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A Pessoa e Obra do Espírito Santo (295) - Hermisten Maia

A Pessoa e Obra do Espírito Santo (295)

2) Positivamente considerando (Continuação)

8) Apto para ensinar (Continuação)

                    Como pregadores e mestres, é necessário que não nos contentemos em guiar as pessoas apenas pelo sopé da montanha da glória de Deus; “torne-se um alpinista nos rochedos íngremes da majestade de Deus”, aconselha Piper.[1]

          A clareza só é possível se compreendermos adequadamente o texto bíblico. Fidelidade exige o silêncio reverente diante do mistério e a ousadia edificante diante do estudo do revelado. Ambas as atitudes nos previnem da especulação pecaminosa e da ingratidão para com o que Deus nos tem concedido na Escritura.

Calvino nos instrui em frase que emprego de forma recorrente: “As cousas que o Senhor deixou recônditas em secreto não perscrutemos, as que pôs a descoberto não negligenciemos, para que não sejamos condenados ou de excessiva curiosidade, de uma parte, ou de ingratidão, de outra”.[2]

          Isto não significa que todos nós conseguimos compreender perfeita e exaustivamente a Palavra, mas, aponta para a responsabilidade que temos de, pela graça, crescer no conhecimento de Jesus Cristo que nos advém pela Escritura (2Pe 3.18).[3] O ensino da Palavra é um privilégio altamente responsabilizador. Deus, por graça, tem se valido de seus servos para a transmissão de sua mensagem.

Somos embaixadores cuja responsabilidade é sermos integralmente fiéis à mensagem do Rei. Não somos autores da mensagem. Ela não nos pertence. No entanto, somos arautos e embaixadores comissionados pelo Senhor[4] a quem devemos representar com integridade e responsabilidade (Mt 10.5-7,16,40; 2Co 5.20; 1Ts 2.13).[5] A pregação não é apenas uma questão de decisão pessoal, antes, é uma ordem divina.[6]

          Com conhecimento de causa, em 1956, Lloyd-Jones (1899-1981) lamentava que “muitíssimas vezes os ministros cristãos não têm sido senão uma espécie de Capelão da Corte, declarando vagas generalidades”.[7]

          Sem dúvida, a nossa vocação é outra. Deste modo, aquele que prega deve ter consciência de que o púlpito não é o lugar para se exercitar as opiniões pessoais e subjetivas, mas sim, para pregar a Palavra, anunciando todo o desígnio de Deus, sob a iluminação do Espírito. O Espírito honra exclusivamente a sua Palavra, não a nossa.[8]  Se formos fiéis ao texto bíblico, Ele também nos honrará.[9] A linguagem do Espírito é una. A Revelação é múltipla, porém, há uma univocidade orgânica de conteúdo.

          Vinet (1797-1847) definiu bem a pregação, ao dizer ser ela “a explicação da Palavra de Deus, a exposição das verdades cristãs, e a aplicação dessas verdades ao nosso rebanho”.[10] Conforme vimos, Calvino escrevera na mesma linha: “A Escritura é a fonte de toda a sabedoria, e os pastores terão de extrair dela tudo o que eles expõem diante do seu rebanho”.[11]

Lloyd-Jones (1899-1981), numa série de sermões pregados (1963) sobre Isaías 1.1-18, declarou corretamente: “Não estou aqui para ventilar minhas próprias ideias e teorias, porém para expor a Palavra de Deus”.[12] Sem a Palavra, o púlpito torna-se um lugar que no máximo serve como terapia para aliviar as tensões de um auditório cansado e ansioso em busca de refrigério para as suas necessidades mais imediatamente percebidas.[13] Ele pode conseguir o alívio do sintoma, mas não a cura para as suas reais necessidades.

          Outra verdade que precisa ser ressaltada, é que apesar de muitos de nós não sermos “grandes” pregadores[14] ou existirem pregadores infiéis, Deus fala: A Palavra de Deus é mais poderosa do que a nossa incompetência ou a infidelidade de outros. Deus não conhece empecilho para a sua vontade: nem mesmo um mal pregador. Por isso, há a responsabilidade de ambos os lados: Quem prega, pregue a Palavra; quem ouve, ouça com discernimento a Palavra do Espírito de Deus.

          Mais recentemente li Chapell dizendo:

Os esforços pessoais dos maiores pregadores são ainda demasiado fracos e manchados pelo pecado para serem responsáveis pelo destino eterno das pessoas. Por essa razão Deus infunde sua Palavra com poder espiritual. A eficácia da mensagem, mas que qualquer virtude do mensageiro, transforma corações.[15]
A glória da pregação é que Deus realiza sua vontade por intermédio dela, mas somos sempre humilhados e ocasionalmente confortados com o conhecimento de que Ele age além das nossas limitações humanas.[16]
Pode ser que você jamais ouça elogios do mundo, ou seja pastor de uma igreja com milhares de membros, mas uma vida de piedade associada a uma clara explanação da graça salvadora e santificadora da Escritura garantem o poder do Espírito para a glória de Deus.[17]

Devemos ter sempre em mente que a pregação foi o meio deliberadamente escolhido por Deus para transformar pessoas e edificar o seu povo, preservando a sã doutrina por meio da Igreja que é o baluarte da verdade.[18]

Maringá, 17 de setembro de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] John Piper, A Supremacia de Deus na Pregação, São Paulo: Shedd Publicações, 2003, p. 60.

[2]João Calvino, As Institutas, III.21.4.

[3]“Antes, crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. A ele seja a glória, tanto agora como no dia eterno” (2Pe 3.18).

[4]“Todo arauto que sobe a um púlpito é diretamente responsável àquele que o comissionou ao dever de pregar. Se você agrada a Deus, não importa a quem desagrada. E, se você desagrada a Deus, não importa a quem agrada” (Steven J. Lawson, O tipo de pregação que Deus abençoa, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2013, p. 71).

[5] Cf. John Stott, Eu Creio na Pregação, São Paulo: Editora Vida, 2003, p. 142-146.

[6]Veja-se: Iain H. Murray, A Vida de Martyn Lloyd-Jones 1899-1981: Uma biografia, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2014, p. 79-80.

[7]D. Martyn Lloyd-Jones, As Insondáveis Riquezas de Cristo, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992, p. 52.

[8] “O Espírito Santo é o poder atuante na Igreja, e o Espírito Santo jamais honrará coisa alguma senão a Sua Palavra. Foi o Espírito Santo quem nos deu esta Palavra. Ele é o seu Autor.  Não é dos homens! Tampouco a Bíblia é produto da ‘carne’ e do ‘sangue’. (…) O Espírito não honrará nada, senão Sua Palavra. Portanto, se não crermos e não aceitarmos sua Palavra, ou se de algum modo nos desviarmos dela, não teremos direito de esperar a bênção do Espírito Santo. O Espírito Santo honrará a verdade, e não honrará outra coisa. Seja o que for que fizermos, se não honrarmos esta verdade, Ele não nos honrará” (D.M. Lloyd-Jones, O Combate Cristão, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1991, p. 103).

[9] “Deus honrará aqueles que honram a sua Palavra”    (Steven J.  Lawson, O tipo de pregação que Deus abençoa,  São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2013, p. 34).

[10] Alexander R. Vinet, Pastoral Theology: or, The Theory of the Evangelical Ministry, 2. ed. New York: Ivison, Blakeman, Taylor & Co. 1874, p. 189.

[11] João Calvino, As Pastorais, São Paulo:, Paracletos, 1998, (1Tm 4.13), p. 123.

[12] D.M. Lloyd-Jones, O Caminho de Deus não o nosso, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2003, p. 67.

[13]A constatação de Carson é de grande gravidade. Talvez devêssemos levá-la a sério, nós, costumeiramente tão ávidos por modismos:  “A cultura terapêutica invadiu tanto a igreja que agora alguns seminários têm mais alunos matriculados em programas de aconselhamento que treinando para ser pregadores do Evangelho” (D.A. Carson, O Deus amordaçado: o Cristianismo confronta o pluralismo,  São Paulo: Shedd Publicações, 2013, p. 51).

[14]É-nos alentadora a observação de Spurgeon: “O pregador do evangelho pode não ser um bom pregador. Mas o Senhor fala aos pecadores mesmo por meio de pregadores incultos” (C.H. Spurgeon, Sermões Sobre a Salvação, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992,p. 46). Do mesmo modo, Chapell: “Grandes dons não o tornam grande pregador. A excelência técnica da mensagem pode repousar nas suas habilidades, mas a eficácia espiritual da sua mensagem reside em Deus” (Bryan Chapell, Pregação Cristocêntrica, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002, p. 25).

[15]Bryan Chapell, Pregação Cristocêntrica, p. 18. À frente continua: “Pregação que é fiel à Escritura converte, convence e amolda o espírito de homens e mulheres, pois ela apresenta o instrumento da compulsão divina, e não que pregadores tenham em si mesmos qualquer poder transformador” (Bryan Chapell, Pregação Cristocêntrica, p. 19).

[16] Bryan Chapell, Pregação Cristocêntrica, p. 25.

[17]Bryan Chapell, Pregação Cristocêntrica, p. 33.

[18]MacArthur acentua com veemência em lugares diferentes: “…. Não ousemos menosprezar o principal instrumento de evangelismo: a proclamação direta e cristocêntrica da genuína Palavra de Deus. Aqueles que trocam a Palavra por entretenimento ou artifícios descobrirão que não possuem um meio eficaz de alcançar as pessoas com a verdade de Cristo” (John F. MacArthur Jr., Com Vergonha do Evangelho, São José dos Campos, SP.: Fiel, 1997, p. 117-118). “Os que desejam colocar a dramatização, a música e outros meios mais sutis no lugar da pregação deveriam levar em conta o seguinte: Deus, intencionalmente, escolheu uma mensagem e uma metodologia que a sabedoria deste mundo considera como loucura. O termo grego traduzido por ‘loucura’ (1Co 1.21) é mõria, de onde o idioma inglês tira a sua palavra moronic (imbecil). O instrumento que Deus utiliza para realizar a salvação é, literalmente, imbecil aos olhos da sabedoria humana. Mas é a única estratégia de Deus para proclamar a mensagem” (Ibidem., p. 130).

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