Eu lhes tenho dado a tua Palavra (Jo 17.1-26) (123)
d) Unidade não existe em detrimento da verdade (Continuação)
Calvino entende que Satanás muitas vezes se vale de nossos bons sentimentos para fazer com que quebremos a unidade da Igreja, supostamente, em busca de uma Igreja ideal. Para este mister, somos capazes até de reunir textos que falam da santidade da Igreja como pretexto para a nossa atitude.[1]
Por isso, devemos atuar com integridade e humildade dentro da igreja local, orando por ela, buscando a preservação da paz, conduzindo-nos em submissão, buscando sempre a orientação de Deus em nosso realizar, entendendo o quão Deus ama a sua igreja e o seu propósito santo para ela.[2]
Por isso, devemos levar em consideração a observação de Piper e Carson: “Separar-se de uma igreja local com um senso de autossuficiência é, a longo prazo, suicídio”.[3]
Calvino, por sua vez, nos aconselha: “Recordemos sempre, quando o diabo nos empurrar para as controvérsias, que as desavenças dos membros, no seio da Igreja, não nos levam a parte alguma, senão para a ruína e destruição de todo o corpo”.[4]
Como os jovens são mais irritáveis, segue uma orientação mais específica:
Os jovens, em meio às controvérsias, se irritam muito mais depressa do que os de mais idade; se iram mais facilmente, cometem mais equívocos por falta de experiência e se precipitam com mais ousadia e temeridade. Daí ter Paulo boas razões para aconselhar a um jovem a precaver-se contra os erros próprios de sua idade, os quais, de outra forma, poderiam facilmente envolvê-lo em disputas inúteis.[5]
Após argumentar contra aqueles que chamavam os reformados de hereges, ressalta que a unidade cristã deve ser na Palavra:
Com efeito, também isto é de notar-se: que esta conjunção de amor assim depende da unidade de fé que lhe deva ser esta o início, o fim, a regra única, afinal. Lembremo-nos, portanto, quantas vezes se nos recomenda a unidade eclesiástica, isto ser requerido: que, enquanto nossas mentes têm o mesmo sentir em Cristo, também entre si conjungidas nos hajam sido as vontades em mútua benevolência em Cristo. E, assim, Paulo, quando para com ela nos exorta, por fundamento assume haver um só Deus, uma só fé e um só batismo [Ef 4.5]. De fato, onde quer que nos ensina o Apóstolo a sentir o mesmo e a querer o mesmo, acrescenta imediatamente: em Cristo [Fp 2.1,5] ou: segundo Cristo [Rm 15.5], significando ser conluio de ímpios, não acordo de fiéis a unidade que se processa à parte da Palavra do Senhor.[6]
Em outro lugar, instrui: “A melhor forma de promover a unidade é congregar [o povo] para o ensino comunitário”.[7]
Maringá, 13 de agosto de 2020.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
[1]Cf. John Calvin, Calvin’s Commentaries, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House Company, 1996, (Reprinted), v. 15, (Ag 2.1-5), p. 351.
[2] “Os crentes devem se identificar com a igreja e se tornar parte da igreja, dedicando suas orações e esforços à promoção do bem-estar da igreja em todos os aspectos, pois a igreja está no centro dos propósitos de Deus” (Joel R. Beeke; Mark Jones, orgs. Teologia Puritana: Doutrina para a vida, São Paulo: Vida Nova, 2016, p. 1202).
[3]John Piper; D.A Carson, O Pastor Mestre e O Mestre Pastor, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2011, p. 42.
[4]João Calvino, Gálatas,São Paulo: Paracletos, 1998, (Gl 5.15), p. 165. “Aqueles que são imoderadamente severos e mal-humorados levam consigo aquele fogo maligno que inflama as controvérsias” (João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (Tt 3.2), p. 342).
[5] João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (2Tm 2.22), p. 244.
[6]João Calvino, As Institutas,IV.2.5. Calvino entendia que “onde os homens amam a disputa, estejamos plenamente certos de que Deus não está reinando ali” (J. Calvino, Exposição de 1 Coríntios, (1Co 14.33), p. 436). George comenta com acerto, que “Calvino não estava disposto a comprometer pontos essenciais em favor de uma paz falsa, mas ele tentou chamar a igreja de volta à verdadeira base de sua unidade em Jesus Cristo” (Timothy George, Teologia dos Reformadores,São Paulo: Vida Nova, 1993, p. 182-183).
[7] João Calvino, Efésios,(Ef 4.12), p. 125.