14) – indicando assim, o “primeiro pagamento”, “depósito”, o “sinal” de compra com o compromisso solene de efetivar a transação.[2] O Espírito é o sinal e penhor daquilo que teremos no futuro. Ele é a certificação da aliança divina, de sua intenção e promessa.
O Espírito é o adiantamento da transação já efetivada e que não será desfeita. Deus é fiel. Ele preserva e cumpre a sua promessa. Este símbolo permanece até a consecução de toda a transação: “Espírito de Deus, no qual fostes selados (sfragi/zw) para o dia da redenção” (Ef 4.30).[3]
O Espírito é a garantia de que os eleitos o são para sempre. Ninguém poderá, em tempo algum, sob nenhuma circunstância, nos arrancar das mãos de Deus. A nossa segurança, portanto, repousa em Deus, não em nós mesmos.
Paulo fortalece a ideia de propriedade, autenticidade e inviolabilidade (Ef 1.13-14). Ambas as figuras – “penhor” e “selo” –, assinalam o fato de que pertencemos a Deus e, que a obra que Ele mesmo iniciou será plenamente cumprida em nós (Fp 1.6).[4]
Desta forma, o “penhor” e o “selo” do Espírito têm implicações escatológicas, porque apontam para o futuro, quando a obra do Deus Triúno será concluída em nós (1Pe 1.3-9).[5]
“O Espírito, portanto, serve como penhor de Deus em nossas presentes vidas, a evidência certa de que o futuro chegou ao presente, e a garantia de que o futuro será realizado em plena medida”, conclui Fee.[6] Esta certeza absoluta é decorrente de um ponto fundamental: o Deus da promessa é o Deus fiel.
Objetivamente considerando, o penhor assinala a garantia oferecida pelo próprio Deus a respeito de nossa salvação, tendo como sinal de entrada, o próprio Espírito em nós. O penhor é da mesma essência da herança. O Espírito é o sinal e penhor daquilo que teremos no futuro. Ele é a demonstração divina de sua intenção e promessa. Portanto, além do conceito de pagamento, temos também a noção de qualidade.[7] Não experimentamos hoje algo totalmente diferente do que teremos na eternidade. Hoje nós já temos uma amostragem do que será a nossa vida com Cristo, quando teremos o Espírito sem medida em todos nós, os que cremos. Pela amostragem desejamos ardentemente a plena concretização da transação. Maranata é a oração ardente de toda a igreja.
Subjetivamente,temos a certeza de que o Deus onipotente e fiel cumprirá as suas promessas, preservando-nos até o fim. O selo e o penhor são sinais de nossa condição transitória. No céu, o Espírito será tudo em todos para sempre. “Enquanto vivemos neste mundo, necessitamos de um penhor, porque combatemos em esperança; mas quando a possessão mesma se manifestar, então cessará a necessidade e o uso do penhor”, conclui Calvino.[8]
A Escatologia lança os olhos para o futuro tendo os pés firmados no passado e no presente. A transição entre o caminhar e o olhar não sofre de nenhum tipo de vácuo teológico, isto porque o futuro está nas mãos de Deus que nos tem guardado hoje. O amanhã não será ocasionado por uma ruptura, mas sim, pela concretização perfeita do propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da Sua vontade (Ef 1.11). Sem uma perspectiva teológica correta, a história permanece um mistério incompreensível e “inenarrável”.[9] Por isso, firmado na Palavra, “o crente é uma pessoa, quanto ao passado, agradecida; quanto ao presente, tranquila; e quanto ao futuro, confiante”, exulta Hendriksen.[10]
Maringá, 29 de abril de 2022.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1] Palavra tomada emprestada do hebraico.
[2]“A presença do Espírito Santo é a primeira prestação dos benefícios da redenção de Cristo, concedidos àqueles para quem foram adquiridos, e assim a garantia e penhor da consumação dessa redenção no devido tempo” (Archibald A. Hodge, Confissão de Fé Westminster Comentada por A.A. Hodge,São Paulo: Editora os Puritanos, 1999,p. 328).
[3] Veja-se: João Calvino, Efésios, (Ef 1.14), p. 38.
[4] “A metáfora é tomada por empréstimo das transações que são então confirmadas pela entrega de uma garantia, para que nenhum espaço seja deixado para uma mudança de intenção. Daí, ao recebermos o Espírito de Deus, temos as promessas dele confirmadas em nós e não somos assaltados pelo receio de que se retrate. Não que as promessas de Deus sejam por natureza débeis; mas porque nunca descansamos nelas confiadamente, enquanto as mesmas não recebem o endosso do testemunho do Espírito” (João Calvino, Efésios, (Ef 1.14), p. 37).
[5]“3 Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita misericórdia, nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, 4 para uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos céus para vós outros 5 que sois guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação preparada para revelar-se no último tempo. 6 Nisso exultais, embora, no presente, por breve tempo, se necessário, sejais contristados por várias provações, 7 para que, uma vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em louvor, glória e honra na revelação de Jesus Cristo; 8 a quem, não havendo visto, amais; no qual, não vendo agora, mas crendo, exultais com alegria indizível e cheia de glória, 9 obtendo o fim da vossa fé: a salvação da vossa alma” (1Pe 1.3-9).
[6] Gordon D. Fee, Paulo, o Espírito e o Povo de Deus, São Paulo: United Press, 1997, p. 60.
[7]Ver: Paul E. Brown, O Espírito Santo e a Bíblia, São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 104, 190.
[8] João Calvino, Efésios,(Ef 1.14), p. 37.
[9] “O sentido da história é incompleto à parte da vontade e do objetivo de Deus. A história está nas mãos de Deus, como ocorre com o significado mais profundo de toda a vida humana. O nexo natural-histórico todo funciona segundo as ‘leis’ de Deus” (Benjamin Wirt Farley, A Providência de Deus na Perspectiva Reformada: In: Donald K. Mckim, ed., Grandes Temas da Tradição Reformada, São Paulo: Pendão Real, 1999, p. 74).
[10]William Hendriksen, A Vida Futura: Segundo a Bíblia, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1988, p. 5.