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“Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (146) - Hermisten Maia

“Eu lhes tenho dado a tua Palavra” (Jo 17.1-26) (146)

c) Louvando a Deus  (Continuação)

Saltério Genebrino

            Na primeira edição do que seria conhecido como Saltério Genebrino (1539), havia apenas 19 salmos. Calvino traduziu alguns [Sl 25, 36 ,46, 91, 113 e 138].[1] Para os demais, valeu-se efetivamente do talento do poeta francês Clément Marot (c. 1496-1544) – que conhecera na Corte da Duquesa de Ferrara em 1536[2] e que estava refugiado em Genebra[3]–, e Theodoro de Beza (1519-1605) e, posteriormente recorreu ao precioso trabalho do compositor francês Loys Bourgeois (c.1510-c. 1560),[4] “pai do moderno hino de louvor”,[5] – que adaptou as canções populares de fácil assimilação[6] e antigos hinos latinos e, também, compôs outras músicas para a métrica dos salmos de Marot[7]– e Claude Goudimel (1510-1572), que aderindo à Igreja Reformada em 1562, viria morrer em Lyon no massacre da noite de São Bartolomeu.

            As lindas melodias de Goudimel tornaram-se um ingrediente enriquecedor do Saltério e, também, contribuíram em muito para a sua divulgação. “Goudimel, particularmente, tinha em mente, em suas composições, uma família cantando no lar”, comenta Pierre Courthial (1914-2009).[8]

            Conforme mencionamos, o Saltério iniciado por Calvino em 1539, dispunha de 19 salmos. Mais tarde, seriam impressas várias edições em Genebra, contendo 50 salmos (1543) e uma outra em Estrasburgo (1545). As edições foram sendo aumentadas, até a definitiva, concluída por Beza (c. 1561-1562).[9]

            Ele tornou-se “um dos livros mais importantes da reforma”,[10] e um protótipo dos hinários procedentes da Reforma,[11] tendo um verdadeiro “dom de línguas”, sendo traduzido para o alemão, holandês, italiano, espanhol, boêmio, polonês, latim, hebraico, malaio, tamis, inglês etc., sendo usado por católicos, luteranos e outras denominações.[12]

Maringá, 11 de setembro de 2020.

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa


[1] Compare as informações: John T. McNeill, The History and Character of Calvinism, New York: Oxford University Press, 1954, p. 148; Philip Schaff, History of the Christian Church, v. 8, p. 374; Charles Garside, Jr., The Origins of Calvin’s Theology of Music: 1536-1543, Philadelphia: The American Philosophical Society, 1979, p. 15 (nota 79). Não nos esqueçamos de que Calvino, como o seu amigo Viret, não tinha pendor poético, no entanto. não devemos exagerar isso considerando o grau de exigência que Calvino tinha para consigo e, ao mesmo tempo, a sensibilidade poética do Reformador revelada em vários de seus textos. Sobre Viret (1511-1571), Calvino conta o seu testemunho: “Viret declara que as musas são tão desfavoráveis ​​para ele que lhe é impossível tentar alguma coisa no verso” (Ver: John Calvin, To Conrad Hubert, “Letters,” John Calvin Collection, [CD-ROM], (Albany, OR: Ages Software, 1998), 19/05/1557, nº 462. Do mesmo modo: H. Beveridge; J. Bonnet, Selected Works of John Calvin: Tracts and Letters, Grand Rapids, Mi: Baker Book House, 1983 (reprinted), v. 6, p. 330-331). Quanto à sensibilidade estética de Calvino, veja-se: John T. McNeill, The History and Character of Calvinism, p. 148, 231-232. Calvino era, na realidade, um teólogo da música.

[2] Philip Schaff, History of the Christian Church,v. 8, p. 374; André Biéler, O Pensamento Econômico e Social de Calvino, p. 133. Marot musicou 81 salmos (Cf. Jouberto Heringer da Silva, A Música na Liturgia de Calvino em Genebra: In: Fides Reformata, VII.2 (2002), p. 97). Ver: T.H.L. Parker, The Oracles of God: An Introduction to the Preaching of John Calvin, Cambridge, England: James Clark & Co. © 1947 (Reprinted: 2002), p. 36-37.

[3] Cf. Carl Lindberg, As Reformas na Europa,  São Leopoldo, RS.: Sinodal, 2001, p. 338.

[4] Ver: Abraham Kuyper, Calvinismo,São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002, 176-177.

[5] Conforme expressão citada por Silva (Jouberto Heringer da Silva, A Música na Liturgia de Calvino em Genebra: In: Fides Reformata, VII.2 (2002), p. 98).

[6] Isso foi feito com o objetivo de que “agora o povo não cantaria mais no bar ou na rua, mas no santuário, e assim, em suas melodias levaram a seriedade do coração a triunfar sobre o calor das paixões inferiores” (Abraham Kuyper, Calvinismo,São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002, p. 176).

[7] Cf. Frank Dobbins, Loys Bourgeois: In: Stanley Sadie, ed. The New Grove Dictionary of Music and Musicians,New York: Macmillan Publishers, 1980, v. 3, p. 111; Abraham Kuyper, Calvinismo,p. 175-176. A tradução de Marot tornou-se extremamente popular na corte e na cidade, advogando “materialmente” a causa da Reforma na França (Cf. F.J.B. Watson, Clément Marot: In: Harry S. Ashmore, Editor in Chief, Encyclopaedia Britannica, (1962), v. 14, p. 936. Vejam-se exemplos dessa tese: (Lucien Febvre & Henry-Jean Martin, O Aparecimento do Livro, São Paulo: Hucitec., 1992, p. 446), ainda que ele não fosse propriamente Reformado, tendo um comportamento ambíguo (Veja-se: Edward Dickinson, Music in The History of The Western Church,London: Smith, Elder & Co., 1902, p. 359-360). As obras de Marot foram proibidas em Portugal, não por questões religiosas, antes, por serem consideradas obscenas.   (Cf. Rubens Borba de Moraes, Livros e Bibliotecas no Brasil Colonial, Rio de Janeiro; São Paulo: Livros Técnicos e Científicos; Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, 1979, p. 56).

[8] Pierre Courthial, A Idade de Ouro do Calvinismo na França: (1533-1633): In: W.S. Reid, ed.Calvino e sua Influência no Mundo Ocidental, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1990, p. 107.

[9]Edward Dickinson, Music in The History of The Western Church, p. 360; Philip Schaff, History of the Christian Church, Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 1996, v. 8, p. 374. Charles W. Baird, A Liturgia Reformada: Ensaio histórico, Santa Bárbara D’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 26.

[10] John H. Leith, A Tradição Reformada: Uma maneira de ser a comunidade cristã, p. 299. Também, p. 40.

[11]Cf. Hughes Oliphant Old, Worship: That Is Reformed According to Scripture, p. 51ss.

[12]Cf. John H. Leith, A Tradição Reformada: Uma maneira de ser a comunidade cristã, p. 299. Febvre e Martin, enumeram alguns homens e mulheres que antipatizavam com a Reforma, porém, apreciavam o Saltério (Veja-se: Lucien Febvre & Henry-Jean Martin, O Aparecimento do Livro, São Paulo: Hucitec., 1992, p. 445-446). Veja também: Carl Lindberg, As Reformas na Europa, São Leopoldo, RS.: Sinodal, 2001, p. 339ss.

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