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A Pessoa e Obra do Espírito Santo (114) - Hermisten Maia

A Pessoa e Obra do Espírito Santo (114)

                    6.2.6. Na Sua Obra Sacrificial (Continuação)

Sacrifícios do Antigo Testamento como graça expectante

Os sacrifícios do Antigo Testamento denotam a iniciativa do Deus justo e amoroso que providencia a reconciliação de seu povo pecador[1] – porém igualmente amado e eleito –, consigo mesmo, encontrando este processo, a sua plenitude e ápice em Jesus Cristo: O Verbo Encarnado.

    Baillie  (1887-1954) comenta:

Em resumo “tudo é de Deus”: o desejo de perdoar e reconciliar, os meios indicados, a provisão da vítima vindo do seu próprio seio, mediante preço infinito. Tudo acontece dentro da própria vida de Deus: pois se tomamos a Cristologia do Novo Testamento, temos de afirmar que “Deus estava em Cristo” neste grande sacrifício expiatório, e que o Sacerdote e a Vítima eram o mesmo Deus.[2]

    Devemos, portanto, enfatizar que mesmo no Antigo Testamento, os patriarcas, os profetas e o povo em geral foram perdoados, não porque ofereceram sacrifícios, mas sim, pela fé no Cristo que viria evidenciada na prática obediente do que Deus mesmo instituíra.

     A obra de Cristo envolve todos os crentes: todos os fiéis do passado, presente e futuro.[3] “A única maneira de alguém ser perdoado, antes de Cristo, depois de Cristo e em qualquer ocasião, é através de Cristo, e este crucificado”, explica Lloyd-Jones.[4]

    A obra de Cristo envolve todo o seu povo. Ninguém ficará de fora nem jamais houve ou haverá redenção fora do sacrifício único e vicário de Cristo: a obra de Cristo é completa, suficiente e eficaz. A salvação é real porque a expiação de Cristo foi completa  e definida dentro dos santos e soberanos propósitos da Trindade: Glorificar-se a si mesma por meio da salvação de seu povo[5] pela graça.[6]

    Calvino interpreta:

Em cada época, desde o princípio, houve pecados que necessitavam de expiação. Portanto, a menos que o sacrifício de Cristo fosse eficaz, nenhum dos [antigos] pais haveria obtido a salvação. Visto que se achavam sujeitos à ira divina, qualquer remédio para livrá-los teria resultado em nada, se Cristo, ao sofrer uma vez por todas, não sofresse o suficiente para reconciliar os homens com a graça de Deus, desde o princípio do mundo e até ao fim. A não ser que desejemos muitas mortes, contentemo-nos com um só sacrifício. (…) Não está no poder do homem inventar sacrifícios como lhe apraz. Eis aqui uma verdade expressa pelo Espírito Santo, a saber: que os pecados não são expiados por um sacrifício, a menos que haja derramamento de sangue. Por conseguinte, a ideia de que Cristo é sacrificado muitas vezes não passa de uma invenção diabólica.[7]

    Paulo nos diz que o triunfo de Cristo em nos perdoar, concedendo-nos vida, foi manifesto na cruz do Calvário:

E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões, e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos; tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz; e, despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz. (Cl 2.13-15).

    É importante observar que a Bíblia não faz distinção entre o amor de Deus Pai, do Deus Filho e do Deus Espírito Santo. O sacrifício do Filho revela o amor do Trino Deus: O Pai não passou a nos amar porque o seu Filho morreu por nós. Antes, o Filho morreu por nós porque o Trino Deus eternamente nos amou e confiou-nos ao Filho (Jo 3.16; 10.22-30; 15.16; 17.6-26; Rm 5.8; 1Jo 4.9). O Filho reconciliou-nos com o Pai e com o nosso próximo por intermédio da cruz (Ef 2.11-22; Cl 1.19-20).[8]

    Murray comenta que “Nenhum estudo da expiação pode ser devidamente desenvolvido sem reconhecer em primeiro lugar o livre e soberano amor de Deus  (…) Este amor é a causa ou a fonte da expiação”.[9]

Maringá, 17 de fevereiro de 2021.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1]“O objetivo dos sacrifícios era que Deus olhasse para o povo pecador de uma maneira benigna, de uma maneira que revelasse prontidão em recebê-lo” (D.M. Lloyd-Jones, Deus o Pai, Deus o Filho, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1997 (Grandes Doutrinas Bíblicas, v. 1), p. 406). “A Queda da raça humana e o afastamento de Deus que se seguiu a ela exigiu que fosse encontrado algum meio de restaurar o relacionamento do homem com o Senhor. Esse meio envolvia o sacrifício de animais cujo sangue (isto é, vida) seria derramado em expiação substitutiva. Outras ofertas de grão e semelhantes eram expressões necessárias de ação de graças, sinais de paz ou de inteireza entre Deus e o adorador. O conceito de expiação já fora sugerido  – mesmo que de forma obscura – na morte do animal cuja pele foi transformada em veste para cobrir a nudez do primeiro casal (Gn 3.21). Isso pavimentou o caminho para um sistema elaborado de culto e de ritual, a descrição completa do que deve ser adiado para um ponto posterior e mais adequado” (Eugene H. Merrill, Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Shedd Publicações, 2009, p. 221).

[2] Donald M. Baillie,  Deus Estava em Cristo, São Paulo: ASTE., 1964,  p. 215.

[3] “Quando o Filho de Deus sofreu e morreu, Ele assim expiou os pecados de todos os que o aceitaram ou iriam aceitá-lo por meio de uma fé viva, ou seja, por todos os crentes de ambas as dispensações. Os méritos da cruz estendem-se tanto para trás como para adiante” (W. Hendriksen, Romanos, São Paulo: Cultura Cristã, 2001, (Rm 3.25-26), p. 178).

[4]D. Martyn Lloyd-Jones, Estudos no Sermão do Monte, São Paulo: FIEL., 1984, p. 359. “Ninguém pode dizer, nem por um momento, que pessoas como Davi, Abraão, Isaque e Jacó não foram perdoadas. Mas não o foram por causa daqueles sacrifícios que ofereceram. Eles foram perdoados porque olhavam para Cristo. Não percebiam isso claramente, mas criam no ensinamento e faziam essas ofertas pela fé. Criam na Palavra de Deus, que Ele um dia no porvir, proveria um sacrifício, e pela fé se mantiveram firmes nisso. Foi a fé em Cristo que os salvou, exatamente como é a fé em Cristo que salva agora” (D.M. Lloyd-Jones, A Cruz: A Justificação de Deus, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, (s.d.), p. 9-10).

[5] “Não há dúvida de que as Escrituras apresentam a glória de Deus como o grande objetivo do estabelecimento de uma igreja no mundo, na salvação dos pecadores, por meio da proclamação do Evangelho” (James Bannerman, A Igreja de Cristo – Um tratado sobre a natureza, poderes, ordenanças, disciplina e governo da Igreja Cristã,  Recife, PE.: Editora os Puritanos, 2014, p. 77).

[6]“Deus (…) em sua infinita misericórdia, havendo determinado salvar uma multidão que ninguém poderia enumerar, deu-a a seu Filho como herança, providenciou para que ele assumisse a natureza deles e em seu lugar cumprisse toda justiça. No cumprimento deste plano, Cristo veio ao mundo e obedeceu e sofreu no lugar daqueles que lhe foram dados e para a salvação deles. Este foi o objetivo concreto de sua missão, e por isso sua morte teve uma referência a esses que não pôde ser feita àqueles que Deus decidiu entregar à justa recompensa por seus pecados (…) Segue-se, pois, da natureza do pacto da redenção, tal como se apresenta na Bíblia que Cristo não morreu igualmente por toda a raça humana, senão que se deu a si mesmo por seu povo e pela redenção deles”  (Charles Hodge, Teologia Sistemática, São Paulo: Hagnos, 2001, p. 892). Veja-se:  C.H. Spurgeon, Sermões Sobre a Salvação, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992, p. 26.

[7]João Calvino, Exposição de Hebreus, São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 9.26), p. 245-246.  “A razão pela qual Deus ordenara que se oferecessem vítimas como expressão de ações de graça foi, como é bem notório, para ensinar ao povo que seus louvores eram contaminados pelo pecado, e que necessitavam de ser santificados exteriormente. Por mais que proponhamos a nós mesmos louvar o nome de Deus, outra coisa não fazemos senão profaná-lo com nossos lábios impuros, não houvera Cristo se oferecido em sacrifício com o propósito de santificar a nós e às nossas atividades sagradas [Hb 10.7]. É através dele, como aprendemos do apóstolo, que nossos louvores são aceitos” (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Parakletos, 1999, v. 2, (Sl 66.15), p. 631).

[8] “A redenção de Cristo resulta na cura dos relacionamentos pessoais, tanto entre Deus e o homem como entre os seres humanos”  (Vern S. Poythress, O Senhorio de Cristo: servindo o nosso Senhor o tempo todo, em toda a vida e de todo o nosso coração, Brasília, DF.: Monergismo, 2019, p. 132).

[9]John Murray, Redenção: Consumada e Aplicada, São Paulo: Cultura Cristã, 1993, p. 11, 13.

One thought on “A Pessoa e Obra do Espírito Santo (114)

  • 26 de fevereiro de 2021 em 01:32
    Permalink

    Amém!.
    O Amor de Deus é desde o princípio…

    Resposta

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