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A Pessoa e Obra do Espírito Santo (431) - Hermisten Maia

A Pessoa e Obra do Espírito Santo (431)

6.4.10.3. A Igreja como expressão e agente da Glória do Deus Triúno

Portanto, se queremos ter um só e único Deus, lembremo-nos de que, na verdade, não se deve subtrair de sua glória nem sequer uma partícula, senão que deve conservar para ele o que é seu por direito. – João Calvino.[1]

Conforme já vimos, o Deus da glória por ser eterno e essencialmente glorioso, de nada carece: Tudo lhe pertence de forma inalterada. Toda a realidade, visível e invisível foi criada por Ele e nele subsiste.[2]

Deus criou todas as coisas, inclusive a Igreja, para a sua Glória. “Glória é excelência manifestada. A excelência dos atributos de Deus é manifestada por sua operação”, escreve Hodge (1823-1886).[3]

Em todos os atos de Deus encontramos manifestações de sua glória, quer seja em amor, bondade, justiça ou juízo. A glória de Deus por ser-lhe inerente, não lhe é atribuída, acrescentada, diminuída ou mesmo esgotada em sua complexidade; é-Lhe totalmente intrínseca.

Ele é o Rei, o Senhor e Pai da Glória (Sl 24.7-10; At 7.2; Ef 1.17) que, por meio de seu Filho “vestido de nossa carne, se revelou agora para ser o Rei da glória e Senhor dos Exércitos”, escreve Calvino.[4] (1Co 2.8; Tg 2.1/Jo 1.14).

A Criação exibe aspectos da glória divina, porém, a Igreja é uma expressão especial, como comenta Calvino: “Ainda que Deus seja suficiente a si mesmo e se satisfaça exclusivamente consigo mesmo, não obstante quer que sua glória se manifeste na Igreja”.[5]

O alvo final de todas as coisas é a glória Deus. Nada é mais elevado ou importante do que o próprio Deus. Há aqui um desafio extremamente difícil para todos nós individualmente e para a Igreja como um todo: abrir mão de nossos interesses aparentemente mais relevantes (aliás, em nossa óptica, o que há de mais importante do que os nossos interesses?) pelo que, de fato, é urgentemente relevante em sua própria essência.

Lloyd-Jones ilustra esse ponto positivamente partindo do exemplo de Jesus Cristo, que na quinta-feira antes de sua entrega em favor do seu povo, ora ao Pai revelando a sua genuína preocupação: glorificar o Deus Pai (Jo 17.1):

Acima de nossa preocupação com as almas dos homens e com a sua salvação deve estar a nossa preocupação com a glória de Deus. O que devemos acentuar para os homens e para as mulheres que estão fora de Cristo e para os pecadores do mundo atual não é, primariamente, o fato de que eles são pecadores, e que são infelizes porque são pecadores, mas o fato de que o pecado deles é uma agressão a Deus e uma difamação da glória de Deus. O nosso interesse pela glória de Deus deve vir antes do nosso interesse pelo estado e condição do pecador. Isso foi verdade quanto ao nosso Senhor, e é Ele que nos envia.[6]

Jesus Cristo desafia a Igreja a assumir a sua identidade, não uma simples máscara periódica, antes, como autêntico povo de Deus alcançado e constituído por sua misericórdia:

Vós sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte; nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa. Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem (doca/zw) a vosso Pai que está nos céus (Mt 5.14-16).

A Igreja, como criação de Deus, é conclamada a viver de forma intencional para a glória dele, sendo um sinal luminoso que aponta de forma efetiva para o seu Criador, a fim de que todos, por meio do nosso testemunho, possam glorificá-lo.

O conceito de Deus e a pregação do Evangelho

O modo como pregamos o Evangelho reflete o nosso conceito de Deus. Nada é mais importante do que o caráter de Deus. Todavia, quando perdemos a dimensão de quem é Deus, as demais coisas são descaracterizadas.

Somente a compreensão correta de Deus, envolvendo a sua santidade e glória,  pode conferir sentido à nossa existência e a todo o nosso labor missionário. Diante da majestade de Deus, todas as demais coisas tornam-se aos nossos olhos, o que realmente são, pequenas.[7] De fato “Não há glória real senão em Deus”, declara Calvino.[8]

A perda da dimensão correta da Majestade de Deus, tem como causa primeira, o descrédito para com a sua Palavra. Quando não somos instruídos pelas Escrituras[9] deixamos de reconhecer salvadoramente a Jesus Cristo, o Filho de Deus (Mt 22.29/Os 4.1,6).[10]

Deus não existe para satisfazer as ambições humanas, os desejos, os apetites de consumo, ou nossos interesses espirituais particulares. Precisamos nos focalizar em Deus em nossa adoração, e não em satisfazer nossas próprias necessidades. Deus é soberano no culto, não nós. Nossa preocupação precisa estar no reino de Deus, não em nossos próprios impérios, popularidade ou êxito.[11]

  Maringá, 18 de março de 2022.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa



[1]João Calvino, As Institutas I.12.3.

[2]Veja-se: João Calvino, Romanos,2. ed. São Paulo: Parakletos, 2001, (Rm 11.36), p. 430.

[3]A.A. Hodge, Esboços de Theologia, Lisboa: Barata & Sanches, 1895, p. 223.

[4] João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 1, (Sl 24.8), p. 536.

[5]João Calvino, O Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 2.17), p. 100.

[6]D. M. Lloyd-Jones, Seguros Mesmo no Mundo, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2005 (Certeza Espiritual: v. 2), p. 20.

[7]Comentando Dn 3.28 – quando Nabucodonosor admite que Sadraque, Mesaque e Abedenego preferiram obedecer a Deus ao decreto real –, Calvino escreve: “Toda e qualquer pessoa que olha para Deus, facilmente menospreza a todos os mortais e a tudo o que se afigura esplêndido e majestoso no mundo inteiro” (João Calvino, O Profeta Daniel: 1-6, São Paulo: Parakletos, 2000, v. 1, (Dn 3.28), p. 228).

[8]João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 1.17), p. 46.

[9]“Ninguém jamais aprenderá o que Cristo é, ou o propósito de suas ações e sofrimentos, salvo pela orientação e ensino das Escrituras. Até onde, pois, cada um de nós deseja progredir no conhecimento de Cristo, teremos que meditar bastante e continuamente sobre a Escritura” (João Calvino, O evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 2.17), p. 100).

[10]“Respondeu-lhes Jesus: Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22.29). “Ouvi a palavra do Senhor, vós, filhos de Israel, porque o Senhor tem uma contenda com os habitantes da terra, porque nela não há verdade, nem amor, nem conhecimento de Deus. (…) O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento. Porque tu, sacerdote, rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de mim; visto que te esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de teus filhos” (Os 4.1,6).

[11]Documento consultado em 19/08/2020 no site: http://www.alliancenet.org/cambridge-declaration : www.alliancenet.org . Em português: James M. Boice: Benjamin E. Sasse, Reforma Hoje, 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 19.

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