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A Pessoa e Obra do Espírito Santo (366) - Hermisten Maia

A Pessoa e Obra do Espírito Santo (366)

c) Louvando a Deus (Continuação)

 

Os Salmos no culto e na vida cristã

          Já ilustramos como muitíssimos mártires da Reforma morreram cantando salmos. Analisemos agora outros aspectos dos salmos.

          Calvino, considerando a complexidade e a riqueza da experiência cristã, entendia que “os salmos constituem uma expressão muito apropriada da fé reformada”,[1] e que “Tudo quanto nos serve de encorajamento, ao nos pormos a buscar a Deus em oração, nos é ensinado neste livro [Salmos]”.[2]

          Portanto, no Livro de Salmos temos um guia seguro para a edificação da Igreja que pode cantá-lo sem correr o risco de proferir heresias melodiosas.

          Escreve Calvino:

Não existe outro livro onde mais se expressem e magnifiquem as celebrações divinas, seja da liberalidade de Deus sem paralelo em favor de sua Igreja, seja de todas as suas obras. (…) Não há outro livro em que somos mais perfeitamente instruídos na correta maneira de louvar a Deus, ou em que somos mais poderosamente estimulados à realização desse sacro exercício.[3]

          Lutero considerava o livro de Salmos (1545) como um “espelho fino, claro e puro que te mostrará o que é a cristandade”, a nós também e a Deus: “Dentro deles também tu irás encontrar a ti mesmo e o verdadeiro conhece-te a ti mesmo, além do próprio Deus e todas as criaturas.[4]  

          De forma parcialmente análoga, Calvino considerava os Salmos como “uma anatomia de todas as partes da alma”.[5] que isso explica, ainda que parcialmente, o seu tom tão pastoral no Comentário de Salmos. Nos Salmos, Calvino, mesmo seguindo o seu estilo característico, se expõe de um modo mais pessoal. Acredito que em nenhum outro de seus comentários temos acesso tão direto ao coração de Calvino como nesses.

Um fato notório é que Calvino na medida em que escrevia os seus comentários da Bíblia, ampliava a sua Instituição da Religião Cristã como resultado do seu aprofundamento bíblico, histórico e teológico, tendo em vista também os novos questionamentos de seu tempo. Por sua vez nos seus comentários não raramente ele remete o leitor às Institutas.[6]

A última edição das Institutas foi feita em 1559 e, os comentários de Salmos em 1557. É natural supor que ele trabalhou em muitos momentos de modo concomitante em ambas as obras, ainda que com propósitos e estilos diferentes, porém, creio ser possível pensar nos comentários de Salmos como uma espécie de variação pastoral da Institutas,[7] ainda que não se limite a esta.[8]

Maringá, 11 de dezembro de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] John H. Leith, A Tradição Reformada: Uma maneira de ser a comunidade cristã, p. 336. Na leitura dos comentários de Salmos de Calvino é evidente a sua relação contextual e aplicação para o povo de Deus de todas as épocas (Veja-se: Wulfert de Greef, Calvin as Commentator na the Psalms. In: Donald K. McKim, ed., Calvin and the Bible, Cambridge: Cambridge University Press, 2006, p. 85-106.

[2] João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 1, p. 34.

[3] João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 1, p. 35-36.

[4] M. Lutero, Prefácio ao Livro dos Salmos: In: Martinho Lutero: obras selecionadas, São Leopoldo, RS.; Porto Alegre: Sinodal; Concórdia, 2003, v. 8, p. 36. O Salmo favorito de Lutero era o 118. Temos em português a tradução de seu comentário (1530) com uma enriquecedora introdução histórica (Veja-se: Martinho Lutero: obras selecionadas, São Leopoldo, RS.; Porto Alegre: Sinodal; Concórdia, 1995, v. 5, p. 19-84). Considerava também o Salmo 110 “extremamente encantador” (M. Lutero, Conversas à Mesa, Brasília, DF.: Monergismo, 2017, 28, p. 26).

[5] “…. pois não há sequer uma emoção da qual alguém porventura tenha participado que não esteja aí representada como num espelho. (…) É através de uma atenta leitura dessas composições inspiradas que os homens serão mais eficazmente despertados para a consciência de suas enfermidades, e, ao mesmo tempo, instruídos a buscar o antídoto para sua cura.  Numa palavra, tudo quanto nos serve de encorajamento, ao nos pormos a buscar a Deus em oração, nos é ensinado neste livro” (João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 1, p. 33,34).

[6] Vejam-se, por exemplo: At 6.3; Rm 3.21,28; 1Co 1.1; 3.9,14; 5.5; 9.5-6; 2Co 4.17; 5.10; Ef 3.18-10; 1Tm 2.6; 3.8; 1Pe 1.20.

[7]Veja-se: Herman J. Selderhuis, Calvin’s Theology of the Psalms, Grand Rapids, MI.: Baker Academic, 2007, p. 283-285.

[8] Veja-se: Richard A. Muller, The Unaccommodated Calvin, New York: Oxford University Press, 2000, p. 103-108.

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